Em muito poucas horas o caso de racismo em Portugal, que envolveu os filhos de dois atores brasileiros, suscitou reações políticas até do lado de lá do Atlântico – o candidato à presidência, Lula da Silva foi um deles. O Presidente da República tenta agora aplacar eventuais ânimos, garantindo que em Portugal “não há qualquer alergia à comunidade brasileira”.

Já o tinha dito através de um comunicado que fez publicar esta tarde no site da Presidência. Não fez referência direta ao caso, mas o comunicado encaixava na situação que já levou os pais das crianças a fazerem queixa às autoridades. Horas depois, Marcelo foi confrontado por jornalistas à margem da visita ao Acampamento Nacional de Escuteiros, em Idanha-a-Nova, e foi confrontado com o incidente concreto que trata como um caso isolado. Chega mesmo a dizer que no Brasil se “criou um casinho” com este episódio, mas que “não é possível haver a ideia que em Portugal há alergia a brasileiros. A prova é que todos os dias chegam brasileiros a Portugal a um ritmo que inverteu a imigração que agora é do Brasil para Portugal”, afirmou.

Ator Bruno Gagliasso apresenta queixa sobre caso de racismo contra os filhos. Marcelo lembra que “todos somos Portugal”

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Reconhece que o caso “não foi empolado” e que estes episódios “devem ser exemplarmente considerados e, se for caso disso, punidos”, mas tenta travar ondas de choque que os ultrapassem, garantindo que em Portugal “há um consenso generalizado contra racismo e a xenofobia, o que não quer dizer que não haja sectores racistas e xenófobos, quer dizer que a maioria esmagadora dos portugueses não é”.

Nas mesmas declarações, o Presidente reconhece que “há sempre setores que manifestam ainda tiques ou toques racistas e xenófobos”, mas diz logo de seguida que estes “não se podem generalizar”. “É injusto generalizar que o comum dos portugueses é racista ou xenófobo ou tem alergia à comunidade brasileira”, reforçou. Rematou as suas declarações a dizer que “todo o ser humano veio de África” e que “não há sangue puro”.

O episódio e as declarações presidenciais surgem num contexto específico em Portugal, depois de um debate parlamentar especialmente tenso, no final da sessão legislativa, sobre alterações à Lei da Imigração. Nesse debate, o Presidente da Assembleia da República falou depois de uma intervenção do líder do Chega, André Ventura, para defender os imigrantes que trabalham e vivem em Portugal. Na sequência das palavras de Santos Silva — que foram aplaudidas por todas as bancadas parlamentares — os deputados do Chega abandonaram o hemiciclo.

Durante reprimenda, deputados do Chega abandonam hemiciclo e deixam Santos Silva a falar sozinho

Depois desse momento, André Ventura pediu uma audiência ao Presidente da República, saiu com uma certeza sua, mas sem respaldo público de Marcelo Rebelo de Sousa que recusou falar do que se passa na Assembleia da República. Três dias depois, à boleia do caso de racismo na Costa da Caparica, Marcelo acabou por fazer um comunicado genérico onde se aproxima da ideia de Augusto Santos Silva ao escrever que “a sociedade portuguesa é constituída por pessoas das mais variadas origens, que aqui chegaram há poucos ou há muitos anos, alguns há séculos, aqui vivem, trabalham, constituem as suas famílias: não há ‘portugueses puros’, somos todos descendentes de culturas, civilizações e origens muito diversas”. E repetiu a mesma posição em Idanha-a-Nova.