A parte mais chata primeiro: na linguagem económica, um negócio é uma atividade gerida por uma ou mais pessoas que capta recursos financeiros com o fim último de criar bens e serviços que geram lucro e potenciam a circulação de capital – o mesmo “blá blá blá” de sempre. Temos convivido lado a lado com este modelo de negócio desde o início dos tempos: desde trocas comerciais entre tribos, comunidades, Estados; à criação de negócios, projetos e empresas altamente rentáveis que até hoje continuam a dar mais importância ao lucro, aos resultados, do que à responsabilidade social.
Ora, nos últimos dez, quinze, vinte anos, a criação de negócios que são pensados a partir da premissa que é imprescindível ter um impacto positivo na sociedade, na economia, no meio ambiente tem aumentado exponencialmente: os consumidores estão mais atentos, são mais exigentes, e o meio empresarial acompanha essa tendência.
O potencial de crescimento em negócios verdes – como são chamados os negócios que privilegiam a sustentabilidade -, já não é algo que se questione: aliás, não só estes projetos conseguem posicionar-se muito bem no mercado, em relação à concorrência ‘menos verde’, como conseguem fidelizar clientes através dos valores irreverentes e diferenciados que utilizam como bandeira.
A nível global já acontece, mas e em Portugal, que negócios estão a dar cartas nesta área e a tornar o mundo um sítio mais verde, habitável, ético, amigo dos produtores locais? Vamos descobri-los:
A fruta feia também é boa
Vamos a números: estima-se que metade da comida produzida em todos os países do mundo, todos os anos, vá parar ao lixo. Julga-se que os países industrializados desperdicem anualmente comida suficiente para alimentar perto de 925 milhões de pessoas que todos os dias não têm o que comer.
E por isso, em Portugal gente bonita come fruta feia: um projeto português que, para fazer face aos modelos de produção alimentar intensa, aos prazos de validade reduzidos, à aquisição de bens alimentares em excesso, decidiu colocar o país a comer fruta feia, que nada tem que ver com questões de segurança nem qualidade alimentar. Para dar a volta a uma ineficiência do mercado, a cooperativa Fruta Feia colabora com produtores de várias regiões e recolhe os produtos menos bonitos que não conseguem vender: os olhos comem – verdade -, mas a saúde não se queixa do que é nutritivo.
Re-Food: resgatar comida para acabar com o desperdício alimentar
Existe aquilo que se chama um gap, um vazio, entre o excesso e a necessidade. É através da envolvência da comunidade local, este movimento procura resgatar comida que não é escoada, seja em restaurantes, supermercados, com o objetivo de entregá-la a quem mais precisa. Estes “Robin dos Bosques” recorrem a um modelo de voluntariado para manter a sua operação logística a decorrer nos dez núcleos onde atuam. A missão é de todos e daí o sucesso deste modelo: no site do projeto lê-se que a REFOOD ambiciona “um mundo novo onde todos têm a comida de que necessitam”. Estamos cada vez mais perto: foi no dia 9 de março de 2011 que o americano Hunter Halder começou a recolher os primeiros alimentos junto de pequenos estabelecimentos comerciais. Já lá vão dez anos de operações. Neste período de combate ao desperdício alimentar, várias organizações têm procurado assumir um papel ativo em questões de responsabilidade social: exemplo disso, é a empresa Credibom, que no final do seu evento interno em vez de colocar no lixo o excedente alimentar, entregou os produtos alimentares à rede ReFood. Também as marcas têm um papel importantíssimo na forma como aplicam os seus valores no seu modelo de negócio: o impacto positivo de um negócio verde e sustentável também é isto – o propósito e contributo das empresas em prol da sociedade atual.
Vintage for a Cause: roupa da avó? Sim, mas muito cool
Edições limitadas, economia circular e impacto social positivo: são estas as três características que podem definir a marca de roupa portuguesa que construiu o seu modelo de negócio com especial foco na ética social e sustentabilidade. Imagine um clube de costura super cool que ao transformar roupa e personalizá-la ao gosto dos seus clientes, acaba por transformar a vida de mulheres com mais de 50 anos e em situação de vulnerabilidade. A roupa é usada, vintage – parece saída do armário das nossas avós -, e grande parte das vezes doada por outras pessoas que já não vêem grande utilidade nestes itens. Este é um projeto-sonho idealizada por Helena Antónia Silva e não só faz a diferença nos nossos armários, como na vida das mulheres que ajuda a integrar numa sociedade mais amiga, mais inclusiva. Para quê comprar mais se podemos comprar devagar e melhor?
Tal como a Vintage for a Cause, a Re-Food e a Fruta Feia, são variadíssimos os projetos que assumem a sua vertente sustentável e mais amiga dos fornecedores, dos consumidores, do planeta – falamos, por exemplo, da Cooperativa Rizoma, que tem a sua casa em Lisboa e está a alterar a forma como consumimos e comercializamos alimentos de qualidade; ou a Nãm Mushroom, a primeira quinta urbana de Lisboa que produz cogumelos no meio da capital.
O mundo está a mudar, as preferências e exigências dos consumidores também: queremos o melhor para nós, mas nunca em detrimento do outro, do mundo. Na dúvida, escolha o mais verde possível: o que consome, o que adquire, como o compra. Todos juntos conseguimos fazer a diferença: basta alguém dar o primeiro passo.
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