Esta quinta-feira realizou-se no Tribunal Superior Eleitoral do Brasil a terceira sessão para decidir se o ex-Presidente Jair Bolsonaro ficará inelegível nos próximos oito anos. Durante a tarde votaram três dos seis juízes do TSE, sendo que dois (Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares) declararam ser a favor do pedido de inelegibilidade que pode impedir o antigo chefe de Estado de se candidatar a eleições até 2030. Só o juiz Raul Araújo, o primeiro a votar nesta quinta-feira, se mostrou contra a inelegibilidade de Bolsonaro.

O processo contra Jair Bolsonaro teve origem numa ação movida pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) em agosto do ano passado, que alega que o ex-presidente abusou do poder político e dos meios de comunicação. Está em causa uma reunião que o então chefe de Estado brasileiro organizou, em plena campanha eleitoral, com embaixadores estrangeiros no Palácio da Alvorada no dia 18 de julho de 2022.

Numa longa intervenção em que defendeu a “autocontenção” e uma “intervenção mínima” da justiça eleitoral, Raul Araújo reconheceu o ato abusivo do ex-presidente durante a reunião com embaixadores, mas votou pela improcedência do pedido de inelegibilidade de Bolsonaro. Seguiram-se as declarações de Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares, que, assumindo uma postura semelhante, concluíram que existiu “abuso de poder”.

Aos votos de Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares soma-se o do juiz do TSE Benedito Gonçalves, relator da ação contra Jair Bolsonaro. Na quarta-feira o juiz já tinha votado pela inelegibilidade do ex-Presidente brasileiro.

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O julgamento desta quarta-feira foi suspenso a meio da tarde e será retomado na sexta-feira, às 12h (hora local), com Bolsonaro a um voto de ser considerado inelegível. Resta ainda ouvir três juízes: Cármen Lúcia, Kassio Nunes Marques e, por último, Alexandre de Moraes, presidente do TSE.

O cenário mais provável é, segundo a imprensa brasileira, que Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes votem a favor da inelegibilidade. A maior dúvida permanece quanto a Nunes Marques, que foi nomeado por Bolsonaro para o Supremo Tribunal Federal (STF) em 2020 e ainda poderá assumir-se contra a inelegibilidade.

Ainda antes de serem conhecidos todos os votos do dia, Bolsonaro pronunciava-se sobre o julgamento, que descreveu como injusto. “É uma injustiça comigo, meu Deus do céu. Me aponte algo de concreto que fiz contra a Democracia, joguei dentro das quatro linhas tempo todo”, afirmou em declarações aos jornalistas, antes de embarcar num voo de Brasília em direção ao Rio de Janeiro.

O atual Presidente brasileiro, Lula da Silva, também já reagiu ao julgamento. Numa entrevista à principal emissora de rádio do Rio Grande do Sul sugeriu que o seu antecessor é um “sabidinho” e um “cidadãozinho” que quis dar um golpe de Estado por não aceitar o resultado das eleições.

O que está em causa no julgamento de Bolsonaro?

Num encontro com embaixadores em julho do ano passado, uma reunião transmitida pela televisão estatal TV Brasil e nas redes sociais, o ex-Presidente Bolsonaro criticou o sistema eleitoral e alegou, sem apresentar provas, que era possível cometer fraude. Perante cerca de 40 embaixadores de vários países, atacou em particular o sistema das urnas eletrónicas — utilizadas desde 1996 e validadas por vários organismos internacionais –, o mesmo que o elegeu para vários mandatos enquanto deputado federal e para Presidente. Insinuou mesmo que era uma empresa que contava os votos das eleições e não o TSE, afirmando ainda que um hacker tinha tido acesso “a tudo dentro do TSE”. Estas declarações motivaram uma ação do PDT, que mais tarde teve o apoio do Ministério Público.

Na quarta-feira o juiz do TSE  Benedito Gonçalves e relator da ação contra Jair Bolsonaro votou pela inelegibilidade do ex-Presidente brasileiro para os próximos oito anos. Num discurso com palavras duras, Benedito Gonçalves declarou que Bolsonaro cometeu abuso de poder e político e uso indevido dos meios de comunicação. Na mesma sessão, ilibou Walter Braga Netto, candidato de Bolsonaro a vice-presidente, por “não ter sido demonstrada sua responsabilidade na acusação”. Esta ação foi apoiada esta quinta-feira pelos juízes que já votaram.

“Procurou o descrédito internacional e proferiu “mentiras atrozes”. Juiz relator vota pela inelegibilidade por oito anos de Jair Bolsonaro

“Não é possível fechar os olhos para os efeitos antidemocráticos de discursos violentos e de mentiras que colocam em xeque a credibilidade da justiça eleitoral”, sublinhou o juíz relator, referindo-se à postura de Bolsonaro no encontro com os embaixadores. “A reunião teve finalidade eleitoral, procurando influenciar o eleitorado e a opinião pública nacional e internacional com uso da estrutura pública e das prerrogativas do cargo de Presidente da República”, acrescentou.

Além deste processo, o TSE também tem, segundo o jornal Globo, outras 15 ações contra o ex-presidente, que questionam condutas que também podem levá-lo à inelegibilidade.