Marcelo vai dissolver o Parlamento como queria, mas não com todo o apoio que pensou que podia ter. O Presidente da República fez as contas e esperava que o Conselho de Estado desse parecer favorável à dissolução, mas a ausência de Miguel Albuquerque ditou um empate entre conselheiros de Estado: 8-8. Sem a presença de António Damásio, o voto do líder do PSD/M seria suficiente para aquele órgão validar (de forma não vinculativa) a dissolução , mas Albuquerque, que se encontra a representar a Madeira nas Ilhas Canárias, não se ligou à reunião.

À direita conta-se que o líder madeirense terá tido um problema técnico que não permitiu a ligação à reunião que acontecia no Palácio de Belém, em Lisboa. Já à esquerda especula-se que a sua ausência pode ter sido estratégica. A verdade é que Miguel Albuquerque não tem maioria na Região Autónoma e acabou por evitar ter de tomar uma posição que vai contra o cumprimento de mandatos e a favor de antecipação de eleições.

O Presidente falou, na comunicação ao País, sobre o “empate” no Conselho de Estado (8 contra 8), que considerou uma posição “não favorável à dissolução”. Os conselheiros da área política do PS votaram contra a dissolução: o primeiro-ministro António Costa, o presidente do PS, Carlos César, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, o antigo candidato presidencial António Sampaio da Nóvoa e o histórico socialista Manuel Alegre (ambos nomeados pelo PS).

Fora deste grupo mais óbvio, também votaram contra a “bomba atómica” o antigo Presidente da República António Ramalho Eanes, o presidente do Tribunal Constitucional, José João Abrantes (que foi indicado para o cargo de juiz conselheiro do Constitucional pelo PS e que embora tenha saído mais cedo deixou o seu voto contra para ser contabilizado no final) e ainda a escritora Lídia Jorge (que entrou por videoconferência).

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Já a favor da dissolução de eleições votaram todos os que foram líderes ou ex-governantes do PSD: o ex-líder Luís Marques Mendes, o ex-primeiro-ministro Francisco Pinto Balsemão, o ex-Presidente Cavaco Silva, a ex-ministra Leonor Beleza e o ex-ministro Miguel Cadilhe.  O ex-dirigente do CDS, António Lobo Xavier, também votou a favor da dissolução, tal como o líder do Governo regional dos Açores, José Manuel Bolieiro. A provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, foi o oitavo voto a favor. Ou seja: Miguel Alburquerque teria dado o 9-8 a favor de Marcelo, mas não compareceu.

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Numa reunião serena, António Costa, Augusto Santos Silva e Carlos César defenderam, sem surpresa, o cumprimento do mandato com um novo Governo socialista (soube-se mais tarde que liderado por Mário Centeno — inicialmente o PS tinha alinhado o nome de Augusto Santos Silva como o “consensual”, segundo revelou ao Observador fonte da direção do partido). Os socialistas apresentaram como argumentos a favor da sua solução a “estabilidade governativa” e a difícil “conjuntura internacional”.

“Os argumentos foram parecidos aos que o PSD e CDS deram em 2004 para continuar no Governo”, segundo detalhou ao Observador uma fonte presente na reunião. O presidente do PS acrescentou, no entanto, um outro argumento para travar eleições antecipadas: os riscos que isso acarretará para o que espera ser o crescimento da extrema-direita, ou seja, do Chega nestas eleições.

Apesar de o Conselho de Estado não ter votado a favor da dissolução, o parecer não é vinculativo. Ao contrário da realização da reunião, obrigatória para que o Presidente possa dissolver a Assembleia da República. No fim da reunião, o Presidente da República informou os conselheiros sobre o que iria fazer: convocar eleições para 10 de março. Pouco tempo depois, à entrada de uma reunião do PS, António Costa haveria de colocar publicamente o ónus da decisão em Marcelo, dizendo que,  “obviamente, o PS está sempre pronto para eleições e respeita a decisão do Presidente da República. Foi uma escolha do próprio, visto que o Conselho de Estado não se pronunciou relativamente a essa proposta”.