As buscas judiciais realizadas em 20 locais, entre os quais a casa de Rui Rio e as sedes nacionais do PSD e da JSD, no âmbito da investigação ao financiamento do partido, não foram executadas ao mesmo tempo.

Ao contrário do que é normal em buscas judiciais em diferentes moradas — em que é obrigatório a execução dos mandados judiciais de forma coordenada para assegurar a eficiência do efeito surpresa —, não foi possível realizar a busca à casa de Rui Rio na hora estabelecida. Tudo porque o ex-líder do PSD não abriu a porta aos inspetores da Polícia Judiciária (PJ) devidamente mandatados para entrar na sua casa e recolher prova indiciária com interesse para os autos.

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O Observador tentou contactar Rui Rio, enviando perguntas por escrito via WhatsApp para o número do ex-líder do PSD, para tentar obter um esclarecimento. Mas não recebeu nenhuma resposta até ao momento da publicação deste artigo. O Observador falou também com a ex-assessora de Rui Rio, Florbela Guedes, que primeiro aceitou estabelecer contacto com o antigo líder do PSD, mas depois recuou. (Ver respostas de Florbela Guedes no final do artigo.)

PJ só conseguiu entrar às 10h. Rio não esclarece por que razão não abriu a porta

Tudo começou às 7h da manhã, como é hábito em operações desta envergadura. Tendo em conta que a lei proíbe buscas domiciliárias durante a noite (a não ser em flagrante delito), é às 7h (depois de o sol nascer) que as buscas judiciais costumam começar.

Foi precisamente isso que ficou delineado para os 20 alvos para os quais existiam mandados judiciais. O plano de operações foi executado na casa de Florbela Guedes, a assessora mais antiga de Rui Rio, que faz parte dos funcionários do PSD que eram pagos pelo Parlamento, e de mais 18 alvos.

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Contudo, os inspetores da PJ que se dirigiram à casa de Rui Rio para realizar a busca autorizada pelo Tribunal Central de Instrução Criminal depararam-se com um problema intransponível: o ex-líder do PSD não abriu a porta.

O Observador não conseguiu apurar as razões de Rio — e tentou fazê-lo junto do antigo líder do PSD e da sua ex-assessora Florbela Guedes. Certo é que os inspetores da PJ só conseguiram entrar na casa cerca das 10h de manhã. Ou seja, três horas depois de as buscas se terem iniciado nas casas dos restantes alvos das buscas.

DIAP de Lisboa vai investigar outros partidos? E outros crimes?

Tal como Rui Rio afirmou em entrevista à SIC, a prática que a sua liderança seguiu de financiar o pagamento dos salários dos funcionários do PSD com a subvenção que o grupo parlamentar social-democrata recebe do Parlamento é “transversal a todos os partidos desde sempre”.

Declarações de vários dirigentes do PS, como o secretário-geral adjunto João Torres, indiciam que os socialistas têm tido a mesma prática. Existindo ainda a informação de que o mesmo acontece ou aconteceu com outros partidos com assento parlamentar.

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Existindo uma avaliação do Ministério Público de que essa prática merece um escrutínio criminal, tais declarações poderiam constituir a chamada notícia crime, fazendo com que teoricamente a investigação fosse alargada a todos os partidos que tenham práticas idênticas.

Ao que o Observador apurou, essa hipótese está a ser avaliada pelo DIAP de Lisboa, até porque os crimes que estão em causa (peculato e abuso de poder) são públicos e não dependem de queixa.

O possível alargamento destas alegadas condutas a outra configuração criminal é algo que também está a ser analisado com o seguinte contexto:

  • A possível imputação do crime de burla, visto que o Parlamento poderá ter sido enganado;
  • Ou do crime de falsificação de documento, já que a lista de assessores parlamentares pode não corresponder à verdade porque incluem funcionários que estão na sede nacional ou até mesmo na sede distrital do Porto, como acontece com Luciano Gomes e Maria Emília Galego.

Esta é uma avaliação que ainda está a ser feita, mas o mais provável é que a investigação se continue a concentrar no PSD e na direção de Rui Rio, com a configuração jurídica que já foi definida. A não ser que surjam denúncias concretas contra outros partidos.

As respostas de Florbela Guedes, ex-assessora de Rui Rio

Além de ter tentado contactar Rui Rio para o número de telemóvel conhecido do ex-líder do PSD, o Observador falou igualmente com a ex-assessora Florbela Guedes — que foi também alvo de buscas judiciais autorizadas pelo Tribunal Central de Instrução Criminal.

Num primeiro momento, a ex-assessora explicou por telefone que, ao contrário da própria, Rui Rio tinha optado por não pedir uma segunda via do cartão SIM do telemóvel que lhe foi apreendido pela PJ. Por isso, Florbela Guedes manifestou-se disponível para transmitir as perguntas do Observador a Rui Rio.

59 minutos depois de o Observador enviar via WhatsApp para Florbela Guedes as perguntas que eram dirigidas a Rui Rio, recebeu a seguinte resposta da ex-assessora:

A minha resposta ,em “on “, enquanto ex -assessora do Dr. Rui Rio é a seguinte: “Quem foi capaz de escrever o artigo publicado hoje no Observador, não merece qualquer respeito nem consideração. Deveria ter pelo menos a decência de nem sequer colocar uma questão tão idiota e sem nenhuma utilidade.”

Além de ter informado que as perguntas tinham sido dirigidas a Rui Rio, o Observador questionou Florbela Guedes sobre se a citação que tinha enviado era atribuível ao ex-líder do PSD. “Não. Depois de ler o seu artigo, não o contactei por razões óbvias”, foi a resposta da ex-assessora.