Mais de 80% dos votos dos emigrantes no círculo da Europa foram considerados nulos, após protestos do PSD. Já no círculo Fora da Europa foram anulados menos de 3% dos votos. Descontados os votos nulos, a distribuição de mandatos mantém-se, com PS e PSD a conquistarem dois deputados cada nestes círculos da emigração.

Segundo o edital publicado esta quinta-feira sobre o apuramento geral da eleição do círculo da Europa, a que o Observador teve acesso, de um total de 195.701 votos recebidos, 157.205 foram considerados nulos, o que equivale a 80,32%.

Em causa estão protestos apresentados pelo PSD após a maioria das mesas ter validado votos que não vinham acompanhados de cópia do cartão de cidadão, como exige formalmente a lei.

Como esses votos foram misturados com os votos válidos, a mesa da assembleia de apuramento geral acabou por anular os resultados de dezenas de mesas, incluindo votos válidos e inválidos, por ser impossível distingui-los uma vez na urna.

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O mesmo critério não foi seguido nas mesas de votos dos círculos de emigração Fora da Europa. Perante uma queixa semelhante, foram anulados apenas 1.907 votos, o equivalente a 2,95% da totalidade dos 64.534 boletins registados. Todos os restantes foram considerados válidos, o que se explica por um critério diferente na consideração da validade de votos em urnas com o mesmo tipo de documentos (não) anexados.

[PS acusa PSD de “argumentos frágeis” e apela a “revisão urgente” da lei eleitoral: pode ouvir aqui as declarações de Paulo Pisco, cabeça de lista do PS no círculo da Europa, à Rádio Observador:]

Voto no estrangeiro. PS acusa PSD de “argumentos frágeis” e apela a “revisão urgente” da lei eleitoral

O número total de votantes no círculo da Europa equivale a 20,67% do número de inscritos elegíveis, o que representa um forte aumento da participação relativamente às legislativas de 2019, quando apenas 12,05% dos eleitores inscritos no estrangeiro votaram. Porém, destes 20,67% de eleitores elegíveis que votaram, cerca de 80% acabaram por ver o seu voto ser considerado nulo.

No círculo eleitoral Fora da Europa, a participação foi de 10,86%, também maior do que a participação de 2019, quando apenas 8,81% dos eleitores registados exerceram o direito de voto.

PS e PSD elegem no círculo Europa, Chega em terceiro lugar com 11%

Quanto aos resultados, no círculo da Europa o PS conquistou 14.345 (39,63%) dos 36.191 votos válidos e o PSD 9.761 (27,05%), tendo o Chega sido o terceiro partido mais votado, com 3.985 votos (11,01%).

Seguem-se Bloco de Esquerda e CDU, respetivamente com 1.579 e 1.407 votos — e ambos com menos de metade dos votos do Chega —, PAN, com 1.343 votos, e em sétimo lugar a Iniciativa Liberal, com 1.039 votos, quase quatro vezes menos do que o Chega.

Foram eleitos Paulo Pisco, do PS, e Maria Ester Vargas, do PSD.

Círculo Fora da Europa: Santos Silva (PS) e Maló de Abreu (PSD) eleitos

No círculo Fora da Europa, o PSD foi o partido mais votado, com 23.942 (37,09%) dos 64.534 votos válidos, enquanto o PS obteve 19.084 (29,57%), tendo o Chega sido, mais uma vez, o terceiro partido mais votado, com 6.123 votos (9,48%).

Foram eleitos António Maló de Abreu, do PSD, e Augusto Santos Silva, do PS.

Com os quatro deputados eleitos pela emigração, o PS fica com 119 deputados e o PSD com 73 deputados sozinho, subindo para 78 deputados somando os valores obtidos nas coligações de que fez parte na Madeira e nos Açores.

Os partidos têm 24 horas para recorrer destes resultados mas o cabeça de lista do PS pelo círculo da Europa, Paulo Pisco, já afirmou à Rádio Observador que os socialistas não vão recorrer dos resultados, em declarações à Rádio Observador. E em comunicado, o Partido Socialista diz que “não contribuirá mais para o prolongamento deste grave e inútil incidente provocado pelo PSD e deseja que todo o processo eleitoral fique encerrado o mais rapidamente possível, para dar lugar à nova legislatura”.

Os socialistas classificam de “lamentável” o protesto apresentado pelo PSD. E prometem dar prioridade, na próxima legislatura, a uma alteração da lei eleitoral “para facilitar os processos de exercício do direito de voto dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro”. O PS diz também que essa revisão (que poderia já ter sido feita em anos anteriores) estava planeada para a última legislatura, que foi interrompida com o chumbo do Orçamento do Estado para 2022.

Os sociais-democratas defendem, por seu turno, que apresentaram a queixa apenas para que a lei fosse cumprida.

Resultados oficiais ainda desatualizados online. E assim vão continuar, para já

Apesar de o edital feito após a anulação de votos no círculo Europa, a que o Observador teve acesso, já contemplar os resultados sem os boletins inválidos (que foram anulados na sequência de um protesto do PSD), no site da Secretaria Geral do Ministério da Administração Interna (MAI) os resultados oficiais que surgem são outros, prévios ao edital.

Esta quinta-feira à tarde, no site do SGMAI o PS, partido mais votado, aparecia ainda com 78.048 votos quando, após a anulação, apenas 14.345 são válidos. E o PSD com 49.063 votos — e não com os 9.761 agora considerados válidos —, por exemplo.

Os resultados oficiais, ainda por atualizar, no site da Secretaria Geral do Ministério da Administração Interna (@ SGMAI)

O Observador tentou esclarecer junto da Secretaria Geral do MAI e junto do próprio gabinete ministerial os motivos para a demora na publicação online e no site dos resultados agora oficiais, após a anulação de votos já tornada pública em edital. O MAI e a SGMAI foram ainda questionados sobre  quando terminou o apuramento de resultados após a contagem de votos nulos e quando previam publicar no site oficial os novos resultados.

Fonte do Ministério da Administração Interna (MAI) apontou que os resultados que surgem online “correspondem aos resultados do escrutínio provisório até ao final do dia 9 de fevereiro”. Ou seja, até ao final de esta quarta-feira, antes de ter sido feita nova contagem resultante da anulação de cerca de 80% dos votos dos emigrantes portugueses na Europa.

Defendendo que “a divulgação e publicação, em Diário da República, dos resultados definitivos resultantes das Assembleias de Apuramento Geral é uma responsabilidade da Comissão Nacional de Eleições” e indicando que os resultados oficiais “não são divulgados através da referida página”, a mesma fonte foi questionada sobre se os resultados ficarão desatualizados nessa página e sobre se é a CNE que tem a responsabilidade de os atualizar. Na resposta, apontou:

“O site da SGMAI tem os resultados provisórios. Os dados finais vão constar do Diário da República”.

Secretária de Estado assume “frustração”, que quer evitar “no futuro”

A secretária de Estado das Comunidades, Berta Nunes, também já reagiu à anulação de 80% dos votos de emigrantes portugueses na Europa.

Em declarações à Antena 1, Berta Nunes apontou: “Para quem votou é uma frustração. Agora esperamos que [isso] também seja considerado no momento da alteração da lei eleitoral e que este tipo de situações seja evitado no futuro”.