Primeiro era segunda, depois esta terça às 09h00, às 11h00 e finalmente às 14h00, para voltar a ser adiada para esta quarta-feira. A primeira audição do banqueiro procurado pelas autoridades portuguesas e detido sábado, na África do Sul, ainda não aconteceu. Mas o próprio João Rendeiro acabou por dizer aos jornalistas quais são as suas intenções: “Eu não vou regressar a Portugal”.
O anúncio foi feito naquela que seria a audição marcada para as 14h00 locais, 12h00 em Portugal. Depois de breves minutos em que João Rendeiro esteve sentado no banco, a ouvir o juiz. Vestido com uma camisa aos quadrados (o seu advogado avisou os jornalistas de que tinha mudado de roupa e comido), o antigo banqueiro disse ao juiz Rajesh Parshotam que não pretendia prestar declarações. E, mal se levantou, foi abordado pelos repórteres portugueses na sala que lhe perguntaram se queria regressar a Portugal. “Eu não vou regressar a Portugal”, atirou. Também lhe perguntaram se iria ficar na cadeia onde passou a noite e se tinha sido ameaçado, como a sua advogada informou esta manhã, mas o arguido abandonou a sala sem dizer mais nada.
Só quando a porta-voz do tribunal entregou a ata do que tinha acontecido naquela sala no segundo piso do tribunal Verulam Magistrates, em Durban, é que os jornalistas perceberam o que se tinha passado naqueles minutos. Segundo a RTP, o Ministério Público, representado por Rajesh Parshotam, anunciou que ia apresentar uma nova acusação, sem dizer qual. Mais tarde viria a saber-se que tinha chegado o segundo mandado de detenção em nome de Rendeiro. Perante isso, a defesa sul africana de Rendeiro disse que precisava de mais tempo para analisar a acusação e perceber o valor da fiança a pedir. Um argumento a juntar a outro que já tinha anunciado de manhã: João Rendeiro foi ameaçado de morte na cadeia de alta segurança de Westville, onde passou a noite, e os seus advogados querem que ele seja transferido para uma outra.
Procuradoria em Durban recebeu segundo mandado de detenção de Rendeiro
Nas duas noites anteriores, Rendeiro tinha ficado preso na esquadra policial até ser presente ao juiz de instrução que irá determinar se ficará em liberdade enquanto decorre o processo de extradição, como quer a defesa, se fica preso, como pede o Ministério Público. Na segunda-feira a defesa pediu mais tempo para analisar o processo e esta terça apresentou igual argumento.
Uma noite na prisão em que foi ameaçado de morte. A advogada vai pedir transferência
João Rendeiro, 69 anos, passou a noite na prisão de Westville e chegou ao tribunal pelas 9h00 locais (7h00 em Lisboa) numa carrinha celular juntamente com outros reclusos que vêm do mesmo estabelecimento prisional, segundo a CNN, mas a sua audição acabou alterada para a tarde por pedido da própria advogada. Segundo June Marks, Rendeiro foi ameaçado de morte na cadeia.
“Como resultado das notícias” nos órgãos de informação, “ele [João Rendeiro] está a receber ameaças de morte”, referiu a advogada, explicando que “os outros prisioneiros ouvem as notícias na rádio”, disse à Lusa June Marks. Por isso, a defesa pediu já que Rendeiro não volte à cadeia de Westville e que seja transferido.
Foi no entanto outro advogado, Sean Kelly, que esteve no tribunal durante esta terça-feira. Aliás Kelly disse aos jornalistas no local desconhecer as ameaças de que Rendeiro foi alvo. Disse também que o antigo líder do BPP está “bem”, já mudou de roupa e está tranquilo à espera da audiência que vai determinar o seu destino enquanto decorrer o processo de extradição.
No local, os jornalistas tiveram acesso ao mandado de detenção emitido pelas autoridades sul africanas que foi assinado precisamente quatro dias depois de o antigo banqueiro ter dado uma entrevista à CNN. Nesse documento emitido em Pretória, segundo a Lusa, o antigo líder do BPP é apontado como uma “pessoa suscetível de ser entregue a Portugal” ao abrigo do artigo 16 da Convenção Europeia de Extradição.
Rendeiro era para ter sido ouvido na segunda-feira
Rendeiro era para ter sido ouvido segunda-feira, mas a sua advogada June Marks pediu mais tempo para analisar todo o processo. A advogada quer que Rendeiro saia em liberdade sob pagamento de uma caução, enquanto o Ministério Público considera os crimes que praticou demasiado graves, pelo que quer que ele permaneça preso. Rendeiro foi alvo de dois mandados de detenção internacional: um para cumprir uma pena de cadeia de cinco anos e oito meses, num processo que já transitou em julgado, outro para ficar em prisão preventiva no caso em que foi condenado a uma pena de cadeia de dez anos e ao qual comunicou não ter intenções de regressar a Portugal.
Audição de João Rendeiro adiada para terça-feira. Defesa vai pedir libertação sob fiança
A equipa que está agora a defender Rendeiro terá sido contratada há três meses, mal o banqueiro se instalou em tribunal. Em entrevista a vários meios de comunicação, a advogada June Marks lembrou que o Ministério Público sul africano tem um “dos piores históricos do mundo” em derrotas e que se o juiz de instrução não acatar a proposta da defesa, que recorre para um tribunal superior. Segunda-feira, a defesa de Rendeiro ainda não tinha tido acesso ao processo de extradição.
O processo de extradição, no entanto, só será apreciado depois da decisão do Tribunal de Durban. “Será um tribunal de primeira instância a decidir sobre o pedido das autoridades portuguesas. Depois de ouvir as partes, o juiz titular desse processo emitirá um parecer para o ministro da Justiça — que tomará a sua decisão: autorizar a extradição ou recusá-la. E dessa decisão cabe recurso para o tribunal superior”, explicou ao Observador o professor e jurista André Thomashausen, que lembrou que em África do Sul é comum aplicar medidas de coação alternativas à prisão, não só através do pagamento de uma caução, mas também a entrega do passaporte, por exemplo, e mesmo a prisão domiciliária.
Rendeiro. As defesas possíveis e os perigos das prisões sul-africanas
João Rendeiro foi detido num hotel de luxo em Durban na posse de vários cartões bancários. A sua fuga começou em Londres, de onde terá partido num jato privado para o Qatar. Terá passado por outros países africanos antes de chegar à África do Sul, sempre alojado em hotéis de luxo. Em entrevista à CNN e ao Tal e Qual disse mesmo que não se escondia, ia à praia, ao ginásio e ao restaurante. No entanto, as autoridades perceberam que recorria a tecnologia encriptada para contactar com os mais próximos. Essa entrevista foi já traduzida para inglês e entregue ao Ministério Público sul africano.