Frederico Pinheiro, adjunto de João Galamba exonerado pelo ministro das Infraestruturas esta quarta-feira, coloca o seu antigo “patrão” em xeque, num comunicado divulgado à CNN Portugal, ao qual o Observador também teve entretanto acesso. O adjunto revela ter havido uma outra reunião, a 16 de janeiro, dois dias antes de Christine Ourmières-Widener ter ido ao parlamento, pela primeira vez, com a presença de João Galamba. E que terá sido mesmo o ministro a informar a então CEO da TAP que no dia seguinte (17 de janeiro) haveria uma reunião preparatória da audição (marcada para 18) entre o grupo parlamentar do PS (GPPS) e o Ministério das Infraestruturas.

“Entre outras interações, nessa reunião [de 16 de janeiro] o ministro das Infraestruturas [João Galamba] informa a CEO da TAP de que no dia seguinte se realizará uma reunião preparatória da audição parlamentar entre o GPPS e o Ministério das Infraestruturas”, lê-se no comunicado de Frederico Pinheiro, citado pela CNN Portugal.

A 16 de janeiro, conta este adjunto, “de manhã, realizou-se uma reunião preparatória na qual participaram o ministro das Infraestruturas, João Galamba, a então CEO da TAP, Christine Ourmières-Widener, Frederico Pinheiro, adjunto do ministro,  e Manuela Simões, diretora do departamento jurídico da TAP”, com o objetivo de “articular com a TAP a gestão da informação a ser efetuada pela CEO na audição parlamentar agendada para essa semana, dia 18 de janeiro”.

Foi depois dessa reunião de 16 de janeiro que a CEO da TAP terá comunicado a Frederico Pinheiro “a intenção de participar na reunião preparatória do dia seguinte, entre o Ministério das Infraestruturas e o GPPS”. Ainda nas palavras do adjunto exonerado, “de imediato Frederico Pinheiro informa por escrito o ministro das Infraestruturas da intenção da TAP participar na reunião, tendo João Galamba dado autorização”. Esta interação foi divulgada na quinta-feira pela SIC, mostrando mensagens de whatsapp do adjunto para o ministro no qual pede a autorização de Galamba para a participação da CEO na reunião, com o ministro a autorizar: “Pode”.

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Frederico Pinheiro diz agora que, “de imediato”, enviou um email “aos serviços do Ministério das Infraestruturas para enviarem os convites para a participação da CEO da TAP na reunião, a realizar no dia seguinte via plataforma Zoom”.

Essa reunião entre o PS, o gabinete das Infraestruturas e a ex-CEO foi revelada durante a comissão de inquérito à TAP, tendo nessa audição Christine informado da presença do deputado socialista Carlos Pereira na reunião. A ex-CEO indicou, na comissão de inquérito, alguns nomes que estavam na convocatória para a reunião, entre eles constava o de Frederico Pinheiro. A SIC, na quinta-feira, indiciou que este adjunto teria sido o coordenador dessa reunião preparatória, divulgando notas com perguntas e respostas que deveriam ser feitas pelos deputados socialistas nessa audição de janeiro.

Deputado Carlos Pereira fez perguntas à ex-CEO da TAP que constam nas notas de adjunto de Galamba reveladas pela SIC

Christine teve essa primeira audição no Parlamento, ainda no âmbito da comissão de Economia, em janeiro, mas teve de voltar a 4 de abril na comissão parlamentar de inquérito (CPI), e foi aí que se soube da reunião preparatória. Agora, Frederico Pinheiro indica, no comunicado citado pela CNN, que no dia seguinte à audição da CPI reuniu-se com o ministro João Galamba para “abordarmos o tema da reunião preparatória realizada a 17 de janeiro de 2023 entre o GPPS, o Ministério das Infraestruturas e a TAP”. Ainda nas palavras de Frederico Pinheiro, Galamba terá dito não ver problema na existência da reunião, reforçando ter sido o próprio ministro a revelar à CEO que a reunião de 17 de janeiro ia acontecer. E é aí que o adjunto diz a Galamba que tomou notas, no seu computador, das reuniões de janeiro. Garante que partilhou “oralmente os seus apontamentos”. É aqui que Frederico Pinheiro volta a colocar em xeque o ministro, já que afirma que ficou “claro que, naquela reunião de 17 de janeiro, tinham sido articuladas perguntas a serem efetuadas pelo GPPS e tinham sido referidas as respostas e a estratégia comunicacional da CEO da TAP”. E mais. Frederico Pinheiro diz em comunicado, não explicando, que “ficou indicado que, em caso de requerimento pela Comissão Parlamentar de Inquérito, as notas não seriam partilhadas por serem um documento informal”.

