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Soldado ucraniano patrulha uma mina de carvão destruída em Butovka, na linha da frente do confronto com os separatistas pró-Rússia

AFP via Getty Images

Soldado ucraniano patrulha uma mina de carvão destruída em Butovka, na linha da frente do confronto com os separatistas pró-Rússia

AFP via Getty Images

Porque é que Putin enviou militares para a fronteira com a Ucrânia? O Ocidente está preocupado

Putin enviou milhares de soldados para a fronteira, fazendo soar os alarmes no Ocidente. Intervenção militar iminente ou demonstração de força para dissuadir aproximação de Kiev à NATO?

Os últimos dias têm sido de enorme tensão entre Moscovo e Kiev, e, entre ameaças e acusações, com os países ocidentais ao barulho, levantam-se dúvidas quanto às reais intenções de Vladimir Putin ao enviar milhares de soldados e tanques militares para vários pontos da fronteira da Rússia com a Ucrânia: estará iminente uma intervenção militar no leste ucraniano ou estamos apenas perante uma demonstração de força do Kremlin?

A resposta não é consensual e tem levado a intensas discussões entre analistas, enquanto na Rússia, na Ucrânia e no Ocidente sobe o tom, aumentando a incerteza e imprevisibilidade — enquanto os líderes europeus, os Estados Unidos e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO, na sigla em inglês) manifestam apoio ao Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, e deixam avisos ao Kremlin, em Moscovo há a garantia de que as movimentações militares não constituem ameaça e que uma escalada do conflito apenas depende do Ocidente.

Ucrânia aumenta pressão para aderir à NATO e travar ambições regionais da Rússia

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Após a Rússia invadir e anexar a Crimeia em 2014, o leste ucraniano, onde ficam as regiões de Donetsk e Lugansk, tornou-se palco de um conflito entre as forças de segurança ucranianas e separatistas pró-russos que já causou mais de 13 mil mortos. Apesar de um acordo de paz assinado em 2015, com mediação da União Europeia (UE), os dois lados continuam a defrontar-se na fronteira dos territórios disputados e praticamente há seis anos que as conversações de paz estão congeladas.

“As movimentações militares russas pretendem uma demonstração de força clara, num contexto onde as relações com o Ocidente permanecem difíceis”
Maria Raquel Freire, professora da FEUC e investigadora do CES

Perante este contexto, a tensão começou a subir no final de março e no início de abril, com o aumento dos confrontos e do número de vítimas, sendo que pelo menos 23 soldados ucranianos já morreram este ano, cerca de metade do total que se registou em todo o ano de 2020. À troca de tiros na fronteira, acresce a movimentação de pelo menos quatro mil tropas russas, segundo o The New York Times, na semana passada, o que fez soar os alarmes quanto à possibilidade de uma ofensiva militar de Moscovo.

UE manifesta preocupação com movimento de tropas russas na fronteira com a Ucrânia

“A escalada com a mobilização [de tropas] está a criar sérias preocupações de que isto é mais do que uma demonstração de força. Há sinais de que a Rússia pode estar a preparar uma ação significativa”, afirmou ao Observador Nigel Gould-Davies, antigo embaixador do Reino Unido na Bielorrússia e analista do think tank britânico Instituto de Estudos Estratégicos Internacionais (IISS, na sigla em inglês), acrescentando que Moscovo “procura estender a sua influência militar” tanto na Ucrânia como na Bielorrússia.

Por outro lado, Maria Raquel Freire, professora da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC) e investigadora do Centro de Estudos Sociais (CES), considera que “as movimentações militares russas pretendem uma demonstração de força clara, num contexto onde as relações com o Ocidente permanecem difíceis”.

“Não podemos excluir uma nova escalada de violência, mas (…) não me parece que os ganhos deste conflito armado superassem as implicações negativas para a Rússia em termos políticos e económicos, e mesmo de segurança”, acrescenta ao Observador a especialista em Rússia e espaço pós-soviético, notando que “uma nova escalada de violência teria uma resposta ucraniana mais forte, e com apoios adicionais, em particular dos Estados Unidos”.

