O FBI desclassificou um relatório de 270 páginas com informações sobre a cantora Aretha Franklin. O ficheiro detalha a vigilância que o serviço de segurança americano exerceu sobre Franklin por forma a controlar as suas atividades políticas e ativistas. Revela ainda a existência de várias ameaças de morte credíveis feitas contra a cantora.

Franklin, apelidada de “Rainha do Soul”, morreu em 2018 com 76 anos, e foi uma figura ativa no movimento dos Direitos Civis nos Estados Unidos, sobretudo nas décadas de 1960 e 1970. No documento é detalhada a sua relação com líderes políticos e da comunidade afro-americana, como Martin Luther King e Angela Davis, além de supostas ligações que manteria com grupos como o Partido Comunista americano e os Panteras Negras.

A existência deste relatório foi revelada no Twitter pela jornalista Jenn Dize, que o requisitou ao abrigo do Freedom of Information Act (Lei de Liberdade de Informação), que obriga (com algumas exceções) as agências de informação a disponibilizar, total ou parcialmente, documentos oficiais.

https://twitter.com/jennelizabethj/status/1567631841229946880

Incluído no ficheiro está documentação sobre atuações da cantora, em 1967 e 1968, na Conferência da Liderança Cristã do Sul (SCLC), igreja presidida por Martin Luther King, que o FBI descreveu como eventos de “infiltração comunista”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A igreja era extremamente crítica da política de segregação racial que se vivia nos Estados Unidos, bem como da guerra americana no Vietname, que classificava como “genocídio”. No relatório da agência pode ler-se que “a liderança da SCLC tomou uma posição pró-comunista e de ódio à América, cujos seus fiéis negros não se apercebem mas que seguem cegamente”.

Franklin, assim como outros artistas afro-americanos populares da época, eram frequentemente associados a estas posições, consideradas subversivas pelo departamento de segurança dos EUA.

O relatório inclui considerações acerca de um concerto de homenagem a Martin Luther King, após o seu assassinato em 1968, no qual Aretha Franklin iria participar. O evento, que seria realizado em Atlanta, foi considerado uma “situação racial” pelo FBI, com potencial para “acender um rastilho emocional capaz de causar distúrbios raciais na área”. Acabou por ser cancelado, tendo a SCLC optado antes pela realização de uma procissão no Moorhead College, em Atlanta.

Um outro reporte diz respeito a uma atuação da cantora, em 1972, numa angariação de fundos para a libertação da académica e ativista Angela Davis, na altura acusada de rapto e homicídio (acabaria absolvida nesse ano). A organização responsável pelo evento teria, de acordo com o FBI, sido “fundada pelo Partido Comunista dos Estados Unidos da América”.

O FBI considerou ainda a cantora como suspeita de manter ligações com organizações como os Panteras Negras (na qual o irmão da cantora, Cecil Franklin, militava), o Exército para a Libertação Negra e a Liga para a Emancipação de Jovens Trabalhadores. Em todos os casos, as investigações da agência de segurança nunca encontraram ligações diretas entre Franklin e estas organizações.

Cantora recebeu ameaças de morte

Além de informações de vigilância, o documento revela ainda que Aretha Franklin sofreu várias ameaças de morte, consideradas credíveis pelo FBI. Numa ocasião, um recluso da prisão de Cook County, em Chicago, terá feito passar-se por um agente federal e tentado extorquir a cantora no valor de 1 milhão de dólares, sob pena de sofrer represálias.

Num outro caso, um homem que dizia ter casado com Franklin na década de 1950, contactou a cantora várias vezes por carta e telefone, ameaçando-a e à sua família de morte.

Ao longo da sua existência, o FBI tem vindo a vigiar várias celebridades e artistas que considera representarem riscos de segurança interna. O caso de Aretha Franklin é o mais recente a ser conhecido, numa lista que inclui nomes como a atriz Marilyn Monroe, o cantor John Lennon e a sua mulher, a artista plástica Yoko Ono e o rapper The Notorious B.I.G.

Recentemente, Micky Dolenz, baterista da banda Monkees, da década de 1960, processou a agência, exigindo acesso a quaisquer dossiês secretos que esta tenha sobre o músico. Os Monkees foram investigados em 1967, por se manifestarem contra a guerra no Vietname.