A Media Capital está em negociações para a compra da Cofina, numa reviravolta face ao que esteve em cima da mesa em 2019, quando a empresa que detém o Correio da Manhã tentou ficar com a dona da TVI. Segundo informações recolhidas pelo Observador junto de várias fontes, a Media Capital, que tem Mário Ferreira como principal acionista, fez avanços para integrar a Cofina nas últimas semanas.

Ao Observador, nenhuma das partes respondeu ao pedido de comentário. Mas o Observador sabe que, nos últimos tempos, tem havido negociações. Ambas as empresas são cotadas, pelo que qualquer acordo terá de ser comunicado ao mercado e, eventualmente, passar por uma oferta pública de aquisição, caso haja mudança de controlo ou a compra de uma posição acima de 33,3%.

A Cofina tem atualmente uma capitalização bolsista de quase 27 milhões de euros, valendo a Media Capital, de acordo com a sua cotação, 102 milhões de euros.

A abordagem à Cofina por parte de Mário Ferreira terá de ter um perfil amigável, já que a empresa dona do Correio da Manhã tem um núcleo acionista controlador que não venderá numa operação hostil. Esse núcleo é composto por Paulo Fernandes, os irmãos João e Pedro Borges de Oliveira, Ana Mendonça e Domingos Vieira de Matos, que estão juntos noutros negócios, como a Altri e a Greenvolt. Os cinco acionistas detêm quase 71% da Cofina, sendo Paulo Fernandes o presidente executivo.

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A Media Capital detém a TVI, além da CNN Portugal (na televisão por subscrição), da produtora audiovisual Plural, do portal IOL, isto depois de, no ano passado, ter vendido as rádios à alemã Bauer por quase 70 milhões de euros.

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A televisão e a produção audiovisual são os dois principais negócios da Media Capital. Já a Cofina detém o Correio da Manhã e a estação de televisão CMTV, além dos jornais Record e Negócios, das revistas Sábado e TV Guia, tendo também um conjunto de negócios online, como a Flash, a Máxima ou a Nossa Aposta.

As duas empresas estiveram já, antes, envolvidas num processo de aquisição, quando a Cofina tentou comprar a Media Capital, através do acordo com a Prisa, que detinha 94,69% da dona da TVI, para ficar com a sua posição por 255 milhões de euros, um valor posteriormente revisto em baixa.

Tal aconteceu em setembro de 2021, tendo a Cofina revelado que para financiar esta operação iria lançar um aumento de capital. Veio 2020 e a pandemia, no arranque do ano as condições de mercado deterioraram-se, e a Cofina não conseguiu que o aumento de capital fosse subscrito. Mário Ferreira era um dos subscritores desse aumento de capital da Cofina. Mas, sem que tenha conseguido o financiamento pretendido, a Cofina pediu o fim da OPA sobre a Media Capital. O que aconteceu em paralelo com as negociações por parte de Mário Ferreira diretamente com os espanhóis da Prisa, até conseguir chegar a acordo para lhe venderem uma tranche.

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Foi no âmbito deste acordo com a Prisa que Mário Ferreira se viu obrigado a lançar também uma oferta pública de aquisição sobre a Media Capital. A partir daí nasceu um mal-estar entre Mário Ferreira e Paulo Fernandes, CEO da Cofina. De amigos passaram a trocar acusações públicas mútuas entre os dois grupos.

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Mário Ferreira acabou por ficar como principal acionista da Media Capital e a Cofina manteve os negócios que tinha nos media e recebeu um processo da Prisa contra si pela resolução do contrato de compra da Media Capital. Nesse âmbito, a Prisa reclama, no tribunal arbitral, 10 milhões de euros à Cofina. O processo ainda decorria na última informação prestada ao mercado pelo grupo detentor do Correio da Manhã.

As pazes entre os dois empresários continuam — pelo menos publicamente — por fazer e ainda em 2022, quando o Correio da Manhã fez um conjunto de notícias sobre Mário Ferreira e os pedidos de acesso a fundos europeus, o empresário mais conhecido pelos barcos do Douro publicou, no seu Facebook, uma mensagem crítica sobre Paulo Fernandes.

Facebook de Mário Ferreira

Concorrência e ERC já aprovaram uma vez

A Autoridade da Concorrência e a ERC tinham dado, em 2019, luz verde à compra da Media Capital pela Cofina. A Autoridade da Concorrência nem estabeleceu, na altura, qualquer tipo de compromisso. E nessa altura a Media Capital ainda detinha, além do que agora possui, as rádios.

“O Conselho de Administração da Autoridade da Concorrência, no uso da competência que lhe é conferida pela alínea d) do n.º 1 do artigo 19.º dos Estatutos, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 125/2014, de 18 de agosto, delibera adotar uma decisão de não oposição à operação de concentração, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 50.º da Lei da Concorrência, uma vez que a mesma não é suscetível de criar entraves significativos à concorrência efetiva nos mercados relevantes identificados”, segundo a decisão comunicada a 30 de dezembro de 2019.

Mesmo na televisão, a Concorrência não atribuiu entraves à concorrência, apesar de a Media Capital ter a TVI  (agora acrescentou-lhe a CNN, antes tinha a TVI 24) e a Cofina a CMTV .

Para a AdC, “do lado dos utilizadores que acedem ao conteúdo (na sua maioria sob a forma gratuita), a entidade resultante da operação de concentração não tem capacidade para implementar qualquer tipo de estratégia de encerramento de mercado”, e, “da mesma forma, do lado dos anunciantes, e tendo em conta, sobretudo, o poder negocial dos clientes (agências de meios e anunciantes), a AdC conclui que a nova entidade — que resulta ela própria da fusão entre duas empresas que já tinham atividade em mercados complementares — não terá capacidade para implementar estratégias de vendas condicionadas que resultem em encerramento de mercado com efeitos suscetíveis de criar entraves significativos à concorrência.”