Para o Congresso dos EUA, os “americanos precisam” e merecem saber a verdade acerca do TikTok, nomeadamente as ligações da plataforma à China. O CEO da rede social, Shou Zi Chew, afirma que não é “promovido ou removido” qualquer conteúdo a pedido do Partido Comunista chinês. Além disso, garante não ver “provas de que o governo chinês tem acesso a informações” de utilizadores norte-americanos: “Nunca nos pediram, nunca lhes demos”. São afirmações que não convenceram os deputados.
Shou Zi Chew foi ouvido pelo Comité de Energia e Comércio do Congresso norte-americano durante mais de cinco horas, tempo em que tentou responder, principalmente, às preocupações acerca da segurança da plataforma, das alegadas ligações à China e do Projeto Texas. Pelo meio, existiu ainda tempo para uma questão pessoal (que foi repetida duas vezes): “Porque é que não deixa o seu filho de oito anos ter TikTok?”.
O CEO vive em Singapura, onde, explica, a versão da aplicação para menores de 13 anos — que conta com proteções adicionais de segurança e privacidade — não está disponível. Por isso, garante que se vivesse nos Estados Unidos, país onde a “versão infantil” foi implementada, deixaria os seus dois filhos utilizarem a rede social.
Congresso pressiona CEO do TikTok sobre ligações à China
As primeiras duas horas de Shou Zi Chew no Congresso ficaram marcadas por questões acerca das alegadas ligações à China e ao Partido Comunista chinês. Começou por recordar que a ByteDance, proprietária chinesa do TikTok, tem cinco membros no conselho de administração, sendo três deles americanos. Além disso, admitiu estar em comunicação constante com Chew Shouzi, o CEO dessa empresa.
As afirmações feitas esta quinta-feira por Pequim, que disse opor-se “firmemente” à venda forçada do TikTok que é pedida pelos EUA, não passaram despercebidas entre os deputados, que consideraram que a distância entre o país e a rede social não é tão grande como os dois tentam fazer parecer.
Inicialmente, Shou Zi Chew disse que o “TikTok não está disponível na China”, tendo a sua sede em Los Angeles e em Singapura. Depois, acrescentou que o “Projeto Texas” foi desenhado para “proteger os interesses dos utilizadores norte-americanos”. Questionado pelo republicano Tim WalBerg sobre se concorda com as declarações da China, o CEO disse que não podia falar “em nome de um oficial do governo chinês”.
China opõe-se “firmemente” à venda forçada do TikTok, que é pedida pelos EUA
Há dois anos, um funcionário do TikTok disse numa reunião que “tudo é visto na China”. O CEO negou que essa seja a realidade e discordou da utilização da palavra “espiar”: “O que posso dizer é que, com base na minha posição nesta empresa e na responsabilidade que tenho, essa afirmação simplesmente não é verdade”.
Questionado pela deputada republicana Cathy McMorris Rodgers, que presidiu a audição, sobre se poderia garantir a 100% que a ByteDance e o Partido Comunista chinês não podem usar o TikTok para promover conteúdo pró-Pequim, o CEO disse apenas que pretende manter a rede social “livre de manipulação do governo”.
A China ainda tem acesso a dados de utilizadores norte-americanos?
A presença de Shou Zi Chew no Congresso norte-americano ficou marcada por uma contínua repetição: as mesmas perguntas foram feitas várias vezes, o que levou a que fossem dadas respostas iguais — numa “unificação” rara entre democratas e republicanos.
O escrutínio ao TikTok em aumentado ao longo dos últimos meses. A Comissão Europeia proibiu os funcionários de utilizaram o TikTok e o FBI alertou para os países: estarão estas entidades erradas? Foi a questão feita pela republicana Debbie Lesko. “Eu acho que muitos dos riscos que têm sido apontados são hipotéticos e teóricos. Não vi nenhuma prova”, respondeu o CEO.
