A dezanove de dias das eleições legislativas, a vice-presidente da distrital do Chega de Braga, Eugénia Santos, foi até Tomar encontrar-se com André Ventura munida de documentação que dizia ser de muita “gravidade” sobre o líder distrital, que é também agora deputado, Filipe Melo. Já esta segunda-feira, “Jenny”, como é conhecida no partido, foi suspensa de militante e agora ameaça divulgar mensagens trocadas com o deputado, bem como o conteúdo dessa documentação. Nessa mesma resposta, a até agora vice da distrital desafia André Ventura a provar se “realmente é anti-sistema ou não“. É mais uma guerra nos órgãos distritais do Chega e mais uma afronta direta a Ventura.

Eugénia Santos diz, em declarações ao Observador, que foi afastada por um comentário numa publicação de André Ventura, em que sugeria que existiam “bandidos” entre os deputados do Chega, numa alusão a Filipe Melo. “Enfim, e bandidos são os outros”, comentou a dirigente num post onde Ventura elogiava os 12 eleitos. A vice-presidente suspensa insiste que o que espera do “presidente do partido, que constantemente aponta aos outros estas lacunas, mostre que é diferente”. Para Eugénia Santos, que Ventura não afastar o deputado eleito por Braga, fica sujeito a que os outros partidos lhe apontem o dedo.

Na base da contestação a Filipe Melo está assim o facto de o deputado do Chega eleito pelo círculo de Braga ter sido condenado pelo tribunal a pagar dívidas superiores a 80 mil euros. A guerra interna terá, no entanto, começado ainda antes desse facto ter sido noticiado, logo após as autárquicas, e teve o seu primeiro episódio público na fase final da campanha eleitoral das legislativas.

No último dia de campanha, a hora e meia do período de reflexão, a imprensa local dava conta de que várias concelhias estariam contra o candidato e líder da distrital, Filipe Melo. O coordenador da concelhia de Barcelos, Agostinho Mota, queixava-se de o facto de a distrital ter feito ações de campanha em Barcelos sem contactar a estrutura local. Nessa mesma circunstância a comissão política concelhia de Barcelos “decidiu retirar a confiança política à direção distrital de Braga”, referindo  “vários atropelos perpetuados” por esse órgãos e “nomeadamente o seu presidente [Filipe Melo]”.

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Na concelhia de Vila Verde, as queixas foram as mesmas e o vereador eleito naquela autarquia, Fernando Silva, queixou-se igualmente de não ser convidado. Também ao semanário V, órgão do distrito de Braga, o presidente da concelhia de Famalicão afirmou que o líder distrital e, na altura, candidato a deputado não tinha “nenhuma qualidade como pessoa ou política para assumir uma candidatura por este partido”. No mesmo artigo havia ainda queixas de existir um paraquedista na lista de Braga, o assessor parlamentar do Chega Rodrigo Alves Taxa, próximo de André Ventura, mas que é de Santarém e não do Minho.

Era assim público no final de janeiro que pelo menos três das 14 concelhias do distrito estavam contra o presidente da distrital. Esta segunda-feira, o protesto subiu de tom e foi emitido um “comunicado conjunto” das “concelhias do Chega em Braga“. O líder da distrital — que ao Observador não quis comentar o assunto — terá desvalorizado o comunicado em declarações ao jornal O Minho, dizendo que o comunicado não representa as tais 14 concelhias, mas apenas “as mesmas concelhias que já tinham vindo a fazer comunicados anteriormente e que têm uma posição antagónica à distrital”.

O email foi enviado do email da concelhia de Esposende, que assim se juntava publicamente às críticas da concelhia de Barcelos, Vila Verde e Famalicão. Sobre estas quatro não há dúvidas que contestam o líder distrital.

O comunicado referia que “no seguimento da última publicação da revista Visão, sobre o presidente da Distrital de Braga e deputado eleito pelo ciclo eleitoral de Braga, as concelhias do distrito vão marcar uma posição de total afastamento da pessoa em questão, pois não se reveem em absoluto em Filipe Melo e não encontram justificação para os seus comportamentos”.

Após uma notícia inicial em que Correio da Manhã que deu conta de dívidas de 80 mil euros por parte do deputado, a revista Visão aprofundou a história e relatou situações pouco claras (como as dívidas serem contraídas para adquirir bens e o próprio não ter agora bens para as pagar), além de ter acumulado processos judiciais. Mais do que pedir o afastamento, os subscritores do comunicado: “A vice-presidente [da distrital] Eugénia Santos , o secretário José Osório e o tesoureiro Filipe Araújo estão solidários com as concelhias”.

Vice-presidente suspensa no dia em que assina comunicado

No mesmo dia em que se solidariza com o comunicado das concelhias, a vice-presidente da distrital, Eugénia Santos, foi suspensa por 90 dias. A decisão da Comissão de Ética tem ainda, segundo a deliberação, “efeitos quanto a todos os mandatos e funções do visado, bem como quanto à sua capacidade eleitoral ativa e passiva.” Na base da suspensão estará, no entanto, não o comunicado, mas o tal comentário à publicação da página de André Ventura no Facebook.

Após a suspensão, já esta terça-feira, Eugénia Santos fez uma publicação na sua página de Facebook a dizer que depois das autárquicas queixou-se ao líder distrital de falta de apoio nessas eleições. A vice-presidente acusava também o presidente de não a deixar fazer publicações de apoio a André Ventura no seu facebook pessoal porque “ainda havia quem mandava.”

A vice-presidente queixou-se ainda ao presidente da distrital que “algumas pessoas que trabalharam desde sempre” tenham sido “colocadas em segundo plano”, dando o órgão distrital primazia aos que “contribuíam financeiramente.” Logo nessa ocasião, a vice-presidente da distrital de Braga terá deixado claro que não há “não desejava continuar” e deixou à consideração de Filipe Melo “quando seria oportuno apresentar a minha demissão para não prejudicar o seu projeto pessoal de ser deputado da nação”. E acrescenta: “Tenho todas as mensagens trocadas com ele e em momento oportuno tornarei públicas.”

Jenny Santos revela então que foi a Tomar entregar documentação que comprometia Filipe Melo e que depois disso se ausentou “durante a campanha pois como diz o nosso Presidente “não podemos ter fotos ao lado de ban#####” e que terá dito isso mesmo a André Ventura.

A dirigente distrital do Chega escreve ainda que “a história tinha de ser contada, pois o presidente da distrital é perito em inventar histórias e romantizar mentiras.” E deixa, por fim, o derradeiro desafio ao presidente do Chega, que compromete: “Agora cabe ao presidente André Ventura mostrar se realmente é anti-sistema ou não… Desde o dia 11 de Janeiro que ele sabe toda a verdade.”

Jenny Santos é personal trainer, faz ginásio desde os 10 anos e a própria revelou, quando se candidatou, que foi “miss ‘bodyfitness’ durante dois anos consecutivos”. Durante a campanha autárquica, em que foi candidata à câmara de Braga, teve de vir a público demarcar-se de uma rede de tráfico de armamento, na qual tinha sido envolvido o ex-marido.

Contactado pelo Observador, o deputado e presidente da distrital de Braga não quis fazer qualquer comentário.