René Robert, nascido em Fribourg, na Suíça, morreu vítima de “indiferença”, numa das artérias mais movimentadas de Paris, relata o amigo e jornalista Michel Mompontet, ainda em choque com a notícia. O fotógrafo morreu de hipotermia depois de ter ficado nove horas estendido no chão, na Rue de Turbigo, no bairro dos cafés, a poucos metros da Place de la République, entre uma loja de vinhos e uma de óculos.
Parce qu’elle nous dit des choses sur ce que nous sommes en train de devenir l’histoire édifiante de la mort de René Robert et reprise bien au-delà de nos frontières. Puisse-t-elle servir de réveil à nos consciences. https://t.co/qajpmomgOv
— Michel Mompontet (@mompontet) January 27, 2022
Tudo aconteceu na passada quarta-feira, 19 de janeiro, quando, por volta das 21h00, o fotógrafo de 84 anos caiu inanimado durante a sua caminhada por um dos bairros mais movimentados da cena parisiense. Segundo o El País, não é possível apurar se o suíço tropeçou, teve uma tontura ou desmaiou. Quando na manhã seguinte, por volta das 6h00, um morador de rua que não se quis identificar deu o alerta aos bombeiros, René Robert foi transportado para o hospital Cochi, mas já estava morto. “Hipotermia grave”, foi a causa avançada pelas autoridades.
Autor de grande parte da fotobiografia dos astros do flamenco Camarón de la Isla, Paco de Lucía ou Enrique Morente, René Robert era “discreto”, “muito atento aos outros”, “divertido, apesar de ser um homem de poucas palavras”. Pelo menos é assim que o descreve o amigo Michel Mompontet, num editorial que lhe dedicou na televisão pública francesa.
“Em vez de dar lições e acusar quem quer que seja, há que responder a uma pergunta incómoda: e se eu me tivesse deparado com um homem deitado no chão, estou certo a 100% de que teria parado para ajudar? Nunca me desviei de um sem-abrigo encostado à minha porta? Não estou certo a 100% e isso é uma dor que me persegue. Mas temos pressa. Temos pressa, temos as nossas vidas e viramos a cara”, escreve o jornalista.
Para o amigo do fotógrafo, estamos perante um exemplo trágico de uma sociedade cada vez mais autocentrada, incapaz, sequer, de estender a mão a pessoas em situação de sem abrigo que se multiplicam França e Europa fora. “Ao menos que se aprenda alguma coisa com esta morte. Quando uma pessoa está deitada no chão, mesmo que estejamos com pressa, vamos ajudá-la. Vamos parar.”
Apesar de ter começado a trabalhar na área da publicidade e da moda, René Robert começou a notabilizar-se nos retratos do flamenco ainda nos anos sessenta. Autor das fotografias dos livros Flamenco, La Râge et la Grâce (Raiva e Graça) e Atitudes Flamenco, doou milhares de retratos à Biblioteca Nacional Francesa em Paris. “Um verdadeiro tesouro para os amantes do flamenco, mas também para todos os fãs das artes gráficas”, sublinha o amigo e responsável pela divulgação pública da morte de um artista que morreu de frio, sem ninguém dar por isso.