Foi na primeira conferência de imprensa da Jornada Mundial da Juventude que o cardeal-patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, fez uma viagem ao passado para deixar uma certeza para o futuro: a geração que se está a criar com o evento que decorre esta semana, a que “já se começa a chamar ‘geração 2023′”, marcará “necessariamente” a sociedade portuguesa.

No centro de imprensa no Parque Eduardo VII, em Lisboa, o cardeal-patriarca adiantou que esta geração é constituída pelas dezenas de milhares de jovens que trabalharam ao longo dos últimos três anos para realizar aquele que é considerado o maior evento da Igreja Católica. “Ganharam uma maneira de estar na sociedade, uma maneira de estar na vida também igualmente comprometida” e com projeção para “o bem de todos, transmitindo mensagens boas porque são mensagens de esperança”, afirmou.

Manuel Clemente destacou os Dias nas Dioceses e a peregrinação dos símbolos da jornada, iniciativas que antecederam a semana da JMJ em Lisboa, afirmando que “foi algo muito motivador” e “algo de muito surpreendente”, com a adesão dos jovens das dioceses, mas também das pessoas em geral. “A passagem dos símbolos era qualquer coisa de efusivo e contagiante”, disse, acrescentando que, “neste momento, a jornada está a acontecer como produto de tudo isto”.

Através de uma viagem ao passado, Manuel Clemente explicou aos jornalistas que há vários anos que o episcopado português falava sobre o quão “bom seria organizar a Jornada Mundial da Juventude”. A ideia começou a avançar em 2017, ano de que “data precisamente” uma carta que enviou ao Papa Francisco a propor “Lisboa para organizar a JMJ”.

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A Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023 é sobretudo, e esta é a ideia que eu queria salientar, uma obra da juventude portuguesa”, sublinhou.

Patriarca de Lisboa reafirma empenho total da Igreja no combate aos abusos

Ainda em conferência de imprensa, em declarações aos jornalistas, Manuel Clemente assegurou que existe um “empenho total” para resolver a questão dos abusos sexuais de menores. “Nesse sentido, todas as dioceses portuguesas já estão a trabalhar há anos com a constituição e funcionamento das suas comissões diocesanas, que são depois também ajudadas por uma coordenação nacional”, afirmou.

Naquelas comissões, “participam pessoas muito profissionalizadas, desde elementos ligados à polícia, magistratura, psicologia e à psiquiatria”, na sua maioria leigos, “que estão lá pela sua competência profissional”. O patriarca de Lisboa destacou ainda o protocolo estabelecido com a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), a criação recente do Grupo Vita, coordenado pela psicóloga Rute Agulhas, e que veio substituir, de algum modo, a comissão independente para o estudo dos abusos sexuais na Igreja Católica em Portugal, que foi liderada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht.

“Em termos de instalação de uma rede de proteção e de prevenção de acontecimentos desse género estamos a trabalhar e continuaremos a trabalhar”, afirmou Manuel Clemente. Relativamente às manifestações de protesto contra a Igreja devido aos casos de abuso, disse: “Vivemos numa sociedade democrática e livre. O direito à manifestação é público. Da nossa parte, o compromisso é total em resolver este problema”.

Já sobre a possibilidade de as vítimas de abuso sexual no seio da Igreja serem lembrados nesta JMJ, o cardeal confirmou que o Papa Francisco se encontrará com vítimas, mas não revelou quando, nem onde, assegurando que também desconhecia esses pormenores até ao momento.

Patriarca de Lisboa sublinha caráter intercultural da Igreja em Portugal

Após falar sobre as vítimas de abusos sexuais, Manuel Clemente sublinhou o caráter intercultural da Igreja Católica em Portugal, rejeitando que seja “uma igreja branca, racista ou negra”. O cardeal-patriarca de Lisboa disse que na área do Patriarcado “a convivência inter-racial e intercultural é muito boa”, até pela existência de paróquias, sobretudo “à volta da cidade de Lisboa, em que grande parte dos participantes ativos na vida paroquial, catequistas, grupos de jovens e por aí fora, são exatamente pessoas de origem africana”.

É habitual nós dirigimo-nos a essas paróquias, por exemplo, para celebrar o sacramento do Crisma e metade ou 2/3 dos crismandos são pessoas de origem africana e algumas, aliás, já na terceira e até mais gerações”, acrescentou.

Para Manuel Clemente, “no aspeto inter-racial e intercultural, mesmo inter-religioso”, a Igreja em Portugal está bem. “Ou seja, estamos no bom caminho para que haja uma sociedade intercultural mais do que multicultural, cada um no seu sítio, cada um no seu ciclo, a darem-se só uns com os outros, mas intercultural, em que partilhem essas diversas culturas e proveniências”, disse.

“Nós temos gente de muitas proveniências rácicas e culturais, é assim. Estamos bem”, acrescentou Manuel Clemente. Na ocasião, o cardeal-patriarca de Lisboa referiu ainda um novo estudo sobre a situação da Igreja em Portugal e os jovens, que aponta para que “sete em cada 10 jovens portugueses declaram-se católicos”.

“Neste momento, em Portugal, sete em cada 10 jovens portugueses declaram-se católicos e já sabemos que esta declaração de católicos, e mesmo a declaração de não católicos, depois convive com os diversos níveis de incidência da mensagem cristã”, sublinhou, aludindo aos mais recentes dados da Pordata.