O secretário de Estado da Administração Local admitiu esta terça-feira a criação de um programa específico, através da Direção-Geral das Autarquias Locais (DGAL), para compensar as freguesias pelas despesas extraordinárias com a pandemia de Covid-19.

A pedido do PSD, a comissão parlamentar que acompanha as autarquias locais ouviu neste dia o presidente da Associação Nacional de Freguesias (Anafre), Jorge Veloso, e depois o secretário de Estado da Administração Local, Carlos Miguel, acerca de um diferendo sobre o pagamento de despesas extraordinárias com a Covid-19 que as freguesias reivindicam como tendo sido um compromisso do Governo, mas que este ainda não pagou, alegando que não existe um compromisso para o fazer, pelo que a dívida não existe.

Governo e freguesias nem sequer se aproximam no total da quantia em causa: segundo a Anafre serão cerca de cinco milhões de euros em dívida, mas Carlos Miguel adiantou que as despesas reportadas à DGAL, entre março de 2020 e junho de 2022, por 2.290 (das 3.091) freguesias representam “o valor global reclamado, não confirmado”, de 23.122.071 euros.

“A pergunta que se repete nas intervenções tidas pelos senhores deputados é: Como resolver? E é fácil de dizer como resolver. A DGAL, no seu orçamento e no Orçamento do Estado, tem mecanismos que permitirão, assim seja vontade do Governo, resolver esta situação. E, por isso, através da DGAL, estamos a trabalhar numa solução para isso. Não terá nada a ver nem com os municípios, nem com o FEM [Fundo de Emergência Municipal], nem com o que quer que seja. Através da DGAL podemos construir um programa próprio para resolver esta situação”, afirmou Carlos Miguel.

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O governante defendeu, contudo, que nunca houve um compromisso firmado com as freguesias para o pagamento destas despesas, como houve com os municípios e com as comunidades intermunicipais, embora reconheça que “foram criadas expectativas”.

Carlos Miguel sublinhou ainda que as despesas apresentadas pelas freguesias à DGAL terão de ser “aferidas”, porque estes gastos não são documentados, mas apenas “reportados”.

“Posso-vos dizer, por exemplo, [que] temos freguesias que reportam como despesa global, do ano 2020, [uma verba de] 155.000 euros e reportam como despesa Covid-19 [o montante de] 635.000 euros. Ou seja, reportam à DGAL uma despesa Covid-19 que é quatro vezes superior àquilo que está reportado nas suas contas. E não é caso único”, exemplificou.

Estas “expectativas” das freguesias, que estiveram na linha da frente na ajuda às populações durante a pandemia de Covid-19, baseiam-se em reuniões tidas com a tutela do Governo anterior, noticiadas pela Lusa, nas quais terá sido abordada a compensação das freguesias por estas despesas extraordinárias, e também num memorando da DGAL, que pedia o reporte, todos os meses, pelas freguesias, das despesas extraordinárias com a Covid-19.

No último dia do congresso eletivo da Anafre, em 13 de março, e depois de ter ouvido o presidente reeleito da Anafre, Jorge Veloso, a pedir-lhe para “agilizar” o pagamento das despesas que estes órgãos autárquicos tiveram com a pandemia, a então ministra com a pasta das autarquias, Alexandra Leitão, respondeu: o “Governo cá estará”, o que foi entendido pelas freguesias como um reforço do compromisso do executivo.

Neste dia, Jorge Veloso mostrou-se agastado por as freguesias estarem a ser deixadas para trás, voltando a salientar que muitas ficaram em dificuldades financeiras para ajudarem fregueses durante a pandemia, ainda sem retorno, embora também tenha assumido que nem todas as despesas que as freguesias continuam a comunicar mensalmente à DGAL como “despesas covid” sejam elegíveis para serem ressarcidas neste âmbito.

O presidente da Anafre lamentou também que a proposta de Orçamento do Estado para 2023 (OE2023), apresentada na segunda-feira, não inclua, mais uma vez, qualquer verba para compensar as freguesias no âmbito das despesas Covid-19, embora admita que está satisfeito com os 293,2 milhões de euros de subvenção geral previstos no documento para as freguesias, mais 16,3 milhões do que este ano.

Quanto aos municípios, o Tribunal de Contas validou uma despesa global de 211,4 milhões de euros das câmaras no âmbito da Covid-19, mas estas autarquias ainda só tiveram acesso a 55 milhões de euros através do Fundo de Solidariedade da União Europeia, sem que qualquer outro montante com este fim esteja previsto na proposta de OE2023.

A proposta vai ser debatida na generalidade no parlamento nos próximos dias 26 e 27, estando a votação final global do diploma marcada para 25 de novembro.