O presidente da Assembleia da República considerou, esta quinta-feira, que os serviços de informações são essenciais à democracia, exigindo-se que fiquem fora da normal conflitualidade política ou institucional e que seja preservada a confidencialidade das suas investigações.

Estes avisos foram transmitidos por Augusto Santos Silva na cerimónia de posse dos três membros do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (CFSIRP), Constança Urbano de Sousa, Mário Belo Morgado e Joaquim Ponte, em que estiveram presentes dirigentes das “secretas” portuguesas.

Tendo a ouvi-lo os líderes parlamentares do PS, PSD e Chega, o presidente da Assembleia da República deixou vários recados ao longo do seu discurso e defendeu a tese de que os serviços de informações são “indispensáveis” à democracia.

Santos Silva advogou que a atividade das “secretas” nacionais se “restringe à recolha, tratamento, verificação, organização e transmissão de informações em conformidade com os princípios da necessidade, proporcionalidade e adequação, assegurando que as autoridades competentes dispõem em tempo útil de dados credíveis sobre matérias essenciais para a segurança e interesses nacionais”.

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Sem esse instrumento seria mais débil a capacidade de proteção dos cidadãos, a sociedade e o Estado de Direito democrático contra ameaças graves como o terrorismo, ciberameaças ou outras formas de subversão. Quanto mais assistimos à proliferação destas ameaças, mais importante é dispormos de um sistema de informações robusto, moderno e eficaz”, sustentou.

Neste contexto, Augusto Santos Silva destacou duas condições que definiu como essenciais para o desempenho dos serviços de informação:

A primeira é a “preservação da discrição, reserva, confidencialidade e até secretismo no sentido de que as informações recolhidas apenas circulem entre as entidades legítimas e estritamente indispensáveis“; em segundo lugar, os serviços de informações devem ser considerados “recurso precioso para a defesa coletiva contra ameaças graves e devem ser mantidos à margem do que é a normal conflitualidade política ou institucional”, advertiu.

Mas presidente da Assembleia da República foi ainda mais longe nos seus recados, embora sem nunca fazer alusão direta à controvérsia em torno da ação das “secretas” na investigação sobre o acolhimento de refugiados em Portugal.

“É imperativo que todos respeitemos a lei, e as restrições de reserva, confidencialidade ou segredo que ela estabelece, e que continuemos a seguir a boa prática da nossa democracia, ao longo da qual governos e oposições têm sabido partilhar informação crítica sobre questões de segurança nacional, sem que uns façam aos outros perguntas a que sabem que os outros estão impedidos por lei de responder e sem que os outros guardem para si dados e alertas de interesse estratégico nacional e imediato”, disse.

Ou seja, de acordo com o ex-ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, a Assembleia da República pode certamente requerer a presença do Conselho de Fiscalização do SIRP, em sede de comissão parlamentar, com o objetivo de obter esclarecimentos sobre o exercício da sua ação.

“Mas o Conselho não é, nem pode ser uma fonte de informação, por mais reservada ou oblíqua, sobre informações dos serviços de informações [e a repetição de palavras é deliberada]. O Conselho é, isso sim, uma instância de acompanhamento e fiscalização dos serviços, garantindo-nos, com a transparência possível, que eles funcionam de forma apropriada e proporcional às ameaças enfrentadas”, vincou.

Antes de terminar, Augusto Santos Silva admitiu que as suas posições podem “desiludir quem tem uma visão distorcida do papel das informações em democracia” e ande “permanentemente em busca de novidades ou entenda que nada deve impedir uma boa refrega circunstancial”.

“É preciso tratar estas questões, delicadas e centrais, com sentido de Estado, isto é, com responsabilidade, com maturidade e com o distanciamento indispensável face aos pequenos interesses e à espuma dos dias”, acentuou.

Em relação ao papel do CFSIRP, o presidente da Assembleia da República referiu que é um órgão “absolutamente essencial para assegurar que o sistema de informações cumpre a Constituição e a lei e, designadamente, respeita escrupulosamente o regime de direitos, liberdades e garantias”.

“Por isso age com total independência. Por isso, embora dela independente, funciona junto da Assembleia da República, de que recebe a legitimidade reforçada pela maioria qualificada indispensável à sua eleição. Por isso lhe cabe o acompanhamento atento e construtivo do SIRP, através da fiscalização da atividade da Secretária-Geral, do SIS, do SIED e ainda da componente de informações das Forças Armadas. Por isso se pode dirigir, sempre que entenda necessário, ao Governo e por isso informa regularmente o parlamento sobre o funcionamento do sistema”, acrescentou.

Em 29 de abril, a lista conjunta apresentada por PS e PSD para o Conselho de Fiscalização do SIRP obteve entre os deputados 159 votos a favor, 55 brancos e doze nulos, ultrapassando os dois terços de aprovações necessárias.

Nos termos da Lei-Quadro do SIRP, o respetivo Conselho de Fiscalização “é composto por três cidadãos de reconhecida idoneidade e no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos, cujo perfil dê garantias de respeitar, durante o exercício de funções e após a cessação destas, os deveres decorrentes do cargo, nomeadamente os de independência, imparcialidade e discrição, eleitos pela Assembleia da República por voto secreto e maioria de dois terços dos deputados presentes, não inferior à maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções”.