O Prémio Pessoa foi atribuído, este ano, a João Luís Barreto Guimarães, médico-cirurgião, poeta e professor de Poesia na Universidade do Porto e “uma voz inconfundível nos jornais e na poesia portuguesa contemporânea desde 1989, quando publicou o primeiro livro, aos 22 anos”. O anúncio foi feito ao final da manhã desta quinta-feira pelo presidente do júri, Francisco Pinto Balsemão, numa conferência de imprensa realizada no Palácio dos Seteais, em Sintra.
“Com uma obra vasta que se inscreve simultaneamente na tradição lírica portuguesa, tanto na sua nota histórica como intimista, e numa modernidade europeia e anglo-saxónica, João Luís Barreto Guimarães tem dezenas de livros publicados em Portugal e traduzidos no estrangeiro, na Europa e na Ásia, na América do Sul e do Norte”, declarou Pinto Balsemão, acrescentando que o poeta “alia à virtude da palavra e da imaginação, uma reflexão por vezes irónica, por vezes realista, sempre duramente trabalhada, sem prejuízo do efeito estético na construção do poema”.
“Homem culto, participante ativo da cultura europeia cosmopolita, a sua sensibilidade poética transita da literatura para as outras artes com uma fluidez que não recusa a tinta sentimental ou a demonstração consciente da inconsciência da condição humana. João Luís Barreto Guimarães escreve sobre nós, portugueses, e escreve sobre tudo o que vê e o que observa, o que sente e o que pensa, e escreve sobre o outro com uma atenção permanente. Criou assim uma metafísica da realidade, transparente na aparente leveza, exata na concreta execução. Esta obra é testemunho de um tempo, o de agora, e de um tempo antigo, clássico, universal, reconhecível pela inteligência e a emoção”.
Em Sintra, Rui Vieira Nery, membro do júri, reforçou que, embora seja médico e cirurgião, “é na qualidade de poeta que [João Luís Barreto Guimarães] recebe o Prémio Pessoa”, referindo que “como poeta, trata também a sua experiência da relação com o doente”. Questionado pelos jornalistas no Palácio dos Seteais, esclareceu que, para a atribuição do prémio, “não se valorizou especialmente o último livro” editado pelo poeta, Movimento (2020), que considerou ser “o culminar de uma longa carreira”. “Foi sublinhada na decisão do júri essa continuidade”, disse.
João Luís Barreto Guimarães e família surpresos com prémio: “Estamos surpresos, gratos, admirados e muitíssimos contentes”
Reagindo à atribuição do Prémio Pessoa 2022, João Luís Barreto Guimarães usou o plural para descrever os sentimentos de toda a família. “Estamos surpresos, gratos, admirados e muitíssimos contentes. Sem sequer prever em toda a sua dimensão as repercussões que um prémio como este acarreta para um autor”, afirmou ao Expresso, confessando que ainda se encontrava a “digerir” a informação, recebida esta quarta-feira, quando se preparava para assistir ao jogo França-Marrocos do Mundial de futebol.
João Luís Barreto Guimarães nasceu a 3 de junho de 1967, no Porto. Médico-cirurgião, poeta e tradutor, é professor no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto, onde ensina Poesia a estudantes de medicina. Desde 1989, quando lançou o primeiro livro de poemas, Há Violinos na Tribo, que publica regularmente. O seu mais recente livro, Movimento, foi editado em 2020 pela Quetzal. No ano anterior, publicou a antologia O Tempo Avança por Sílabas. Os primeiros sete livros foram reunidos em 2011, no volume Poesia Reunida, editad0 também pela Quetzal.
O seu trabalho poético está representado em variadas antologias e revistas literárias, sobretudo em língua inglesa. Leu a sua poesia no México, Estados Unidos, Espanha, Alemanha e Croácia. Foi galardoado em Portugal com os prémios António Ramos Rosa (2016), Armando da Silva Carvalho (2018) e o Grande Prémio da Literatura dst (2022). Em 1992, recebeu o Prémio Criatividade das nações Unidas. Foi finalista do Premio Internazionale Camaiori, em Itália, em 2019 e 2020, e recebeu o Willow Run Poetry Book Award (2020) nos Estados Unidos da América.
Em comunicado, a Quetzal afirmou que “dos primeiros poemas até hoje, a obra de João Luís Barreto Guimarães evoluiu não apenas no sentido do seu reconhecimento em Portugal ou no estrangeiro — mas também no do apuramento de uma ironia raríssima entre nós, e da melancolia nascida das coisas simples e quotidianas, sem ocultar uma raiz profunda que vai buscar referências à cultura europeia nas suas diversas geografias, do Mediterrâneo à Mitteleuropa, das margens do Levante à contemplação do Atlântico”.
“A sua obra lê a poesia dos contemporâneos (que, aliás, traduz) e o edifício da história do nosso século através das suas memórias, palavras, acidentes e personagens — das mais simples às mais raras, numa peregrinação que acompanha a construção de uma gramática própria”, acrescentou a editora em comunicado à reação da atribuição do prémio ao poeta.
No ano passado, o Prémio Pessoa foi atribuído a Tiago Pitta e Cunha, administrador executivo do Conselho de Administração da Fundação Oceano Azul, uma entidade sem fins lucrativos que visa contribuir para a conservação e utilização sustentável dos oceanos e para apoiar a definição de “políticas que permitam a coexistência do desenvolvimento humano com a proteção dos oceanos”.
O Prémio Pessoa é uma iniciativa do semanário Expresso que visa distinguir cidadãos portugueses que desempenhem um papel significativo na vida cultural e científica do país. É patrocinado pela Caixa Geral de Depósitos e consagra ao vencedor com uma soma monetária de 60 mil euros.
O júri deste ano foi constituído por Francisco Pinto Balsemão (presidente), Paulo Macedo (vice-presidente), Ana Pinho, António Barreto, Clara Ferreira Alves, Diogo Lucena, Eduardo Souto de Moura, José Luís Porfírio, Maria Manuel Mota, Pedro Norton, Rui Magalhães Baião, Rui Vieira Nery e Viriato Soromenho-Marques.