A justiça portuguesa demorou mais de seis meses a autorizar o Ministério Público (MP) a aceder à localização do telemóvel de Luana. A jovem, natural de Leiria, estava desaparecida desde 30 de maio de 2022, e só esta terça-feira foi encontrada em Évora, após uma operação da Polícia Judiciária (PJ), que deteve um homem de 48 anos, suspeito de a ter mantido em cativeiro ao longo de oito meses.

PJ encontra em Évora menor desaparecida há 8 meses. Homem de 48 anos que a mantinha em cativeiro foi detido

Sabe-se agora que a investigação demorou meses para obter uma autorização dos tribunais para pedir à operadora de telecomunicações a localização do telemóvel da jovem de 17 anos. Ao todo, foram precisos dois pedidos, e um recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra para que, a 13 de dezembro, o MP pudesse ser autorizado a rastrear as comunicações de Luana.

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Questionado pela comunicação social, o Presidente da República comentou o caso. No entender de Marcelo Rebelo de Sousa, para que o sistema de justiça funcione corretamente é necessário que lhe sejam atribuídos meios. “Uma justiça que seja justa exige meios adequados”, disse.

Segundo notícia do jornal Público, o Tribunal de Instrução Criminal de Leira decidiu duas vezes pela não-autorização de acesso aos dados. O primeiro pedido do MP, que solicitou informações relativas aos últimos seis meses (período que abrangia as semanas que antecederam o desaparecimento) foi feito a 7 de julho, e o segundo a 15 de outubro. Em ambas as ocasiões, a juíza recusou o acesso, baseando a sua decisão na lei dos metadados, que determina que o acesso às informações sobre tráfego e localização de telecomunicações por parte de investigações careça de autorização judicial – um acesso que a juíza considerou indevido.

O MP acabou por recorrer para a Relação de Coimbra, sustentando no acórdão citado pelo Público que “a localização celular referente às comunicações realizadas pela menor nos últimos seis meses (abrangendo as semanas que antecederam o seu desaparecimento) se revelava “indispensável e crucial para a localizar com vida”.

Nesta instância a decisão sorriu ao MP. Contrariando a juíza de Leiria, a Relação de Coimbra entendeu que o argumento da proteção de metadados não era válido à luz do caso de rapto. “Aí estamos a curar de intercepcionar telecomunicações telefónicas de suspeitos ou arguidos, aqui estamos a falar de telecomunicações com um telemóvel da própria vítima”.

As críticas da Relação não ficaram por aqui. “[Neste caso], em que pode estar em causa a vida de uma criança, ela própria possível vítima de crimes, vamo-nos deixar de dúvidas técnico-jurídicas e presumir um mais do que provável perigo concreto na vida desta jovem há longos seis meses desaparecida”. Da autorização à descoberta da jovem passaram menos de dois meses.

Luana vivia com o raptor e a mãe dele, ia para o sótão quando havia visitas e passava os dias num quarto sem luz a jogar

De acordo com a PJ, Luana foi mantida em cativeiro “a coberto de uma suposta relação amorosa” que, acredita a investigação, durava desde que esta tinha 14 anos. A jovem passava os dias fechada num quarto sem luz, de auscultadores e a jogar consola. O homem de 48 anos é suspeito de se aproveitar de forma “persistente e recorrente da dependência de jogo online da vítima, imaturidade e personalidade frágil” de Luana.