(Em atualização)
Os humoristas, apresentadores e outras personalidades, portuguesas e brasileiras, com quem Jô Soares contactou destacam-lhe a perspicácia e inteligência do humor, a “rapidez de raciocínio“, a “bagagem intelectual” e, nas palavras de Marcelo Rebelo de Sousa, a capacidade de fazer rir e pensar “durante anos”.
A morte do humorista e escritor brasileiro, aos 84 anos, foi confirmada esta sexta-feira pela ex-mulher, numa mensagem deixada no Instagram. Na reação, o Presidente da República português lembrou, no site da Presidência, como os sketches de Jô Soares ficaram “famosos” e “algumas expressões entraram mesmo na linguagem corrente“. O humorista “fez-nos rir e pensar durante anos, um grande obrigado a Jô Soares, que hoje saiu de cena, mas não dos nossos corações, nem das nossas memórias”, completa Marcelo Rebelo de Sousa, que endereça à família e aos amigos as condolências.
Morreu o humorista e apresentador brasileiro Jô Soares. Tinha 84 anos
Ao longo dos vários anos do Programa do Jô, na Globo, foram várias as personalidades portuguesas a pisar o palco e a conversar com o apresentador. Um deles foi o humorista César Mourão, que esteve no programa em 2013. À Rádio Observador, Mourão destacou o “humor perspicaz e inteligente” e conta que cresceu a ouvir Jô Soares. Primeiro com o “Viva o Gordo”, nos anos 80, depois no “Programa do Jô”, que via religiosamente quando viveu no Brasil, diz.
César Mourão salienta ainda que Jô Soares tinha uma “intuição” natural no contacto com os convidados. “Tinha essa capacidade incrível de, do nada, fazer bastante”. Essa interação era “genial”, com “uma rapidez fantástica”.
Foi quando esteve no “Programa do Jô”, como convidado, que percebeu a “rapidez de raciocínio“, além da “bagagem intelectual incrível“. O humorista português descreve como Jô recusava ter contacto com os convidados antes de os entrevistar: “Foi explicado que era assim, que o Jô queria esse impacto inicial. Cumprimentei-o pela primeira vez quando ele me chama ao palco”.
[Oiça aqui o relato de César Mourão sobre o encontro com Jô Soares]
Desligadas as câmaras, a produção chamou César Mourão a pedido do apresentador brasileiro. “Queria falar comigo, foi muito simpático, mostrou que se preparou, tinha visto várias coisas minhas no Youtube”, revela. Mourão indicou ainda que Soares se inspirou várias vezes em Portugal, não só para as suas personagens, mas também para os romances que escreveu. Era, aliás, “um brilhante escritor“, caraterizou.
Júlio Isidro: “Uma certa forma de humor desapareceu hoje”
Júlio Isidro não foi ao programa de Jô Soares — tem, até, uma “pequenina pena” de nunca ter sido convidado — mas teve a oportunidade de o entrevistar duas vezes. A primeira foi em 1982, no “Passeio dos Alegres”, apresentado por Júlio Isidro, numa altura em que o programa humorístico de Soares, o “Planeta dos Homens”, era “enorme” em Portugal.
Em declarações à SIC Notícias, Júlio Isidro elogiou o humor “a sério”, “muito bem alicerçado” na forma “como desenhava as suas personagens” — estima que tenham sido mais de 100. Soares procurava criticar “sem nunca se referir a ninguém”. “Era capaz de criar e desenvolver essas personagens e nós adivinhávamos o que estava por detrás”, observa.
A segunda entrevista foi no ano seguinte, na primeira visita de Júlio Isidro ao Brasil para ir ver “Viva o Gordo, Abaixo o Regime”, um espetáculo de teatro em que Soares foi “muito eficaz”. “No final, fui ter com ele aos bastidores e lá o entrevistei outra vez. Ele gostava muito de Portugal” e gostava particularmente de Nicolau Breyner e Raul Solnado. Com Nicolau Breyner deixou mesmo “rábulas geniais”, um dos quais sobre as dificuldades de compreensão entre português de Portugal e português do Brasil.
“Acho que uma certa forma de humor desapareceu hoje”, disse Júlio Isidro. À Rádio Observador, o apresentador viria a acrescentar que se perdeu um “grande vulto da cultura”, com um “humor sempre marcado por grandes referências de caráter cultural” e que “apanhava tudo o que tinha a ver com a sociedade brasileira”.
Também à Rádio Observador, o humorista brasileiro Gregório Duvivier lembra como Soares “abria espaço para quem estava a começar”. E recorda uma piada “muito ruim” que ele próprio fez quando foi entrevistado pelo apresentador. Duvivier tinha “piadas pensadas”, “inadequadas”. “Disse que era meio autista porque sou distraído, mas na verdade ele tem um filho com autismo, foi horrível para mim não para ele, que não falou nada, foi muito elegante.”
O Brasil está “triste” pela perda, mas ao mesmo tempo “todo o mundo está lembrando” Jô Soares, observa.
[A “piada ruim” que Gregório Duvivier contou na primeira entrevista com Jô Soares]
O humorista Eduardo Madeira, que imitou Soares no programa “Anti-Crise”, da RTP, também relata, em declarações à Rádio Observador, a primeira memória de infância com o humorista brasileiro, no “Planeta dos Homens”, e lembra que já era um programa “muito à frente daquilo que se fazia em Portugal”. É por isso que acredita que Soares abriu mentalidades.
“A minha imitação do Jô Soares foi a melhor homenagem possível a ele”, frisa. Madeira recorda que Soares chegou a dizer que, quando morresse, queria que na sua campa ficasse gravado: “Enfim, magro“. Antes, à CNN Portugal, o humorista português tinha salientado a “capacidade de brincar com o mundo e ele próprio”. Nos últimos anos, a versão pública era de um Jô Soares “mais maduro”, que “envelheceu bem”, considera.
[Oiça aqui a reação de Eduardo Madeira à morte de Jô Soares]
A cantora e atriz Zélia Duncan também já reagiu à morte de José Eugénio Soares, que nasceu a 16 de janeiro de 1938 no Rio de Janeiro: “O Brasil perdeu hoje um artista único, um comediante que amava seu ofício acima de tudo, um ator fora de série. Um entrevistador brilhante. Um cidadão que amava seu país e seus amigos. Jô Soares, obrigada por tanto”.
O Brasil perdeu hoje um artista único, um comediante que amava seu ofício acima de tudo, um ator fora de série. Um entrevistador brilhante. Um cidadão que amava seu país e seus amigos. Jô Soares, obrigada por tanto!????????
— Zélia Duncan ????️???? (@zeliaduncan) August 5, 2022
A apresentadora Adriane Galisteu também celebrou “tantas risadas, tantas conversas e todos os ensinamentos”. “Meu Deus, o mundo sem você…. Meu amado amigo , diretor, conselheiro, vizinho, que tristeza… você sempre foi cercado de amor e sempre será assim! Vou seguir te aplaudindo e através de suas obras aprendendo com você”, escreveu, nas redes sociais.