Primeiro, uma inevitabilidade. Era impossível olhar para a receção do Bayern ao Barcelona em Munique sem ter todos os olhos concentrados em Robert Lewandowski, o avançado polaco que ganhou tudo o que havia para ganhar e que aos 34 anos trocou aquela zona de conforto que só não foi capaz de lhe dar uma Bola de Ouro pelo quase desconhecido de outro grande do futebol europeu a querer passar também em campo de um clube em risco de bancarrota para um novo rico à custa da venda de ativos próprios. Um jogo de 11 contra 11 estava quase resumido ao que que um fez num lado e sonhava agora projetar noutro depois de um início em que marcou metade dos 18 golos dos catalães com apenas seis jogos realizados.

O nome de Robert, o vulcão Eyjafjallajökull e a mulher karateca: os acasos de Lewandowski, o The Best que não foi obra do acaso

Depois, um pedido que tinha também em si um flic flac à retaguarda de Karl-Heinz Rummenigge, antigo presidente executivo e referência do conjunto bávaro. “Gostaria que público e clube o recebessem com gratidão. Não nos podemos esquecer que jogou aqui durante oito anos, ganhou tudo o que se podia ganhar, marcou entre 35 e 40 golos cada temporada. Além disso, chegou livre e saiu por 45 milhões, ajudou muito o Bayern”, comentou o antigo avançado que se foi manifestando várias vezes contra a forma como o Barça foi gerindo o processo mas que agora critica o Real e o próprio treinador Julian Nagelsmann por dizer que não percebia como um clube falido contratava tanto e tão caro (“Cada macaco no seu galho”, diz).

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“É o único clube sem dinheiro e compra os jogadores que quer. É meio estranho e louco”: a dúvida de Nagelsmann sobre o Barcelona

A seguir um pouco de humor à mistura. Primeiro houve picardias nas redes sociais quando viu que Robert Lewandowski iria regressar à Allianz Arena, agora Thomas Müller revelou uma conversa com o sucessor do polaco sobre o encontro desta noite. “Nos últimos dez dias o Sadio Mané tem-me dito a brincar para não passar a bola para o Lewandowski por acidente”, revelou. “A minha relação com o Lewy desenvolveu-se durante muitos anos mas é passado. Há uma nova realidade e não nos podemos concentrar nele. Não podemos deixar o Lewy jogar o seu jogo. Ele é um atacante de topo, é perigoso dentro ou perto da área. Temos que impedi-lo de entrar em zonas de finalização”, acrescentou ainda o internacional alemão.

Alguns números dessa passagem pela Baviera após ter brilhado no B. Dortmund: 19 títulos em oito anos, incluindo uma Liga dos Campeões, um Mundial de Clubes, uma Supertaça Europeia, oito Bundesligas, três Taças da Alemanha e cinco Supertaças; 38 golos em 37 jogos na Champions realizados no Allianz Arena; 344 golos em 374 encontros oficiais pelo Bayern. Agora, as estatísticas eram outras, a começar pelo facto de se ter tornado o primeiro jogador da competição a fazer um hat-trick por três equipas diferentes depois dos três golos na goleada do Barcelona diante do Viktoria Plzen. E um dado tão ou mais importante que podia contar mais do que resultado e golos do polaco: a resposta culé no regresso à origem da depressão.

Messi contra 11 e no final golearam os alemães – e acabou de vez uma era no futebol (a crónica do Barcelona-Bayern)

Aquela goleada no Estádio da Luz do Bayern por 8-2 significou mais do que o fim de uma era na equipa blaugrana – foi o início da derrocada, entre contas falidas, uma clara queda desportiva e a saída de Lionel Messi. Tudo foi mudando aos poucos. Joan Laporta regressou à presidência, Xavi Hernández assumiu o comando da equipa após mais algumas apostas falhadas, os reforços cumpriram as necessidades que eram visíveis na equipa e até os pesos pesados têm hoje um peso cada vez mais relativo abrindo espaço para um virar de página. Também por aí, o Barcelona fazia mais do que um jogo em Munique. No final, a sensação foi estranha: como nos últimos jogos, perdeu; ao contrário dos últimos jogos, até “ganhou”.

Apesar de algumas saídas rápidas tendo Leroy Sané e Musiala como principais referências, o Bayern não só não se conseguiu superiorizar ao Barcelona como foi mesmo ultrapassado por várias ocasiões pelo ataque dos catalães ainda que esse filme não tivesse reflexo resultado. Porque houve uma defesa fantástica de Manuel Neuer a remate de Pedri (9′), porque houve um cabeceamento ao lado de Lewandowski depois de um cruzamento de Gavi (10′), porque depois de uma arrancada fantástica de Dembelé no início da jogada Lewandowski rematou a rasar a trave (18′), porque ainda houve mais um cabeceamento de Lewandowski para defesa de Neuer (21′), porque Rafinha fez a bola rasar o poste após combinar com Lewandowski (30′). Sempre o polaco, que chegou ao intervalo com mais remates do que o Bayern. Com zero golos.

O primeiro tempo tinha sido um partidazo de futebol, a segunda parte não ficou atrás logo com Raphinha e Goretzka a ficarem perto do golo nos minutos iniciais. Depois, imperou a eficácia. O Barcelona, que ainda não tinha sofrido de bola parada, viu Lucas Hernández antecipar-se para o 1-0 (50′) antes de Leroy Sané aumentar pouco depois a vantagem (54′) num encontro que só ficou fechado porque os catalães não melhoraram o rendimento em frente à baliza, a começar por uma bola no poste de Pedri numa grande combinação com Lewandowski (63′). Apesar da derrota, a depressão culé faz parte do passado. Quanto muito, falando do Bayern, pode ser apenas um trauma. E até isso pode ser uma questão de tempo.