No último frente a frente destas legislativas, Rui Rio entrou nos estúdios da RTP disposto a conseguir mais uma peça para montar o futuro xadrez parlamentar. Mas acabou a confirmar uma suspeita que há muito vinha ganhando forma de certeza: Inês Sousa Real não quer ser vista na companhia do PSD.

O tema da equidistância do PAN acabou por marcar alguns debates à esquerda, sobretudo aquele que pôs frente a frente Sousa Real e Catarina Martins. A líder do PAN resistiu sempre em comprometer-se com um dos lados e foi garantido estar disponível para encontrar uma solução com ou o PS ou com o PSD.

Ora, esta noite Sousa Real desfez o tabu da equidistância: com este PSD, o PAN não quer conversas. No arranque do debate, a líder do partido ambientalista ainda deu a resposta chapa cinco — para o PAN, foi repetindo Sousa Real, o que verdadeiramente importa é a “reposição de retrocessos em matéria democrática” e o “avançar das causas” que interessam ao partido.

“Teremos que ver qual a força política que está em condições, não só de formar governo, mas de se aproximar daquilo que é uma agenda do século XXI, uma agenda progressista e ambientalista, que se preocupa também com os direitos humanos”, sublinhou Sousa Real.

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Rio foi atrás do canto da sereia — “saúdo a abertura à negociação do PAN” — mas acabou a ouvir a interlocutora a mudar rapidamente de tom. Do início ao fim do debate, Sousa Real colocou todos os esforços em provar as divergências face ao PSD e em investir contra Rio.

O fim dos debates quinzenais (“é um desprezo pelo Parlamento”), eucaliptização das florestas (“é ter memória curta em relação aos incêndios de 2017″), a descida já do IRC em detrimento do IRS ou, por exemplo, a resistência em rever as PPP rodoviárias.

Surpreendido pelo estilo confrontacional da adversária, Rio, que também aproveitou para rotular o PAN de ser um partido “fundamentalista”, ia respondendo às investidas de Sousa Real com críticas à irresponsabilidade do partido, sobretudo em matéria de dívida pública e nos compromissos que o Estado tem de cumprir.

“Se fizéssemos o que o PAN diz agravava mais o défice, a dívida pública. Colocava Portugal numa situação de dependência pior, temos que conseguir um equilíbrio possível face às circunstâncias.”

No último minuto, Rio não se desviou um centímetro da sua posição sobre o fim dos debates quinzenais. “Para mim, a política tem que ter credibilidade, não tem de ser feita com espetáculo para abrir o telejornal, tem de ser feita com seriedade e sem espetáculo. Isso descredibiliza.”

O diálogo mais revelador

Rui Rio: Queria saudar esta atitude, precisamente a mesma que o PSD tem, são os dois únicos partidos que têm e que é uma abertura à negociação. Temos consciência quando há uma eleição democrática só ganha um, é dificílimo alguém ter maioria absoluta. Se eu ganhar vai ser difícil ter maioria absoluta e o PS a mesma coisa. Temos que ter disponibilidade para conversar, o PAN tem mostrado essa disponibilidade o PS não, fecha-se. Os partidos devem dialogar porque dificilmente haverá uma maioria absoluta de alguém. Folgo em ver que o PAN coloca aqui um assunto diferente do que sejam apenas os animais ou o ambiente, coloca aqui o regime e estou de acordo com isso.

Relativamente às questões dos debates dos quinzenais o que é relevante na fiscalização da Assembleia da República é que a Assembleia esteja capaz de fiscalizar a atuação do governo, que os membros do governo estejam lá. O primeiro-ministro deve estar e hoje vai em média uma vez por mês à Assembleia da República. Aquilo que são os debates quinzenais é semana sim, semana não, uma tarde inteira está lá o primeiro-ministro com a equipa governamental toda, não sabe que tipo de resposta vai sair e a equipa ministerial toda ali e no dia anterior eventualmente a preparar as perguntas que possam ser feitas. Aquilo não visa um esclarecimento, visa um espetáculo mediático.

Inês Sousa Real: É uma linha vermelha, é uma preocupação para reforçarmos a nossa democracia. Aí de facto temos visões completamente diferentes. A Assembleia da República não é um mero órgão fiscalizador, é um órgão deliberativo também. Um órgão de soberania fundamental, um pilar da nossa democracia. O governo não pode estar equidistante nem à margem daquilo que é o diálogo na Assembleia da República para mais quando estamos a viver um momento tão complexo para o país como a crise sócio-económica em que é fundamental garantir que há uma visão de médio-longo prazo para o país e que a Assembleia da República também toma parte desta decisão.

O PAN já veio dizer em vários momentos que é preciso romper com esta bipartidarização a que temos assistido na governação do nosso país que oscila entre o PS e o PSD. É preciso romper com a forma de governar o país e torná-la mais plural com outras forças políticas. Aquilo que o PAN quer é que haja um respeito pelo Parlamento que não é um local qualquer, é a casa da democracia que representa a voz do povo. O governo não tem que olhar com desprezo para a Assembleia da República, achar que perder uma tarde a dialogar com a Assembleia da República é uma perda de tempo é desprezar o trabalho da Assembleia da República.

Rui Rio: Desculpe, isto não é verdade. Aquilo que está em vigor, há os mesmos debates. O que se pretende é que os debates sejam uma verdadeira fiscalização e acompanhamento do governo e não um espetáculo em que semana sim, semana não está lá o primeiro-ministro para aquela berraria.

Inês Sousa Real: Não é berraria.

Rui Rio: Então vamos para uma democracia maior? O primeiro-ministro vai lá todas as semanas, o governo vai lá todas as semanas. Aquilo que se pretende é fiscalização do governo. O governo está permanentemente na Assembleia, sabe que é verdade.