O grupo de trabalho que no início deste mês fez o parecer sobre a vacinação de crianças — e que serviu de base à decisão da Direção-Geral de Saúde — não faz referências à contribuição da Ordem dos Enfermeiros, contrária à vacinação generalizada de menores, dando apenas nota de que o representante dos enfermeiros não esteve presente na última reunião, nem participou na versão final.

No entanto, em esclarecimento escrito enviado ao Observador a DGS assegura que o “o contributo escrito enviado pela Ordem dos Enfermeiros foi considerado na tomada de posição” final.

Só por “motivos de transparência”, explica a DGS, se colocou uma nota no parecer indicando que “a Ordem dos Enfermeiros não se fez representar na reunião de trabalho, do dia de hoje [2 de dezembro], nem se pronunciou sobre o presente documento, até ao momento”.

Mas, apesar da ausência física do representante dos enfermeiros — que por motivos profissionais faltou a essa reunião por motivos pessoais, assim como à de 25 de novembro, tendo apresentado justificação –, a Ordem fez chegar a sua posição àquele grupo de trabalho ainda a 24 de novembro. E em nenhum momento do parecer essa posição aparece referida, ainda que, em contacto telefónico, uma representante da DGS garanta que esta tenha sido tida em conta na elaboração do documento, usando-se até termos utilizados pela Ordem dos Enfermeiros (ainda que nunca citados), como, por exemplo, a palavra “prudência”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Representante dos enfermeiros reage: Ordem mantém posicionamento

Sobre a ausência na reunião do dia 25 de novembro, Vilelas confirma que a reunião do grupo de trabalho coincidiu com uma atividade profissional que não podia adiar: “Não obstante isso, a Ordem dos Enfermeiros, e nomeadamente eu, enquanto presidente, emitimos um documento, um parecer, com a posição da Ordem e enviámos por e-mail o parecer para o grupo de trabalho para eles terem em conta na reunião, uma vez que eu estaria ausente”.

Também reforça que “o grupo de trabalho respondeu, dizendo que ia ter em conta o parecer da Ordem dos Enfermeiros perante o grupo de trabalho”. Depois de ter enviado a sua contribuição, sem que a mesma ficasse vertida na decisão final, diz ao Observador, ficou estupefacto: “Sinceramente, fiquei perplexo porque nós já tínhamos feito outros documentos relativamente à vacinação dos adolescentes e foi tido sempre em conta o parecer emitido pela Ordem.”

“Mas realço também que, e pode ver-se no documento, há dois ou três elementos que não votaram a favor, de resto todos eram a favor da vacinação. Portanto, eu não estar presente nessa reunião” talvez tenha acabado por favorecer a decisão final, de vacinar crianças dos 5 aos 11 anos: “Foi efetivamente um benefício eu não estar presente, mas felizmente que nós tínhamos emitido o parecer por escrito anteriormente.”

Ao Observador, já a 25 de novembro, Ana Rita Cavaco dissera que a evidência científica não mostrava benefícios superiores aos riscos na vacinação desta faixa etária. E pedia ainda aos enfermeiros que rejeitassem os pedidos para adiar as férias.

Bastonária da Ordem dos Enfermeiros contra vacinação de crianças entre os cinco e os 11 anos

A troca de correspondência

Uma troca de correspondência eletrónica com o representante dos enfermeiros a 24 de novembro, a que o Observador teve acesso, revela que foi, pelo menos, enviada a posição do enfermeiro representante, José Vilelas, e validada pela bastonária Ana Rita Cavaco para aquele grupo, com conhecimento de todos os membros. O posicionamento dos enfermeiros é há muito público, estando disponível no seu site: é contra a vacinação generalizada de menores na faixa etária dos 5 aos 11 anos.

Justificando a sua ausência numa reunião do dia 25 de novembro, Vilelas, também presidente da mesa do Colégio da Especialidade de Saúde Infantil e Pediátrica da Ordem dos Enfermeiros, fez chegar na véspera um email ao grupo de trabalho com o que pretendia ver refletido na versão final: “O documento que elaborámos foi validado e assinado pela Sra Bastonária Ana Rita Cavaco e reflete a nossa posição. […] Esperamos que este possa vir a contribuir para a concretização do documento final emitido por este Grupo de Trabalho. Em relação ao primeiro draft irei ler para poder enviar os meus comentários.” O email foi enviado às 20h00 de dia 24 de novembro.

Grupo de trabalho confirmou receção de contributo

Vinte minutos depois do envio desta informação, Dina Oliveira, enfermeira especialista em saúde infantil e pediátrica, membro do grupo de trabalho que representa a própria Direção-Geral da Saúde, responde ao email, aceitando a posição da Ordem dos Enfermeiros, enviada por José Vilelas, como contribuição: “Muito agradecemos a sua comunicação e toda a colaboração e disponibilidade nos trabalhos desenvolvidos. O parecer da ordem dos Enfermeiros será acolhido e colocado à discussão na reunião do Grupo de Trabalho”.

Mas não foi a única vez que a Ordem fez saber a sua posição: a bastonária Ana Rita Cavaco reforçou esta posição no dia seguinte, tendo dado entrada na DGS um email, dirigido à Diretora-Geral da Saúde, Graça Freitas.

Após o envio desse contributo, sabe o Observador, e não tendo a posição da Ordem dos Enfermeiros sofrido alterações, a verdade é que não foi feito mais nenhum comentário às versões que foram sendo feitas do parecer e enviadas por email, nem dada qualquer contribuição adicional até à redação do documento final.

Notícia atualizada às 22h40 com esclarecimento da DGS