Os dois militares da GNR acusados de abuso de poder por alegadamente terem fiscalizado um café em Sobreposta, Braga, com o “único propósito de exercerem retaliação” contra o proprietário remeteram-se esta segunda-feira ao silêncio, no início do julgamento.

Os arguidos respondem por um crime de abuso de poder, em concurso aparente com um crime de violação de segredo por funcionário.

Na acusação, o Ministério Público (MP) refere que os arguidos, na altura colocados no Posto do Sameiro, decidiram fiscalizar um café em Sobreposta, Braga, devido ao proprietário do mesmo ter denunciado à GNR que o dono de um outro café, em Espinho, também no concelho de Braga, estava a laborar sem licenças.

Segundo a denúncia, o café em Espinho tinha fechado para obras e o proprietário passou a funcionar na sede do Futebol Clube de Sobreposta.

O MP refere que os dois arguidos, em vez de irem à sede daquele clube, foram ao café do denunciante, contrariando assim as ordens que tinham recebido.

Entretanto, ainda avisaram o denunciado de que tinham ordens para lá irem.

No café do denunciante atuaram “em tom elevado e de forma agressiva”, pedindo documentos e percorrendo várias dependências, abrindo armários e frigoríficos e dizendo que iria ter “a ASAE à porta”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Numa folha branca, um dos arguidos elaborou uma lista de irregularidades, que depois entregou ao proprietário.

No entanto, não foi elaborado qualquer auto de notícia nem efetuado qualquer registo na guia de patrulha.

“Não aconteceu nada que justificasse a intervenção dos arguidos”, refere ainda a acusação.

Para o Ministério Público, os arguidos agiram com o “único propósito” de retaliarem contra o proprietário por este ter denunciado um outro café, violando, assim, o “dever especial de isenção” a que estão obrigados no exercício das suas funções.

Fizeram “uso abusivo” do seu poder de fiscalização, “com intenção de prejudicar” o proprietário do café, afetando a sua reputação e humilhando-o.

Esta segunda-feira, no início do julgamento, no Tribunal de Braga, os arguidos optaram pelo silêncio, mas na contestação que juntaram ao processo negam os factos, alegando que atuaram “com todo o rigor e formalidades impostas por lei” e que fiscalizaram o estabelecimento em causa por ordem do comandante do posto.

Sublinham que detetaram várias irregularidades no estabelecimento, mas, mesmo assim, não levantaram qualquer auto de contraordenação.

Negam ainda que tenham avisado o dono do café supostamente infrator, que estava fechado quando a GNR lá foi.

O dono do café fiscalizado disse, em tribunal, que se limitou a ligar para a GNR a perguntar se “era legal” que um café que estava fechado para obras passasse a operar “a 100 metros do seu”.

Disse também que tanto ele como a mulher foram insultados pela GNR, com um dos militares “aos berros” e a “ameaçar com a ASAE”.

Referiu ainda que a GNR escreveu num “papel de mercearia” uma lista com as alegadas irregularidades detetadas no estabelecimento.

Um cliente que se encontrava no café, e que apresentou a denúncia que deu origem a este processo, criticou a “arrogância” e a “violência de voz” de um dos militares e a forma como entrou na cozinha.

Responsáveis do Futebol Clube de Sobreposta garantiram que o café que estava fechado para obras “nunca laborou” na sede da coletividade.

O julgamento continua dia 13 de dezembro, com a audição do comandante do posto do Sameiro da GNR.