O ano de 2020 foi um ano com excesso de mortalidade em Portugal, mas a pandemia de Covid-19 não explica tudo. É essa a principal conclusão do relatório “Mortalidade Geral e por Grandes Grupos de Causas” da Direção-Geral da Saúde (DGS), a que o jornal Público teve acesso, e que dá conta de que houve seis períodos de excesso de mortalidade no país ao longo desse ano, mas que apenas dois se devem aos efeitos da Covid.
De acordo com os dados do relatório, em 2020 houve mais 14% de óbitos face à média dos seis anos anteriores, mas a Covid-19 foi apenas a quarta causa de morte mais frequente (5,9% de todos as mortes).
A DGS calcula apenas o pico que coincide com o início da pandemia e o último do ano — altura de maior atividade epidémica em 2020 — como únicos cujo excesso de mortalidade se deve à Covid-19. Os restantes são justificados pelo frio e atividade gripal (logo no início do ano), por uma onda de calor e outro por um período de temperaturas altas. Não foram encontradas explicações que justifiquem o quinto período de maior excesso de mortalidade.
O relatório da DGS aponta que em 2020 houve mais óbitos por doenças do aparelho circulatório, como acidentes vasculares cerebrais — mais 1.618 do que o esperado — e mais 45% de mortes por doenças hipertensivas, não dando explicações para este aumento.
Acesso limitado à saúde explica mortalidade, diz Bastonário. Mas DGS tem de dar “informação credível”
O bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, crê que há uma explicação óbvia para estes dados: “Deve-se ao facto de [em 2020] ter havido milhões de consultas e de exames complementares de diagnóstico por fazer”, afirma ao Observador, acrescentando que a pandemia criou “um excesso de dificuldade de acesso aos cuidados de saúde” e que 2020 foi um “ano negro” para a saúde.
Uma hipótese que não é apresentada pela DGS no relatório, de acordo com a notícia do Público. A avaliação não tem inclusivamente justificação para o facto de no verão de 2020 se ter registado um excesso de mortalidade por doenças não associadas ao calor, como doenças endócrinas, nutricionais e metabólicas, do aparelho urinário e neoplasias. Facto que merece críticas por parte do bastonário dos médicos, que afirma que “a DGS tem de se habituar a dar informação credível”.
[Quando a DGS identifica] os chamados seis períodos de excesso de mortalidade, tem de saber em que é que se baseou essa mortalidade”, acusa Miguel Guimarães.