As ondas de choque na sequência da demissão de Kwasi Kwarteng, o ex-ministro das Finanças inglês, estão a intensificar-se. Na sexta-feira, com apenas 38 dias de governo, a primeira-ministra Liz Truss fez a primeira mudança estratégica, ao substituir Kwarteng por Jeremy Hunt, um histórico dos Conservadores.
A demissão do ministro das Finanças, associada ao recuo no mini-orçamento, que Truss reconheceu ter surpreendido os mercados por “ir demasiado longe e demasiado rápido”, está a ser alvo de críticas por parte da oposição – e até do próprio partido.
Este domingo, são já três os deputados conservadores a pedir a demissão de Truss: Crispin Blunt, Andrew Bridgen e Jamie Wallis.
O primeiro a pedir uma mudança de liderança foi Crispin Blunt, um histórico do partido Conservador, que durante uma entrevista ao Channel 4 disse que “o jogo acabou” para Truss. Já depois da intervenção no programa, partilhou em comunicado declarações mais completas. “A maioria dos deputados percebem claramente que a autoridade da primeira-ministra Liz Truss está agora fatalmente danificada. Precisa de sair agora, uma vez que não consegue ganhar ou manter a confiança dos seus colegas, muito menos do público e dos incansáveis media.”
Below is my full statement of my views on the country's leadership following my interview on @Channel4News today.https://t.co/HJ29RZP1eb
— Crispin Blunt MP (@CrispinBlunt) October 16, 2022
“O nosso partido tem de responder coletivamente a este momento de crise suprema para nós”, acrescentou. Em relação à nomeação de Jeremy Hunt para a pasta das Finanças, diz que “é necessária mas uma mudança insuficiente”. Na ótica deste conservador, é necessário haver uma “transição”, que em algum momento “junte os talentos de Rishi Sunak, Penny Mordaunt e Jeremy Hunt nas posições de topo de liderança do partido”.
Mais tarde, seguiu-se o pedido do deputado de North West Leicestershire, Andrew Bridge, a pedir a demissão de Truss. Durante a corrida à liderança do partido Conservador, este deputado foi um apoiante de Rishi Sunak. Numa publicação feita este domingo, disse que “Liz afundou a sua própria liderança e o potencial regresso do seu antecessor, tudo ao mesmo tempo e em tempo recorde”.
A crítica vai mais longe e aponta que “Liz Truss já ficou sem amigos”. “Agora só tem o apoio de um terço dos deputados eleitos. Devemos esperar mais fogo de artifício no Parlamento esta semana. A menos que isto seja resolvido de forma rápida, estamos a caminhar para eleições gerais”.
Na semana passada, no Parlamento, Liz Truss descartou a hipótese de novas eleições. “A última coisa de que precisamos agora é de eleições”, respondeu, após críticas da oposição.
Jamie Wallis foi o terceiro deputado do partido Conservador a pedir a demissão da primeira-ministra. “Nas últimas semanas, vimos como o Governo tem minado a credibilidade económica da Inglaterra e fraturado o nosso partido de forma irreparável. Já chega”, escreveu no Twitter, onde partilhou a totalidade da carta que enviou a Truss.
In recent weeks, I have watched as the Government has undermined Britain’s economic credibility & fractured our Party irreparably.
Enough is enough.
I have written to the Prime Minister to ask her to stand down as she no longer holds the confidence of this country. pic.twitter.com/hHej8LGfJf
— Jamie Wallis MP (@JamieWallisMP) October 16, 2022
“Acredito que estas falhas surgiram de erros muito básicos e evitáveis na sua abordagem”, é possível ler na missiva. “Assim, peço-lhe que abandone o cargo de primeira-ministra, já que acredito que já não consegue ter a confiança do país ou do seu partido parlamentar. Esta é a coisa certa a fazer para garantir a estabilidade, segurança e prosperidade das pessoas a quem deve tudo.”
Além dos deputados, também Robert Halfon, que teve funções na área da educação durante o governo de Theresa May, está entre os críticos conservadores. Em declarações citadas pela Sky News, acusa o atual governo de agir “como jihadistas libertários”, que estão a tratar o país como um “ratinho de laboratório” ao longo das últimas semanas.
Novo ministro das Finanças diz que nada está fora de questão
Enquanto os deputados do próprio partido pedem a demissão de Liz Truss, o novo ministro das Finanças dá algumas entrevistas. Em comentários feitos à BBC, frisa que vai “pedir a todos os departamentos do governo para encontrarem mais formas eficientes de poupar”.
Na curta conferência de imprensa de sexta-feira, após o despedimento de Kwarteng, Liz Truss frisou que queria um Estado mais eficiente, que fizesse melhor uso do dinheiro público na altura de crise que o Reino Unido enfrenta. O país está a ser pressionado pela escalada da inflação e pela significativa subida dos preços da energia.
No âmbito económico, Jeremy Hunt, um experiente político, diz que “não tira nada da mesa”. “Não quero tirar nada a mesa, quero manter o maior número de cortes de impostos que seja possível, porque a nossa saúde a longo prazo depende de sermos uma economia com poucos impostos. E acredito firmemente nisso”.
Críticas também do outro lado do Atlântico
Não é só no Reino Unido que Liz Truss está a ser alvo de críticas. Este sábado, de acordo com a Reuters, o Presidente dos Estados Unidos teceu críticas ao plano económico original da governante britânica.
“Não fui o único a pensar que era um erro”, disse Biden sobre a proposta do mini-orçamento. “Acho que a ideia de reduzir impostos aos mais ricos numa altura [como esta] – discordo da medida, mas acho que fica ao critério da Grã-Bretanha fazer esse julgamento, não a mim.”
Biden disse ainda que não “está preocupado com a força do dólar”, mas sim “com o resto do mundo”.
Biden considera “erro” recuo de primeira-ministra britânica face a inflação mundial