A previsão já era conhecida, mas os cientistas do serviço meteorológico dos Estados Unidos formalizaram esta semana a notícia: o planeta já se encontra sob o efeito do fenómeno oceano-atmosférico El Niño, um fenómeno cíclico responsável pelo aumento das temperaturas a nível global, pelo que nos próximos meses poderão ser batidos vários recordes de temperatura em diferentes pontos do mundo.

Num comunicado difundido online, o serviço meteorológico norte-americano confirma que “o El Niño esperado chegou”. A conclusão é dos cientistas que compõem o centro de previsão climática da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA, na sigla em inglês), que consideram que “as condições de El Niño estão presentes e espera-se que se intensifiquem gradualmente até ao inverno”.

“O El Niño é um fenómeno climático natural marcado por temperaturas da superfície oceânica superiores à média no Oceano Pacífico central e oriental, perto do equador, que ocorre em média a cada 2-7 anos”, sublinha a NOAA. “Os impactos do El Niño no clima estendem-se muito além do Oceano Pacífico.”

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Citada no mesmo comunicado, a climatologista Michelle L’Heureux, da NOAA, explica que, “dependendo da sua força, o El Niño pode causar diferentes impactos, como aumentar o risco de fortes chuvas e seca em diferentes lugares do mundo”. Além disso, “as alterações climáticas podem exacerbar ou mitigar certos impactos relacionados com o El Niño. Por exemplo, o El Niño pode levar a novos recordes de temperaturas, particularmente em zonas que já experienciam temperaturas acima da média durante o El Niño.”

No início de maio, a propósito das ondas de calor que se viviam em toda a Europa — e que levaram à quebra de recordes em Portugal —, o Observador já explicava como as previsões para 2023 e 2024 eram de temperaturas ainda mais elevadas, com possibilidade de novas quebras de recordes, devido ao fenómeno El Niño.

Os últimos três anos foram marcados pelo fenómeno La Niña, o padrão meteorológico oposto ao El Niño. Durante o período de La Niña, as temperaturas mais baixas no Oceano Pacífico tendem a baixar ligeiramente as temperaturas a nível global. Ora, se durante esse período já houve valores recorde, a expectativa durante o período El Niño — em que as temperaturas sobrem — é a de novos recordes de calor.

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O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) descreve o El Niño como “um fenómeno oceano-atmosférico que afeta o clima e regional e global, e que afeta a circulação geral da atmosfera”. “Está em causa um “aquecimento anómalo das águas superficiais do setor centro-leste do Oceano Pacífico, predominantemente na sua faixa equatorial”, que é “responsável por anos considerados secos ou muito secos”. Segundo o IPMA, o El Niño persiste durante seis a 15 meses, em média.

Em abril, as autoridades europeias já apontavam para breve a chegada de um novo período de El Niño. Carlo Buontempo, diretor do Serviço de Alterações Climáticas do projeto Copernicus, sublinhava que “o El Niño está habitualmente associado a temperaturas recorde a nível global” e, depois de três anos consecutivos em condições La Niña, a probabilidade era a do regresso do padrão oposto. “Se isto vai acontecer em 2023 ou 2024 ainda não sabemos, mas é, penso eu, mais provável do que improvável.”

“Se o El Niño de facto se desenvolver, há uma grande probabilidade de 2023 ser ainda mais quente do que 2016, considerando que o mundo continuou a aquecer à medida que os humanos continuam a queimar combustíveis fósseis”, destacava na altura Buontempo.

Por seu turno, as Nações Unidas tinham lançado o alerta de que havia 60% de probabilidade de o El Niño se desenvolver até ao final de julho e 80% até ao final de setembro — pelo que “o mundo deve preparar-se” para um período em que um novo El Niño “provavelmente levará a um novo pico no aquecimento global e aumentará as hipóteses de se baterem recordes de temperatura”.

A notícia difundida esta semana pelas autoridades norte-americanas mostra que o El Niño chegou ainda antes do previsto.