As medidas de resposta à Covid-19 pressionaram as contas dos municípios em 2020, mas, em termos globais, a pandemia “não parece ter induzido” um crescimento da despesa municipal, revela um relatório do Tribunal de Contas (TdC).
No relatório onde analisa o impacto da pandemia nas contas de 2020 dos 278 municípios do continente, o TdC destacou que a crise sanitária afetou o desempenho orçamental e financeiro destas autarquias, que viram reduzir as suas receitas próprias e aumentar as despesas.
No entanto, sublinhou que estas autarquias também obtiveram nesse período mais transferências do Orçamento do Estado e da União Europeia e realizaram menos gastos, devido ao encerramento de serviços e de instalações municipais e à suspensão de atividades.
O TdC destacou que esta é uma perspetiva global, verificada na maioria dos municípios, mas com assimetrias.
Desde logo, nos municípios de grande dimensão, como os localizados na Área Metropolitana de Lisboa (Almada, Amadora, Cascais, Lisboa, Loures, Oeiras, Odivelas, Sintra ou Vila Franca de Xira), o impacto da pandemia nas receitas e nas despesas foi sentido “de forma mais intensa”, por serem mais populosos, “com maior potencial de perda de receita e pressão para a realização de despesa”.
Em termos gerais, segundo o TdC, a adoção de medidas locais e a retração da atividade económica pressionaram os orçamentos municipais que, na ótica de caixa, tiveram uma quebra de -1% na receita e um aumento de +3% da despesa, um “‘efeito tesoura’ que provocou uma erosão do saldo em comparação com os exercícios anteriores”.
A quebra das receitas próprias municipais notou-se, sobretudo, na cobrança de taxas associadas a bens e serviços prestados pelos municípios (-240,1 milhões de euros) e outras receitas correntes (-17,0 milhões de euros), mas também houve diminuição da arrecadação de impostos locais, como o Imposto Municipal sobre a Transmissão Onerosa de Imóveis (IMT), que decresceu -35,8 milhões de euros.
Em conjunto, os municípios estimaram uma despesa global de cerca de 240 milhões de euros na resposta à pandemia, quando “mobilizaram bens, serviços ou recursos financeiros” para apoiar a população em geral, “maioritariamente classificadas em despesas de funcionamento como a aquisição de bens e serviços e transferências e subsídios concedidos”.
Segundo o relatório, é “evidente” explicar com o contexto de emergência a variação da receita e da despesa em 2020, mas esta “tem de ser colocada em perspetiva”, até porque os dados orçamentais e financeiros disponíveis demonstram que as contas dos municípios tiveram “um comportamento resiliente, não ficando tão expostas aos efeitos da crise como outras entidades ou subsetores da administração pública”.
Em termos globais, “a quebra significativa das receitas próprias foi, em grande medida, compensada com o aumento das transferências recebidas do Orçamento do Estado e da União Europeia, fator alheio à pandemia, que permitiu à maior parte dos municípios (193 ou 69%) enfrentar 2020 com mais receita do que a que detinha antes da emergência sanitária”.
Por outro lado, as restrições à circulação e aos contactos sociais levou ao encerramento de serviços e de instalações e equipamentos municipais e à suspensão de atividades, o que teve expressão orçamental “com a diminuição da aquisição de bens e serviços correntes (-132,3 milhões de euros), assim como nas outras despesas correntes (-50,6 milhões de euros), e ainda em outras componentes das despesas com pessoal (-18,3 milhões de euros)”.
“Isto é, apesar dos montantes despendidos com a aquisição de bens e serviços, designadamente equipamentos de proteção individual ou outras ações logísticas, a redução da atividade municipal acabou por ter um efeito de retração nessas rubricas”, é salientado.
O relatório indicou ainda que, apesar da pressão nos orçamentos causada pelas medidas de resposta à Covid-19, “a suspensão de atividades correntes dos municípios diminuiu a necessidade de outros grandes dispêndios, razão pela qual, em 2020, em termos globais a pandemia não parece ter induzido um crescimento da despesa municipal”.
Segundo o TdC, este crescimento da despesa “encontrará maior justificação em fatores extra pandémicos, como o crescimento das remunerações certas e permanentes das despesas com pessoal (+90,3 milhões de euros) e, sobretudo, da aquisição de bens de capital (+185,8 milhões de euros)”.
No relatório é sublinhado ainda que, apesar da crise sanitária, em 2020 o número de municípios em desequilíbrio orçamental reduziu de 37 para 15 (oito deles já estavam em desequilíbrio e sete juntaram-se neste ano a essa lista) e a maioria dos municípios (211 ou 76%) aumentou o seu saldo corrente.
Também em relação à evolução do endividamento, o número de municípios com excesso de endividamento “diminuiu (de 20 para 16, que já estavam em dificuldades antes da pandemia) e uma larga maioria (216 ou 78%) aumentou as suas margens de endividamento”.
Esta análise ao efeito das medidas contra a Covid-19 nas contas dos municípios em 2020 será seguida por outras relativamente a 2021 e 2022, segundo o TdC, que salientou ainda que o reporte de informação pelos municípios nos Relatórios de Gestão tinha, em muitos casos, “deficiências várias”, como a falta de critérios uniformes de quantificação e divulgação, “o que prejudicou a obtenção de conhecimento integral e comparável”.