Tentativa de “provocar e intimidar” a Ucrânia

Nos últimos meses, o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, tem-se virado cada vez mais para os países ocidentais, e numa chamada telefónica na semana passada com o seu homólogo norte-americano, Joe Biden, ouviu a promessa de um apoio “inabalável” dos Estados Unidos à soberania da Ucrânia. Palavras semelhantes recebeu igualmente do secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, do chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, e do primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, que também têm manifestado preocupação com as manobras militares da Rússia junto à fronteira ucraniana.

Joe Biden promete apoio “inabalável” dos Estados Unidos à soberania da Ucrânia

Esta maior aproximação da Ucrânia ao Ocidente, com quem tem acordos de cooperação mas não propriamente de adesão, seja à NATO ou à UE, coincide com a cada vez mais distante relação entre Zelensky, um comediante transformado em político e desde 2019 Presidente ucraniano, e Vladimir Putin, que, quando o seu homólogo ucraniano foi eleito, esperava conseguir concessões que levassem ao reconhecimento da soberania russa na Crimeia, além da garantia da neutralidade de Kiev.

“Putin perdeu a oportunidade de fazer um acordo com Zelenksy, que é um moderado, e não o conseguiu porque a Rússia exigiu demasiado, querendo que Zelenksy agisse como se fosse [Alexander] Lukashenko”, sublinha ao Observador Taras Kuzio, politólogo britânico na Universidade Nacional de Kiev-Mohya, na Ucrânia, referindo-se ao Presidente bielorrusso, que desde o início da vaga de contestação ao seu regime tem cedido ao homólogo russo para se manter no poder.

Normandy Four summit in Paris

Relação entre Putin e Zelenksy estagnou nos últimos meses e levou a um impasse nas negociações de paz

Mikhail Metzel/TASS

Nesse sentido, para o analista especializado nas relações entre Rússia e Ucrânia, as recentes movimentações militares russas podem ser resultado da “fúria e frustração” de Putin em não conseguir concessões do Presidente ucraniano, ao mesmo tempo que o Chefe de Estado russo tenta “provocar e intimidar” a Ucrânia, enquanto aguarda por ações de Kiev que possam levar a uma “desculpa para intervir militarmente em ‘defesa dos seus cidadãos’”, à semelhança do que aconteceu com a Geórgia, em 2008, com a intervenção na Ossétia do Sul.

No entanto, Taras Kuzio nota que existem grandes diferenças entre a Ucrânia e a Geórgia, desde logo ao nível da dimensão dos países, o que pode pôr em causa a eficácia das ambições do Kremlin. “Seria preciso metade do exército russo para invadir a Ucrânia. Não acho que fosse tão simples quanto Putin pensa”, sublinha.

Receio da NATO e importância das zonas tampão

Além de possíveis ambições territoriais, o analista Nigel Gould-Davies sublinha que o “Kremlin nunca viu a Ucrânia como um Estado totalmente soberano”, pelo que a pressão com movimentações militares pode também ser encarada como uma forma de Moscovo condicionar Kiev.

“Para Putin e para os nacionalistas russos, os ucranianos e os bielorrussos são russos e por isso não têm direito a escolher que rumo geopolítico devem seguir”
Taras Kuzio, politólogo daUniversidade Nacional de Kiev-Mohya, na Ucrânia

“Embora provavelmente não queira absorver novos territórios significativos para a Rússia, como tentou fazer na Crimeia, [o Kremlin] quer enfraquecer a Ucrânia permanentemente para que não possa esta não possa tomar decisões genuinamente independentes”, frisa Gould-Davies.

No mesmo sentido, Taras Kuzio considera que “para Putin e para os nacionalistas russos, os ucranianos e os bielorrussos são russos e por isso não têm direito a escolher que rumo geopolítico devem seguir”, e é neste contexto que as aproximações, tanto de Kiev como de Minsk, seja à UE ou à NATO, chocam sempre com a oposição de Moscovo, que considera aqueles países como integrantes da zona de influência e que, por isso, o Ocidente deve abster-se de qualquer aproximação das chamadas zonas tampão.