Comissão Europeia proíbe funcionários de utilizarem o TikTok
Shou Zi Chew foi várias vezes chamado a atenção por não conseguir responder somente com “sim ou não” quando solicitado. Foi o que aconteceu quando lhe perguntaram se os funcionários da ByteDance na China ainda têm acesso a dados de utilizadores norte-americanos: “É um tópico complexo”. “Depois de o Projeto Texas estar implementado a resposta é não, agora ainda temos que apagar [dados]”, afirmou, considerando que esses dados não estão a ser partilhados e recordado o plano que está em negociações há mais de três anos para responder às preocupações de segurança dos EUA.
Relativamente a dados de utilizadores dos EUA surgiu ainda uma outra questão: “O TikTok recolhe dados de localização precisos?”. O presidente executivo confirmou que essa recolha aconteceu em 2020, mas que a aplicação já não a faz. Nesse seguimento, a deputada Debbie Dingell tentou perceber se as localizações daqueles que têm versões antigas da rede social são ainda recolhidas — Shou Zi Chew disse que as pessoas nessa situação são apenas uma “pequena percentagem” das milhões que utilizam a app e garantiu que os dados não são vendidos a terceiros.
“Texas não é o nome apropriado”. Projeto do TikTok para dar garantias de segurança alvo de críticas
O Projeto Texas esteve no centro das atenções ao longo de toda a audição. Os deputados não se mostraram convencidos pelas garantias de segurança que o TikTok pretende apresentar, acreditando que o plano não tem “a capacidade técnica para dar as garantias” necessárias.
O republicano August Pfluger, do estado do Texas, deixou um pedido: “Por favor, altere o nome. Texas não é o nome apropriado. Defendemos a liberdade e a transparência e não queremos o seu projeto”, que o TikTok descreve como sendo “sem precedentes”.
Shou Zi Chew comparou várias vezes os problemas apontados ao TikTok com o resto da indústria e garantiu que ninguém estava disposto a ir tão longe quanto a aplicação que lidera. Confrontado com a ideia dos deputados de que a rede social deveria ser uma empresa americana, com valores americanos, o CEO contrapôs dizendo que nem todas as redes sociais dos EUA têm um bom histórico de proteção de dados: “Veja o Facebook com a Cambridge Analytica“, atirou.
12 coisas que tem de saber para perceber a polémica do Facebook e da Cambridge Analytica
Ao longo de quatro horas desta quinta-feira, o CEO recusou-se a responder se tinha ações na ByteDance. Nos minutos finais da audição, à quinta hora e após mencionar a palavra “transparência” várias vezes, admitiu que sim. O valor do salário que recebe da ByteDance foi mantido em segredo.
Os receios do Congresso quanto aos jovens na plataforma
Se o foco principal foi, durante muito tempo, a China e o Projeto Texas existiu ainda espaço para falar sobre os potenciais impactos que a plataforma pode ter nas crianças e nos adolescentes. Para responder aos receios dos membros do Congresso, Shou Zi Chew recordou que o TikTok foi a primeira plataforma a implementar o limite de 60 minutos para utilizadores menores de idade e que não permite a menores de 16 anos enviar mensagens privadas.
“Colocar alguns limites levaria a uma percentagem dos seus utilizadores a deixar o TikTok e ir para outra plataforma. É algo que está preparado para aceitar?”, questionou o deputado democrata John Sarbanes. “Sim”, respondeu o CEO, que avançou que cerca de 40 mil pessoas estão envolvidas na moderação de conteúdos da plataforma — número a que se juntam os algoritmos que detetam conteúdos que violam as regras.
TikTok vai implementar limite de 60 minutos para utilizadores menores de idade
Foi durante a discussão da segurança no TikTok que a deputada republicana Kat Cammack mostrou um vídeo partilhado na aplicação há mais de 41 dias com ameaças dirigidas ao Comité do Congresso norte-americano. Passados meros minutos a publicação deixou de estar acessível. Por isso, Tony Cárdenas — o único deputado presente esta quinta-feira no Congresso que, atualmente, tem conta no TikTok — procurou saber se seria feito um maior investimento para “apagar informação prejudicial e mortífera”. “Sim, estamos a investir mais e vamos continuar a fazer isso”, garantiu Shou Zi Chew.
