Depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter anunciado que vai avançar para a dissolução da Assembleia da República, foram dadas orientações internas aos gabinetes do Governo para redobrarem os cuidados com as partilhas nas redes sociais institucionais e com a agenda dos governantes a partir do momento em que for publicado o decreto a marcar oficialmente as eleições, o que deverá a acontecer no início de dezembro. Até essa altura, o Governo está em plenas funções, repete-se nos gabinetes sobre o que se entende que se pode ou não fazer.
O aviso foi dado logo depois de formalizada a intenção presidencial de dissolver o Parlamento, segundo apurou o Observador, seguindo o que foi feito também nas autárquicas e que não evitou um rol de acusações da oposição que motivaram até a queixas (entretanto arquivadas) junto da Comissão Nacional de Eleições.
Comissão Nacional de Eleições arquiva queixa contra António Costa e a propaganda da bazuca europeia
A lei eleitoral para a Assembleia da República é clara e determina a “neutralidade e imparcialidade das entidades públicas” a partir da publicação do decreto que marque a data das eleições. Isto quer dizer que, neste caso, os membros do Governo e os seus gabinetes “não podem intervir direta ou indiretamente em campanha eleitoral nem praticar quaisquer atos que favoreçam ou prejudiquem uma candidatura em detrimento ou vantagem de outra ou outras”.
A verdade é que, sem ser demitido, o Governo se conservará, até depois da data do decreto, em “plenitude das suas funções”, lembra fonte do Executivo. No entanto, é limitado por esta norma da lei eleitoral que poderá travar agendas públicas, com inaugurações e outros eventos incluídos. Tanto que o aviso que foi feito dizia respeito ao que os gabinetes colocam nas páginas oficiais dos ministérios, mas também à agendas dos governantes.
O cenário desta sexta-feira, com a ministra da Saúde a desdobrar-se em inaugurações a norte do país, dificilmente caberá na agenda a partir do momento em que as eleições estiverem oficialmente marcadas pelo Presidente da República. Das 10 horas da manhã às 15h30, a ministra Marta Temido inaugurou um consultório de Saúde Oral em Gaia, passou pela cerimónia de atribuição da certificação do Sistema de Gestão da Conciliação entre a Vida Profissional, Familiar e Pessoal e a inauguração da nova unidade de saúde Infanto-Juvenil de Matosinhos, inaugurou as novas instalações da USF e da Unidade de Cuidados na Comunidade de Campanhã e ainda passou por Penafiel para inaugurar a nova unidade de Hemodiálise do Serviço de Nefrologia e o novo espaço de consultas e exames do Serviço de Pneumologia do Centro Hospitalar de Tâmega e Sousa.
Questionado pelo Observador sobre orientações internas para a necessidade de recato dos governantes, o Governo não responde e a única frase que se ouve é que “está em plenitude de funções”. No entanto, ainda na segunda-feira, o primeiro-ministro fez uma leitura em relação às medidas que ainda pode tomar, no atual contexto, bastante mais restritiva do que aquela que dita a lei. Embora o Governo não tenha sido demitido e mantenha plenos poderes para tomar medidas, António Costa considera que tem a “legitimidade política limitada”. É, aliás, o argumento que usa para atirar para lá das legislativas algumas das medidas que tem alinhadas e que agora entende que condicionariam a acção do Governo que se seguirá.
Assim, nessa altura, em enrevista à RTP, Costa disse que avançará com o aumento do salário mínimo nacional para os 705 euros, com a atualização normal das pensões e ainda com os aumentos, de acordo com a inflação, do salário dos funcionários públicos. Poderia também decretar o aumento extraordinário das pensões mais baixas (que prometeu começar logo em janeiro, no auge da negociação com a esquerda) ou o aumento das prestações sociais que também estava previsto, mas aqui auto-limita-se na “legitimidade política”, remetendo essas mesmas medidas a promessas que promete inscrever no seu programa eleitoral.
Entretanto, o Parlamento avança, nestas últimas semanas antes da dissolução, com votações de matérias que os partidos definiram como prioritárias e uma das que foi aprovada por unanimidade esta sexta-feira passa por uma alteração à lei eleitoral para a Assembleia da República. A proposta do PS que foi aprovada pretendia que fosse alargado a mais um ano, o de 2022, para o “regime excecional e temporário do exercício de direito de voto antecipado para os eleitores que estejam em confinamento obrigatório no âmbito da pandemia da doença Covid-19”.
Vão, assim, manter-se as mesmas regras que permitem o voto antecipado dos eleitores que estejam em confinamento obrigatório, no âmbito da Covid-19, no respetivo domicílio ou noutro local definido pelas autoridades de saúde que não em estabelecimento hospitalar. A única norma desse regime excecional que é revogada diz respeito ao horário em que fecham as urnas de voto. Se nas eleições que se realizaram no último ano o encerramento era apenas às 20 horas, agora regressa ao horário do costume: 19 horas.