EUA não reconhecem a anexação russa da Crimeia

Para o próximo verão, a NATO já anunciou a realização de exercícios militares conjunto com a Ucrânia, e apesar de a organização transatlântica não ter feito qualquer proposta para a entrada de Kiev, o Presidente ucraniano tem vindo a insistir na necessidade de o seu país aderir à NATO, a única forma que vê para pôr fim ao conflito no leste ucraniano. Movimentações acompanhadas com grande preocupação em Moscovo que quer manter a NATO longe do seu território.

Separatist rebels in Ukraineâs Donetsk and Luhansk regions

Rebeldes separatistas no leste da Ucrânia

Anadolu Agency via Getty Images

“A escalada de tensão e movimentação de forças de ambos os lados é entendida em Moscovo como parte da resposta ao que considera uma ameaça, ou seja, o reforço da presença da NATO próximo das suas fronteiras”, sublinha a docente da FEUC e investigadora do CES Maria Raquel Freire, salientando que a tal postura de Moscovo faz parte da “narrativa das ‘esferas de influência’ e as denominadas ‘zonas tampão'” e de uma “ofensiva defensiva”, isto é, “uma estratégia de manutenção de linhas de demarcação que permitem manter a NATO afastada das fronteiras russas”.

Receio de Biden ou “momento certo” para agir?

A escalada de tensão entre Rússia e Ucrânia surge também numa altura em que as relações entre o Kremlin e o Ocidente, particularmente a União Europeia e os Estados Unidos, atravessam uma fase muito conturbada, em parte devido ao envenenamento e condenação a pena de prisão do opositor russo Alexei Navalny.

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Mas se, com Bruxelas, o Kremlin parece ter conseguido marcar uma posição, sobretudo após a desastrosa visita do chefe da diplomacia europeia, Josep Borrell, a Moscovo no início de fevereiro, com os Estados Unidos a situação é diferente, e Joe Biden tem vindo a dar provas de que pretende endurecer a resposta à Rússia, tendo mesmo chamado assassino a Putin.

“Biden ainda não esteve tempo suficiente para sarar os danos que [o ex-Presidente Donald] Trump causou à Aliança Atlântica. A Rússia pode, portanto, sentir que este é o momento certo para agir”
Nigel Gould-Davis, analista do Instituto de Estudos Estratégicos Internacionais, com sede no Reino Unido

“Moscovo teme os Estados Unidos e a NATO, mas pensa que a UE é uma piada, não a leva a sério”, afirma o analista Taras Kuzio, acrescentando que, para Biden, o relacionamento com a Rússia é uma “questão pessoal”, devido aos ciberataques e campanhas de desinformação atribuídas ao Kremlin que, entre outros alvos, visaram Hunter Biden, filho do Presidente norte-americano. “Os russos sempre respeitaram a força e não a fraqueza. Penso que a Rússia não tem muitas opções e vai ser muito cautelosa devido a Biden”, antevê Kuzio.

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Por outro lado, Gould-Davies, que considera as movimentações militares russas como um “desafio para a unidade europeia e para a integridade territorial da Ucrânia”, admite que Moscovo pode tentar aproveitar para agir no início do mandato de Joe Biden.

“Biden ainda não esteve tempo suficiente para sarar os danos que [o ex-PresidenteDonald] Trump causou à Aliança Atlântica. A Rússia pode, portanto, sentir que este é o momento certo para agir”, alerta o analista do IISS.

Uma ofensiva militar russa  na Ucrânia teria, no entanto, consequências imprevisíveis, e em último caso poderia levar a uma guerra aberta entre Ocidente e Rússia. Cenário que Maria Raquel Freire considera pouco provável nesta fase.

“Vejo como muito difícil um avanço da NATO, seja na Ucrânia seja na Bielorrússia, que exigiria consenso entre os estados membros da Aliança Atlântica, e que no contexto atual significaria muito provavelmente uma guerra NATO-Rússia, que não me parece ser do interesse de nenhuma das partes”, conclui a professora e investigadora da Universidade de Coimbra.

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