Vários deputados, que são pais, mostraram-se ainda preocupados com a apresentação de “corpos magros” ou de dietas que não são saudáveis aos adolescentes. O TikTok disse que tudo o que é conteúdo que “glorifica distúrbios alimentares” é removido e que trabalha com especialistas para conseguir identificar e apagá-lo mais rapidamente.
O que levou o CEO do TikTok ao Congresso?
Os EUA temem que o TikTok, propriedade da chinesa ByteDance, seja utilizada como ferramenta de espionagem ao serviço de Pequim. O Comité de Energia e Comércio do Congresso norte-americano quis ouvir o CEO Shou Zi Chew para obter respostas a três tópicos: privacidade e segurança de dados dos utilizadores; a forma como a plataforma afeta as crianças e a relação com o Partido Comunista chinês.
Num documento fornecido ao Comité um dia antes de ser ouvido, o empresário escreveu que “a ByteDance não é um agente da China ou de qualquer outro país” e afirmou que o TikTok “nunca partilhou, nem recebeu nenhum pedido para partilhar, dados de utilizadores norte-americanos com o governo chinês”. Shou Zi Chew deixou ainda quatro garantias, que repetiu durante a audição: “Manteremos a segurança — especialmente dos adolescentes – uma prioridade máximo para nós”; “protegeremos os dados dos utilizadores dos EUA contra acesso estrangeiro não autorizado”; “o TikTok continuará a ser uma plataforma para a liberdade de expressão e não será manipulado por nenhum governo; “seremos transparentes e daremos acesso a supervisores independentes terceiros, para continuarmos a ser responsáveis pelos nossos compromissos”.
O CEO assegurou que no “centro” do trabalho está o “Projeto Texas”, um plano que é negociado, desde 2019, entre o TikTok e os norte-americanos para dar garantias de segurança. Nesse sentido, para responder às preocupações e “para assegurar que os dados de todos os norte-americanos são armazenados nos EUA e alojados por uma empresa americana sediada nos EUA”, a plataforma contratou os serviços da empresa de tecnologia Oracle para armazenar “os dados dos utilizadores do TikTok nos EUA”. Por isso, garantiu Shou Zi Chew no documento, “atualmente 100% do tráfego dos utilizadores norte-americanos está a ser encaminhado para infraestruturas controladas pela Oracle e pelo USDS [United States Digital Service]”.
Além disso, o TikTok afirmou que iniciou, no início deste mês, o “processo de eliminação de dados protegidos de utilizadores norte-americanos [que estavam] armazenados em servidores que não pertencem à Oracle”. “Esperamos que este processo seja concluído no final deste ano. Quando o processo estiver concluído, todos os dados protegidos dos EUA estarão sob proteção da lei norte-americana e sob controlo da equipa de segurança liderada pelos EUA. Sob esta estrutura, não há nenhuma forma de o governo chinês ter acesso ou obrigar o acesso” a essas informações.
Apesar das garantias dadas por Shou Zi Chew ainda antes de ser ouvido, o The Wall Street Journal avançou que assessores dos deputados republicanos que fazem parte do comité afirmaram que não há nada que o CEO possa dizer que os façam mudar de ideias: querem proibir o TikTok nos EUA. Num vídeo partilhado esta terça-feira, cerca de 48 horas antes de ser ouvido, o líder do TikTok dava conta de que existem mais de 150 milhões de utilizadores mensalmente ativos só nos EUA: “Alguns políticos começaram a falar sobre banir o TikTok. Isso pode retirar o TikTok de 150 milhões de vocês.”
@tiktok Our CEO, Shou Chew, shares a special message on behalf of the entire TikTok team to thank our community of 150 million Americans ahead of his congressional hearing later this week.
♬ original sound - TikTok
Os receios de espionagem por parte dos norte-americanos fizeram com que o Comité do Investimento Estrangeiro, do Departamento do Tesouro, tenha ameaçado banir o TikTok nos EUA se a rede social permanecer nas mãos da ByteDance. Apesar de a plataforma ter desvalorizado os pedidos, o escrutínio tem aumentado. Neste momento, o Departamento de Justiça e o FBI investigam o TikTok por alegada vigilância a jornalistas.
Departamento da Justiça dos EUA e FBI investigam TikTok por alegada vigilância a jornalistas