A Efacec voltou ao Parlamento. Depois de uma ameaça de poder vir a ser tema para uma nova comissão parlamentar de inquérito — propostas que entretanto caíram com o anúncio de que o Parlamento vai ser dissolvido (o Chega reiterou a pretensão de fazer uma comissão na nova legislatura) –, António Costa Silva, ministro da Economia, foi chamado à Assembleia da República para explicar o negócio feito com a Mutares, concluído no final do mês de outubro e anunciado pelo Governo, em conferência de imprensa, no feriado de 1 de novembro.

Estado sai da Efacec, Mutares entra numa empresa “sem espinhas”. A que preço?

Agora, perto do  Natal, Costa Silva continua a defender a solução encontrada como a melhor que podia ter sido tomada. “Foi a melhor solução encontrada. Não estou a dizer que temos um cenário cor de rosa. O investimento que o Estado fez no fecho não é um depósito a prazo, tem riscos e selecionamos a melhor oferta, a da Mutares”, garantiu ao PSD, já depois de ter tido palavras mais crispadas em respostas ao deputado da Iniciativa Liberal, Carlos Guimarães Pinto. Costa Silva deu vários exemplos na audição no Parlamento para argumentar que o Estado fez um bom negócio nomeadamente o mecanismo de partilha, as garantias que a Mutares prestou (mais do que previa a oferta inicial) e ainda o facto de o Estado ter uma palavra a dizer se a Mutares quiser vender antes do período de impedimento de venda (de três anos, conforme já tinha sido indicado na altura da venda). “Houve, do nosso ponto de vista, melhoria entre a oferta inicial e a final”, garantiu Costa Silva.

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“O Estado salvaguardou o seu poder negocial. Fizemos uma negociação multidimensional complexa, integrando o novo comprador, os antigos acionistas, os obrigacionistas, os bancos. E é raro ver que obrigacionistas e bancos reconhecem perdas. Para si não vale nada”, declarou já depois de ter atirado a Carlos Guimarães Pinto que as análises feitas pelo deputado liberal são “muito débeis, frágeis, e tomando um ou dois pontos extrapola tudo o resto”, acusando-o de “visão apocalíptica na sua realidade”. “Tudo na sua análise entronca no seguinte: ‘diz que a Efacec podia ter ido à falência’”, concluindo que no “seu credo neoliberal, queria mandar 2000 trabalhadores para a falência”. O que, mais tarde, levou Carlos Guimarães Pinto a citar o IAPMEI sobre processo de insolvência – “insolvency for dummies” disse — que é um processo de caráter urgente para levar à recuperação da empresa. Costa Silva acabou a responder que “entrar em insolvência e termos PER era tudo o que não queríamos, porque a empresa não consegue operar, fica cerceada em termos de mercado. Não seria uma solução”.

Para Costa Silva, a empresa perdeu valor mas “conservou capacidade”, dando o que diz ser exemplos de que a empresa continua a ganhar negócios e continua a vender. Carlos Guimarães Pinto confrontou o ministro da Economia com o que disse ter sido uma prática da Efacec de escolher fornecedores para pagar e outros que ficaram sem receber, quando a empresa era do Estado. E, por isso, perguntou quem no Estado controlou os 10 milhões de euros públicos que eram colocados na Efacec todos os meses. “Os detalhes da vida da empresa são da vida da empresa, não têm significado nenhum face ao contexto”, justificando que uma “empresa em dificuldades tem de escolher fornecedores”.

Segundo dados de Costa Silva, o Estado pode vir a recuperar o dinheiro injetado na empresa. Segundo o acordo com a Mutares, o Estado ficará com dois terços da venda futura, mas o ministro deu outros números que vão em crescendo. Se for vendida por 220 milhões, o Estado consegue 154 milhões; se for vendida por 310 milhões, recupera 303 milhões; se for vendida por 400 milhões, recupera 350 milhões. Um mecanismo de participação em cascata que foi aceite pela Comissão Europeia e que, segundo Costa Silva, resultou numa melhoria no negócio final face à proposta inicial. “Se não reconhece competência à DGCom, não reconhece competência a ninguém”, atirou ainda a Carlos Guimarães Pinto.

Costa Silva garante, por outro lado, que o “mecanismo de cascata estimula o comprador a investir na empresa”, e acredita que a médio prazo a Efacec vai contratar mais pessoas, disse ao PCP, que fez saber que ainda aguarda os documentos sobre a operação pedidos ao Governo. Costa Silva garante que a Parpública e o Ministério das Finanças estão a verificar os documentos, até porque podem ter elementos confidenciais. “A pior coisa era depois criarmos situações em que o próprio negócio pode ser afetado”, disse Costa Silva, para explicar que há elementos sensíveis nos documentos que têm de ser salvaguardados.

“Queremos os documentos”, salientou Bruno Dias, do PCP, recordando que no âmbito da comissão de inquérito sobre a TAP “ficámos a saber, 10 anos depois, o que devíamos ter sabido na altura”, disse a propósito da privatização concretizada em 2015 pelo governo PSD/CDS. “Não era bom para o senhor ministro ser olhado [no futuro] como nós agora olhamos para Pires de Lima”, disse Bruno Dias.