A Rússia anunciou esta terça-feira que está a retirar para as bases militares de origem algumas das suas tropas recentemente mobilizadas para as proximidades da fronteira com a Ucrânia, de acordo com um comunicado do porta-voz do Ministério da Defesa da Rússia, Igor Konashenkov, inicialmente veiculado por agências de notícias russas e entretanto publicado na página governamental.
“Unidades dos distritos militares Sul e Ocidental, depois de terem completado das suas tarefas, já começaram a tomar transportes ferroviários e rodoviários e hoje vão começar a regressar às suas guarnições militares”, disse o porta-voz.
Segundo o comunicado, “um conjunto de eventos de treino de combate, incluindo exercícios, foram executados de acordo com os planos”. “Uma vez que os treinos terminaram, as tropas, como sempre, vão regressar para os seus postos permanentes“, disse o porta-voz, no mesmo dia em que o governo russo também revelou imagens que mostram a retirada destas unidades militares.
A agência russa Interfax enquadrou esta informação como uma evidência de que a mobilização militar em torno da fronteira com a Ucrânia não representava o risco de invasão do país, mas apenas uma operação de treino militar. O mesmo fez a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Maria Zakharova, que poucos minutos depois da divulgação do comunicado recorreu ao Facebook para assinalar que o anúncio desta terça-feira deita por terra a “propaganda ocidental” sobre a guerra.
“O dia 15 de fevereiro de 2022 ficará para a história como o dia em que a propaganda ocidental de guerra falhou”, escreveu Zakharova no Facebook. “Humilhada e destruída sem que um único tiro tenha sido disparado.”
A Rússia tem rejeitado, desde o início, qualquer intenção de invadir a Ucrânia, argumentando que isso faz parte da propaganda do Ocidente para incentivar à guerra contra a Rússia e garantindo que o país apenas tem levado a cabo exercícios militares no seu território. Ainda assim, e de acordo com outra informação da agência russa Interfax, a Rússia continua as suas atividades militares em vários outros pontos da fronteira com a Ucrânia.
Não há, por isso, para já informações completas sobre a dimensão e significado desta retirada militar no contexto mais alargado do conflito. Se ela representa ou não um fim para o conflito iminente na fronteira entre a Rússia e a Ucrânia, é ainda cedo para dizer, uma vez que há um conjunto de fatores a ter em conta.
Por um lado, aquilo que se sabe é que algumas das muitas unidades militares russas que estavam posicionadas junto da fronteira com a Ucrânia estão a ser retiradas para as suas bases permanentes, após terem terminado exercícios militares, enquanto outras unidades se mantêm em exercícios militares na região. O governo russo diz isto, mas não explica quantas unidades estão a regressar nem quantas ficam junto à fronteira. Este recuo pode ser um sinal de uma redução das tensões, mas não há qualquer certeza sobre o que acontecerá nas próximas horas.
A partir do comunicado do Ministério da Defesa é, ainda assim, possível retirar alguma informação sobre o que está em causa: as unidades militares que estão a recuar para as suas bases permanentes são aquelas que pertencem aos distritos militares Sul e Ocidental.
O jornal norte-americano The New York Times nota que estes são os militares russos que têm base permanente mais perto da fronteira com a Ucrânia — e que, por isso, poderão regressar às proximidades da fronteira com maior rapidez. As unidades que foram destacadas a partir de regiões mais longínquas, como a Sibéria, vão, para já, continuar destacadas em regiões próximas da fronteira.
Por outro lado, não é a primeira vez neste conflito que a Rússia recua. O acumular de tropas russas junto à fronteira com a Ucrânia acentuou-se no início de 2021, com uma série de manobras militares na região, mas Moscovo acabou por recuar em abril e maio desse ano. Uma cimeira entre Biden e Putin, em junho, contribuiu para acalmar a tensão. Mas, no final de 2021, a Rússia voltou a enviar tropas para a fronteira. Em dezembro de 2021, a Rússia voltou a retirar alguns milhares de soldados da fronteira, mas já em janeiro deste ano voltou a intensificar a presença militar.
Por seu turno, a Ucrânia diz que só acredita na retirada russa quando vir provas. “A Rússia está sempre a fazer todo o tipo de declarações, por isso temos uma regra: acreditaremos numa desescalada quando virmos a retirada das tropas“, disse esta manhã aos jornalistas o ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano, Dmytro Kuleba. “A situação permanece tensa, mas sob controlo.”
Apesar da incerteza que ainda paira sobre as notícias da eventual retirada russa, o que é certo é que as notícias já fizeram mexer nos mercados financeiros e no preço do petróleo, que na segunda-feira tinha subido a valores máximos dos últimos sete anos devido à possibilidade de um confronto militar a ter início na quarta-feira e que esta terça-feira já baixou em cerca de 2,5%. No mesmo sentido, a cotação do ouro (que costuma ser um ativo em que os investidores se refugiam nos momentos de maior tensão) também desceu.