O clima político em França continua a aquecer e poderá chegar a um novo pico de tensão na segunda-feira, quando forem votadas na Assembleia Nacional (a câmara baixa do Parlamento francês) as moções de censura que já deram entrada contra o governo de Emmanuel Macron.
Na sexta-feira, foram entregues dois projetos de censura: um do partido de Marine Le Pen, o União Nacional (Rassemblement National), e outro de um grupo composto por vários partidos, incluindo a frente de esquerda liderada por Jean-Luc Mélenchon.
Se um dos projetos for votado pela maioria dos deputados, não só a reforma das pensões, cuja aprovação o Governo forçou por decreto e que tem causado fortes manifestações, deve ser travada como o Governo pode cair (como o Le Monde explica, o chefe de Estado não é obrigado a dissolver o Parlamento neste caso, podendo optar por outras vias, como nomear um Governo novo — ainda assim, como acrescenta o mesmo jornal, dificilmente isso serviria para resolver uma crise política).
Caso as moções sejam rejeitadas, “cenário mais provável” pelas contas da imprensa francesa tendo em conta a composição da Assembleia Nacional — exigiria que houvesse consenso da União Nacional de Le Pen aos partidos da frente da esquerda para conseguir a maioria absoluta dos votos –, isso não deverá ainda assim matar a polémica que rodeia o projeto da reforma das pensões (que aumenta a idade da reforma de 62 para 64 anos).
Manifestações contra reforma das pensões proibidas em França
Isto porque a polémica vai muito além das paredes da Assembleia Nacional. Há dias que grandes grupos de manifestantes (tudo somado, conta o Le Monde, poderão ter chegado aos três milhões de pessoas) protestam nas ruas de Paris (e de outras cidades), sobretudo concentrados na Place de la Concorde, junto ao edifício onde os deputados se reúnem, tendo os protestos sido mesmo proibidos este sábado pela polícia.
Isto depois de nos dias anteriores alguns manifestantes terem posto caixotes do lixo a arder, partido vidros da loja ou, segundo a polícia, que respondeu usando canhões de água e gás lacrimógeneo, tentado vandalizar o obelisco no centro da praça. Sendo que, como relata a imprensa francesa, o que complica o caso para o Governo é que a opinião pública estará do lado dos manifestantes.
Neste contexto, há deputados que já disseram temer pela sua segurança, conta o The Guardian. “É como se amanhã eles nos quisessem decapitar“, disse a deputada Frédérique Meunier, dos Republicanos, contando à televisão BFMTV que os deputados estão a receber “centenas” de e-mails com ameaças por dia. Ao mesmo tempo, uma sondagem no Journal du Dimanche, este domingo, aponta para uma queda significativa na popularidade de Macron — não era tão baixa desde os protestos dos coletes amarelos, há quatro anos.
E a semana que se antecipa não deverá ser mais calma: são esperados protestos em cidades por todo o país, depois de só em Paris terem sido detidas 160 pessoas já na madrugada de domingo, em mais uma noite de protestos. Nos guias preparados pela imprensa francesa mencionam-se também planos para greves várias, dos controladores aéreos aos transportes públicos, de vigilantes de exames nas escolas a refinarias.
Este domingo, o Presidente francês veio tentar deixar uma mensagem de calma sobre a contestada reforma: numa mensagem enviada à agência AFP, disse ser seu “desejo” que “o texto sobre as pensões possa seguir o seu caminho democrático até ao fim, com respeito por todos”. Isto numa altura em que o Executivo não dá sinais de recuo: apesar da pressão nas ruas e no Parlamento, o ministro da Economia, Bruno Le Maire, já veio dizer que a reforma vai mesmo para a frente e que não será “tolerada” violência nos protestos.