Mariana Mortágua foi constituída arguida no processo a propósito do dinheiro que recebeu enquanto era comentadora na SIC Notícias e, ao mesmo tempo, deputada em regime de exclusividade no Parlamento. É um passo formal, uma vez que houve um pedido de abertura da fase de instrução do processo — que já tinha sido arquivado pelo Ministério Público — e a deputada do Bloco de Esquerda torna-se assim automaticamente arguida.
Para o Bloco, a novidade não passa de “mais um dos episódios da perseguição política de que Mariana Mortágua está a ser alvo”, diz fonte oficial do partido ao Observador. O partido baseia-se também no percurso dos advogados envolvidos no processo, que “fala por si”: “O primeiro é um advogado condenado quatro vezes por enganar clientes, o segundo foi um dos primeiros candidatos do Chega nas últimas eleições legislativas”.
São referências a Luís Gonçalves Pereira, que foi candidato a deputado (em sexto lugar no círculo de Lisboa) pelo Chega, e Rui Santana, que foi notícia em dezembro por ter sido condenado quatro vezes por “enganar clientes”. Já as queixas partiram de dois empresários aparentemente sem ligações políticas, que discordaram da decisão do Ministério Público de arquivar o processo inicial e requereram a abertura da fase de instrução.
Neste segundo pedido, estes cidadãos referiam as suspeitas de crimes de peculato e recebimento indevido de vantagem e argumentavam que seria “altamente provável a futura condenação da denunciada”: “Os factos indiciados neste caso devem qualificar-se suficientes para justificarem pelo menos a realização de um julgamento”, citava a revista Sábado.
Em causa está o facto de Mariana Mortágua ter acumulado, durante cinco meses, a remuneração que recebia da SIC pelo trabalho como comentadora naquela televisão com o ordenado de deputada — função que exercia em regime de exclusividade (que o Bloco defende para todos os deputados), e que dá direito a um bónus salarial.
Na altura, a deputada justificou-se dizendo que não sabia que o entendimento da Assembleia da República — que até 2020 não tinha tomado uma posição contra a remuneração dos deputados-comentadores — tinha mudado e devolveu o dinheiro recebido durante esses cinco meses. Reconhecendo que existiu uma “irregularidade”, o Parlamento acabaria por considerar que, com a devolução do montante, Mortágua ficava ilibada.
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O Ministério Público decidiu depois, em dezembro, arquivar o processo na justiça, dizendo não haver factos a punir. O processo fica assim reaberto, com a expectativa do lado do Bloco de que corra rápido, uma vez que o debate instrutório arranca a 17 de abril.
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