O crítico de arte Nuno Crespo considerou esta segunda-feira que as acusações que lhe são apontadas, no processo de escolha do representante de Portugal na Bienal de Arte de Veneza 2022, são “falsas e manipuladoras”, classificando-as de “campanha difamatória”.

São falsas e manipuladoras as acusações de que, intencionalmente e motivado por propósitos racistas, xenófobos e misóginos, boicotei um dos projetos apresentados” a concurso, afirmou Nuno Crespo em comunicado enviado à Lusa.

Nuno Crespo foi um dos quatro elementos da comissão de apreciação — juntamente com Ana Cristina Cachola, Giulia Lamoni e Sofia Isidoro — que escolheu o projeto que representará Portugal na 59.ª edição daquela bienal, em 2022, em Itália.

Esta comissão analisou quatro projetos propostos e, com base na atribuição de pontuação para diferentes critérios, escolheu a instalação artística “Vampires in Space”, de Pedro Neves Marques, com curadoria de João Mourão e Luís Silva.

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Em segundo lugar ficou o projeto “A ferida”, da artista Grada Kilomba, o que levou o curador, Bruno Leitão, a recorrer do resultado final do concurso, alegando, em declarações à Lusa, haver “incoerências e irregularidades graves nos critérios de avaliação e violações explícitas dos ‘Deveres do Júri’, que são definidos por lei”.

Curador Bruno Leitão recorre de resultado de Grada Kilomba no concurso para representação portuguesa na Bienal de Veneza

Depois de ter contestado os resultados provisórios, em audiência de interessados, sem que tivesse havido alteração do resultado final, Bruno Leitão disse que iria apresentar recurso hierárquico à Direção-Geral das Artes (DGArtes) e ao Ministério da Cultura.

De acordo com a documentação do concurso, a que a Lusa teve acesso, três dos elementos do júri atribuíram ao projeto de Grada Kilomba pontuações de 19 e 20 valores nos diferentes critérios de apreciação.

No entanto, o quarto elemento — Nuno Crespo — avaliou o projeto com 10 e 15 valores, atribuindo aos outros três projetos candidatos notas entre os 16 e os 20 valores.

Nas críticas ao processo de escolha, Bruno Leitão pôs em causa a disparidade de critérios de avaliação no concurso.

“Quando vemos as pontuações finais, dá ideia de unanimidade e proximidade de candidaturas, mas quando vemos as notas atribuídas por cada membro do júri, não foi nada assim. É muito perverso”, disse.

Em comunicado, Nuno Crespo recordou esta segunda-feira que “as pontuações foram atribuídas por uma comissão cumprindo um regulamento conhecido por todos“.

Esta é uma campanha difamatória baseada unicamente no facto de não se aceitar que, resultante da fórmula aritmética concursal, uma proposta tenha ficado em segundo lugar”, afirmou.

Nuno Crespo disse ainda que vê com “enorme orgulho” a escolha feita pela comissão, do projeto de Pedro Neves Marques, embora considere que a proposta que “reunia as melhores condições para representar Portugal” era da artista Luisa Cunha, com curadoria de Sara Matos.

Sobre o racismo, a violência, as mentiras e o discurso de ódio com que fui atacado nas últimas semanas, não posso falar porque não há palavras para dar conta do choque, da sua injustiça e cegueira”, lamentou Nuno Crespo, acrescentando: “Conheço bem o preconceito e a dificuldade de pertencer a uma minoria. Por isso, há anos que estou ativamente envolvido no combate social e cultural contra todas as formas de discriminação”.

Além do recurso apresentado pelo curador de Grada Kilomba, o caso originou na semana passada uma carta aberta, assinada por cerca de 80 personalidades, associações e coletivos, exigindo uma “revisão da avaliação” do concurso de escolha do representante de Portugal na Bienal de Arte de Veneza.

Carta aberta pela “revisão da avaliação” de concurso para Bienal de Veneza reúne 80 entidades

Segundo a DGArtes, a instalação artística “Vampires in Space”, de Pedro Neves Marques, aborda “questões de identidade de género, sexualidade e reprodução ‘queer’, bem como formas de família não-nuclear“.

A 59.ª Bienal de Arte de Veneza decorrerá de 23 de abril a 27 de novembro de 2022.

Os países participantes têm até 11 de janeiro para apresentar o projeto à organização.