Marcelo Rebelo de Sousa comentou, esta terça-feira, o veto anunciado esta segunda-feira relativamente à eutanásia. O Presidente da República explicou que devolveu o diploma ao Parlamento pelo facto de a lei ter “uma mistura” entre as condições da morte medicamente assistida, havendo “regras contraditórias”. Destacou ainda ter-se tratado de um “veto político” e não “jurídico”.
Marcelo volta a devolver ao Parlamento diploma sobre eutanásia
Numa visita a uma exposição da Helpo no Museu dos Coches, o chefe de Estado diz que é necessário que os legisladores entendam que se a eutanásia se aplica em caso de “doença fatal”, “doença incurável” ou “doença apenas grave”. “Quem vai aplicar a lei precisa de um critério”, afirma Marcelo, acrescentando que, nestas circunstâncias, “não podia promulgar uma lei destas com dúvidas destas”.
“Na mesma lei e no artigo, há regras contraditórias. É um problema político na substância”, afirma Marcelo, que frisa não é uma “questão secundária”, sendo mesmo de “vida e de morte”. “Exige-se saber que se [os critérios para eutanásia] é fatal, incurável ou apenas grave.” “Uma lei desta importância e desta sensibilidade” não podia ficar com falhas, sublinha o Presidente da República, que indica que esta tem “consequências na vida das pessoas”.
Para o chefe de Estado, as “circunstâncias” em que esta lei foi discutida — no término de uma legislatura — fez com que houvesse este tipo de “problemas”. “Uma releitura e uma reapreciação teria naturalmente resolvido o problema”, diz, sendo que a Assembleia tem de escolher entre “dois caminhos diferentes”. Um seguido pela Colômbia e por vários estados norte-americanos em que a eutanásia apenas é permitida em caso de doença fatal, ou então percorrer o caminho de Espanha, da Bélgica ou dos Países Baixos em que há uma maior abertura, permitindo-se a morte medicamente assistido em caso de “doença grave”.
Justificando o motivo pelo qual não enviou a lei para o Tribunal Constitucional, Marcelo esclarece que a lei respondia as anteriores exigências: “A Assembleia corrigiu bem”. Contudo, “ao corrigir uns pontos”, “mexeu noutros”: “A lei era uma e passou a ser outra”. E elenca que, no mesmo artigo, havia alíneas que se contrariavam. “A redação final é uma mistura, como acontece à última hora”, atira.
Marcelo ficou “atado de mãos”
O Presidente da República diz também que ficou “atado de mãos”, porque o diploma da eutanásia chegou mais tarde do que esperava, além de que não contava que viesse com tantos “problemas”. “Aliás, como sabe foi um texto que foi publicado no Diário da Assembleia da República duas vezes.”
Após o texto final se ter atrasado, Marcelo refere que apenas chegou “no dia 26 [de novembro], praticamente quando o último plenário [desta legislatura] se estava a realizar”, apontando que não deverá haver calendário para marcar uma sessão para discutir o assunto.
“Sendo assim, eu temo que, a menos que a Assembleia da República encontre outra solução, não tem hipótese de votar a matéria.”, aproveitando também para mandar uma achega aos partidos por ainda não ter recebido vários diplomas (como o da corrupção), tendo em consideração que o Parlamento deverá ser dissolvido dia 5 de dezembro: “Quanto mais depressa vierem as leis, menos desconforto existe”. Garante também que vai “esticar o mais possível” a dissolução.
Relativamente ao futuro da lei, o Presidente da República diz que “é muito simples”, dependendo da “vontade popular”. Se os portugueses votarem nos partidos que “genericamente votaram por uma margem relativamente folgada aquilo foi votado”, a lei da eutanásia terá apenas de ser corrigida, isto a menos que haja “alterações consecutivas que levantem outros problemas”.
Veto “não corresponde à sua posição pessoal e à sua convicção religiosa”
Tal como vinha no diploma publicada esta segunda-feira, Marcelo reforça que o veto não corresponde à sua “posição pessoal, à sua convicção religiosa e ética”, uma vez que esta “seria muito mais crítica em relação à lei”, assegurando que não se relaciona com as suas posições “políticas, ideológicas ou doutrinárias”.
Marcelo Rebelo de Sousa aproveitou ainda para responder às críticas do líder parlamentar do Bloco de Esquerda, Pedro Filipe Soares, que acusava o veto do Presidente de ser “cínico”, salientando que o Presidente não fica “feliz” com “incongruências do trabalho alheio”.