Além da contestação ao número considerado excessivo de testemunhas aceites pelo juiz Ivo Rosa, o Ministério Público e o BES estão lutar em dois planos diferentes para acelerar a fase de instrução do caso Universo Espírito Santo.
Enquanto o assistente entregou um requerimento de aceleração processual junto do Conselho Superior da Magistratura (CSM), já os procuradores Olga Barata e César Caniço recorreram para a Relação de Lisboa da decisão de Ivo Rosa de não classificar os autos como urgentes — o que faria, entre outras questões, que corressem durante o período de férias judiciais.
MP e assistente BES contestam utilidade de testemunho de Passos Coelho e Carlos Costa
BES quer Conselho Superior da Magistratura dê mais meios a Ivo Rosa
Fonte oficial do CSM órgão de gestão da magistratura judicial, confirmou que o requerimento do BES já deu entrada e uma decisão do plenário já foi calendarizada para o próximo dia 1 de junho.
O assistente “BES, SA – Em Liquidação” defende no requerimento que é “imprevisível” a data “em que se irá realizar o debate instrutório e, sequer, se o mesmo terá lugar ainda este ano” e alerta que há mesmo um “sério risco” de prescrição do procedimento criminal de parte dos ilícitos imputados a Ricardo Salgado e a outros arguidos.
O próprio juiz Ivo Rosa já veio reconhecer, lê-se no texto do BES, que “tendo em conta a data da alegação consumação dos crimes de falsificação de documento e infidelidade” a “prescrição do procedimento criminal quanto aos aludidos crimes” e face a vários arguidos “terá lugar entre 7 de agosto de 2024 e 28 de março de 2025.”
Por outro lado, os advogados Paulo Sá e Cunha e Miguel Pereira Coutinho contestam que o juiz Ivo Rosa tente transformar a fase de instrução criminal “numa suposta variante” de antecipação “da fase de julgamento”, o que faz com os lesados arrisquem não conseguir “obter em tempo útil qualquer decisão judicial de fundo”.
Assim, e invocando a posição anterior tomada por Ivo Rosa de que era mais relevante a “afetação de meios” ao tribunal do que o carácter de urgência, os advogados Paulo Sá e Cunha e Miguel Pereira Coutinho solicitam ainda ao Conselho Superior da Magistratura que:
- “O acesso ao Sistema Integrado de Informação Processual e o fornecimento de discos externos para a gravação digital de todo o processo”;
- A alocação de mais funcionários judiciais ao juízo titulado por Ivo Rosa (o Juiz 2) “em número considerado suficiente” para assistir pelo juiz de instrução.
- “A disponibilização de assessores técnicos em número considerado suficientes” que possam ajudar o juiz Ivo Rosa no que se mostrar necessário, nomeadamente em temas que requerem conhecimento técnico, como a contabilidade e as questões financeiras.
Ivo Rosa diz que decisão compete aos tribunais — e não ao órgão de gestão dos juízes
Após admitir o requerimento do BES, o juiz Ivo Rosa classificou o mesmo como “manifestamente infundado na medida em que o processo não se mostra atrasado, não está parado e os objetivos pretendidos não se inserem no âmbito da aceleração processual.”
No seu despacho, o juiz de instrução diz ainda que a declaração de urgência “é um ato da competência dos tribunais, aliás, já objeto de decisão nestes autos, e as medidas sugeridas pelo Assistente prendem-se com a alocação de mais meios ao tribunal”. Isto é, Ivo Rosa dá a entender que esta é uma matéria jurisdicional, logo o órgão de gestão dos juízes não terá competência para decidir sobre o mesmo.
Seja como for, Ivo Rosa recusou aceder a classificar os autos como urgentes porque “nunca poderão ser colocados em crise outros valores igualmente fundamentais de um Estado de Direito”, como por exemplo as “garantias de defesa”, entre outros valores. Assim, o juiz não viu “qualquer vantagem” em que as diligências decorressem em férias judiciais.
MP insiste em recurso para a Relação de Lisboa: “O perigo de prescrição é real”
Já o MP, optou por outra estratégia e decidiu avançar com um recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa para tentar anular o despacho no qual Ivo Rosa recusa a declaração de urgência.
Os argumentos são muito semelhantes aos do assistente BES, Em Liquidação. “O perigo de prescrição é real e é claramente uma das razões processuais para atribuir natureza urgente aos autos”, lê-se no texto do recurso.
Acresce que os procuradores Olga Barata e César Caniço contestam ainda o facto de Ivo Rosa estar a decidir ao mesmo os autos do caso BES e do caso Octapharma. Isto porque “além da proximidade do prazo prescricional”, os autos do caso Universo Espírito Santo “têm ofendidos a quem foi atribuído o estatuto de vítima”, o que faz com que tenha “necessariamente procedência” sobre os outros dois processos que estão a atribuídos ao juiz: o caso Octapharma e a Operação Marquês.