Galamba diz que TAP pediu para participar na reunião “secreta”. Ministro “não se opôs”

Só que, a 6 de abril, o gabinete de Galamba emite um comunicado a dizer que “o ministro das Infraestruturas foi informado de que a TAP, na tarde do dia 16 de janeiro, tinha transmitido o seu interesse em participar na reunião com o Grupo Parlamentar do PS”, e Galamba “não se opôs à participação da TAP na reunião, agendada pela Área Governativa dos Assuntos Parlamentares para o dia 17 de janeiro, tendo o seu Gabinete procedido em conformidade”. Mas acrescentava que “a reunião ocorreu, no dia 17 de janeiro, pelas 12 horas, sem a presença do ministro das Infraestruturas. Por parte da Área Governativa das Infraestruturas estiveram presentes o adjunto Dr. Frederico Pinheiro e a técnica especialista Eng.ª Cátia Rosas”.

Este comunicado de 6 de abril não teve, segundo agora diz Frederico Pinheiro, a sua concordância.

Já quase no final de abril, esta reunião voltou à comissão parlamentar de inquérito, depois de requerimentos dos partidos a pedir dados adicionais, que chegaram aos deputados. Sob reserva, no entanto, houve informação divulgada por alguns deputados e pela comunicação social, nomeadamente pela SIC e pela CNN. No âmbito desse pedido de informação, a 24 de abril, nas palavras ainda de Frederico Pinheiro, a técnica Cátia Rosas, do Ministério das Infraestruturas, ter-lhe-á indicado que o gabinete iria indicar à CPI que não existiam notas da reunião. O que terá tido a oposição do adjunto exonerado, na versão do próprio.

Segundo o comunicado, Frederico Pinheiro terá indicado a essa técnica que, “como sabia, tal [a não existência de notas] era falso e que, no seguimento do comunicado do Ministério das Infraestruturas de dia 6 de Abril, era provável que [o adjunto] fosse chamado à CPI”, e que se isso acontecesse teria de contradizer a informação do Ministério: “Seria obrigado a contradizer a informação que estava naquela resposta, com a qual eu discordava”. Frederico Pinheiro acrescenta que “a técnica Cátia Rosas disse que iria articular a resposta a enviar com o ministro das Infraestruturas e com a chefe do gabinete que estavam em Singapura”. No dia seguinte (25 de abril), João Galamba terá contactado Frederico Pinheiro por “mensagem e por telefone” e que terá deixado “claro que a decisão que tomaram de não revelar a existência das notas teria de ser revista. João Galamba teve uma reação irada”, conta o adjunto que diz que nesse dia enviou ao ministro “por email” as notas que tirou das reuniões de 16 e de 17 de Janeiro “e enviou igualmente uma sugestão de mudança na resposta a enviar à CPI. A sugestão assentava na divulgação das notas tiradas na reunião de 17 de janeiro”.

Foi no dia a seguir, segundo já foi noticiado, que o ministro das Infraestruturas João Galamba ligou ao adjunto Frederico Pinheiro “a comunicar que estava despedido”.

TAP: Adjunto de Galamba que esteve em reunião secreta exonerado por “comportamentos incompatíveis” com deveres

Numa versão contraditória divulgada pelo Jornal de Negócios Frederico Pinheiro terá negado a existência dessas notas durante dois meses e só perante a insistência por causa do pedido da CPI é que terá assumido que havia apontamentos das reuniões, mas terá levado 36 horas a encaminhá-los e terá estado 24 horas sem atender o telefone. É isto que o Negócios diz que levou à exoneração de Frederico Pinheiro por “comportamentos incompatíveis com os deveres e responsabilidades inerentes ao exercício das funções”, conforme avançou a Lusa.

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O Observador já contactou o Ministério das Infraestruturas para obter reação e mais esclarecimentos, mas até ao momento não teve respostas.