A dias de cumprir oito anos como primeiro-ministro, António Costa apresentou a sua demissão ao Presidente da República que a aceitou. A decisão foi tomada depois de o primeiro-ministro ter tido conhecimento de um processo-crime instaurado contra si e a decorrer no Supremo Tribunal de Justiça, numa investigação relacionada com a exploração do lítio e do hidrogénio. Na declaração em que apresentou a demissão repetiu várias vezes que foi “surpreendido” com esta informação “oficialmente confirmada pelo gabinete de imprensa da Procuradoria-Geral da República” — referência que fez mais do que uma vez ao longo da intervenção.
Na hora da saída, o primeiro-ministro recorreu a uma fórmula histórica para declarar: “Obviamente apresentei a minha demissão ao Presidente da República”. “A dignidade das funções de primeiro-ministro não é compatível com qualquer suspeição sobre a sua integridade, boa conduta e menos ainda com a suspeita de prática de qualquer acto criminal”, justificou ainda que tenha garantido: “Não me pesa na consciência a prática de qualquer ato ilícito ou censurável”.
No passado, o primeiro-ministro tinha traçado uma linha vermelha mais recuada para que um governante tivesse de sair quando envolvido em casos judiciais. Quando questionado por que motivo agora se demitiu se ainda não há qualquer acusações, Costa disse que “há uma distinção entre as funções de primeiro-ministro e outras funções de membros do Governo”. “O facto de ser arguido não é sequer motivo para determinar a demissão, já que é uma estatuto que reforça as garantias de defesa de um cidadão, mas a função de primeiro-ministro”, argumentou a este propósito.
Quanto ao futuro político, primeiro Costa começou por ser pouco claro, sem responder diretamente, dizendo estar a aguardar pelos próximos passos do Presidente da República. Mas de seguida acabou por declarar sem deixar dúvidas: “Não, não me vou recandidatar ao cargo de primeiro-ministro”. “Esta é uma etapa da vida que se encerra com a cabeça erguida, a consciência tranquila e a mesma determinação de servir Portugal e os portugueses”, afirmou acrescentando ainda que os processos-crime “raramente são rápidos e não ficaria a aguardar a conclusão para tirar ilações”.
Durante o dia falou duas vezes com o Presidente da República, a primeira logo depois de conhecidas as primeiras notícias sobre a detenção do seu chefe de gabinete e do seu conselheiro e amigo Lacerda Machado e também da constituição de arguidos de governantes e ex-governantes, também no âmbito dos negócios do lítio e do hidrogénio. A segunda depois de conhecida a nota da PGR com as informações sobre as buscas e detenções matinais, bem como o inquérito instaurado no Supremo.
Sobre esse caso disse ainda não saber do que se trata: “A nota de imprensa [da PGR] não explicita a que actos, que momentos e que processos é que se me referem”. Sobre isso garantiu apenas estar “totalmente disponível para colaborar com a Justiça”.
António Costa é suspeito e será investigado no Supremo Tribunal de Justiça