O líder socialista esteve esta tarde reunido com a bancada parlamentar da maioria mas nem foi questionado nem falou dos temas quentes da última semana. O foco desta visita foi apenas e só a Agenda do Trabalho Digno, a proposta do Governo sobre alterações às leis laborais que é esta sexta-feira debatida no Parlamento. Foi o silêncio completo na bancada da maioria sobre o caso de Pedro Nuno Santos ou até o novo líder do PSD, que atirou o referendo à regionalização que o PS promete no seu programa eleitoral para o fundo de uma gaveta.

António Costa entrou mudo na reunião e saiu pela porta mais afastada dos jornalistas que tinham acabado de ouvir a ministra do Trabalho e o líder parlamentar do PS falarem do tema que o primeiro-ministro quer fixar na agenda nesta altura mais turbulenta para o Executivo. Na reunião com os deputados do PS, Costa “fez um enquadramento simbólico em como isto representa o fim dos dossiers que ficaram perdidos com a crise política da última legislatura.” O debate para esta sexta-feira já estava marcado e acabou por ser ouro sobre azul para Costa desviar atenções para uma questão que vai centrar os trabalhos (e discussões) parlamentares nos próximos tempos.

Foi uma reunião curta (durou menos de uma hora) e “incisiva”, descreve um deputado socialista que esteve esta tarde com Costa no encontro na Sala do Senado da Assembleia da República. Outro explica que Costa já trazia a intenção de não se referir ao elefante na sala, ou seja, ao despacho que obrigou Pedro Nuno Santos a revogar menos de 24 horas depois de o ter feito publicar em Diário da República. Cumpriu e ainda saiu sem dar hipótese de ser questionado sobre esse tema e outros, como o novo líder do PSD ou mesmo a moção de censura do Chega (que é debatida amanhã). Aliás, quem foi questionado sobre este último ponto foi o líder parlamentar Eurico Brilhante Dias que — lá está — chutou para canto dizendo que este é o momento da Agenda do Trabalho Digno.

Lá dentro, Costa não falou nem foi questionado por nenhum deputado do PS sobre o episódio que, na semana passada, envolveu Pedro Nuno Santos e caiu que nem uma bomba entre socialistas, segundo apurou o Observador junto de vários participantes na reunião. A estratégia foi tentar passar para o tema político seguinte onde os socialistas garantem existir abertura para acolher alterações propostas pela oposição, no debate na especialidade. Eurico Brilhante Dias disse mesmo que a bancada tem abertura “para os contributos que melhorem a proposta do Governo no debate da especialidade”.

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A proposta do Governo avança fora da concertação, onde Costa perdeu o apoio dos parceiros quando apareceu com a Agenda para o Trabalho Digno desenhada — e incluindo medidas como o pagamento de horas extraordinárias  e o aumento da compensação por cessação de contratos para 24 dias — para tentar convencer a esquerda a não chumbar o Orçamento do Estado para 2022.

Não resultou, o OE chumbou, o Governo caiu e, na sequência desse episódio, a Agenda acabou empurrada para a legislatura seguinte, aparecendo já sem a questão das horas extraordinárias, quando os trabalhadores façam mais de 120 horas anuais complementares, que entretanto a ministra Ana Mendes Godinho atirou para a discussão do acordo de rendimentos e competitividade que tenciona fechar até ao outono.

António Costa apresentou a proposta que já era conhecida e onde o Governo introduziu apenas pequenas alterações, depois da discussão pública, na proteção dos trabalhadores das plataformas digitais, para se aproximar da diretiva europeia que visa melhorar as condições de trabalho e os direitos sociais destes trabalhadores. A ideia inicial do Executivo era vincular os trabalhadores às próprias plataformas, mas recuou nessa intenção.

O maior foco da reforma, nas intervenções tanto de Costa como da sua ministra, foram precisamente na necessidade de proteger os contratos de trabalho mais precários, nomeadamente sobre a capacidade de intervir sobre falsos contratos a termo. E também sobre as medidas para a conciliação da vida pessoal e profissional.