Espanha começou a exigir vistos aos quenianos só para fazerem escala nos seus aeroportos e estuda estender a regra a outros países africanos devido ao aumento exponencial de pedidos de asilo em Madrid desde agosto de 2023.
O visto para pessoas do Quénia é exigido desde o fim de semana passado e o ministro da Administração Interna, Fernando Grande-Marlaska, admitiu quinta-feira que está a ser estudada a aplicação da mesma regra a cidadãos do Senegal.
“Evidentemente, dentro do quadro da política da União Europeia em matéria de proteção internacional”, acrescentou, em declarações a jornalistas em Bruxelas, depois de, no final da semana passada, ter já admitido a possibilidade de o visto vir a ser pedido a várias nacionalidades.
Segundo a organização não-governamental (ONG) Comissão Espanhola de Ajuda ao Refugiado e sindicatos da polícia, há desde o verão de 2023 um número inusualmente alto de pedidos de asilo no aeroporto de Madrid (Barajas) por pessoas oriundas, na maioria, de países africanos,
Esta situação, adiantam, provoca congestionamento nos serviços de atendimento, com os requerentes mantidos durante dias e até semanas em salas sobrelotadas e sem condições mínimas, incluindo de higiene.
O ministro Grande-Marlaska falou numa situação “extraordinária, excecional, de petições de proteção internacional no aeroporto de Barajas”, que porém está sob controlo, tendo o governo reforçado os meios humanos de resposta e aumentado o espaço para acolher e atender os requerentes de asilo.
Os sindicatos da polícia dizem tratar-se de pessoas que chegaram a Madrid em voos internacionais, com escala em Espanha, e aproveitam o momento de trânsito para solicitar asilo, considerando estar em causa uma prática, na generalidade, fraudulenta.
No caso do Quénia, os sindicatos dizem ter sido detetados muitos casos de pessoas que viajaram desde aquele país com passaportes falsos. Quanto ao Senegal, afirmam que tem havido um pico de pessoas que compram voos com destino ao Brasil com escala em Madrid, o que dispensa burocracias especiais, por não precisarem de visto para entrar em território brasileiro.
A Comissão Espanhola de Ajuda ao Refugiado (CEAR) revelou, num comunicado divulgado na terça-feira, que cerca de 390 pessoas aguardavam em salas no aeroporto de Madrid destinadas a requerentes de asilo, salas essas que têm capacidade máxima para 180.
Os sindicatos dizem que as nacionalidades mais frequentes, nos últimos dias, dos solicitantes de asilo em Barajas são Senegal, Marrocos, Mali e Guiné-Conacri.
Segundo a Comissão Espanhola de Ajuda ao Refugiado, o tempo de espera para formalizar um pedido de asilo em Barajas chegou a ser de 18 dias em dezembro e, embora a situação tenha melhorado e esteja nos oito dias, é um tempo que, tal como as condições em que esperam os requerentes, viola a legislação espanhola e europeia sobre pessoas que pedem proteção internacional.
“A sobrelotação e a insalubridade atingiram pontos críticos”, escreveu a ONG no comunicado de terça-feira, o mesmo dia em que a Cruz Vermelha Espanhola anunciou que deixava temporariamente de prestar assistência nestes espaços do aeroporto de Madrid, até haver “condições dignas”.
Os longos tempos de espera, denunciou a Comissão Espanhola de Ajuda ao Refugiado, dificultam a deteção de necessidades específicas, como é o caso dos menores, das vítimas de tráfico humano, de doentes ou de pessoas com deficiência, impedindo que tenham o tratamento e atenção diferenciados a que têm direito segundo as leis espanholas e os tratados europeus.
As diretivas europeias, lembrou a ONG, estabelecem um prazo de entre três e dez dias para a formalização dos pedidos de asilo, assim como a garantia de “condições materiais de acolhimento dignas”, “proteção da saúde física e mental”, “avaliação pronta das necessidades específicas de acolhimento” e “garantias procedimentais especiais para pessoas em situação de vulnerabilidade”.
A Comissão Espanhola de Ajuda ao Refugiado pediu, neste contexto, como também já fez a Provedoria de Justiça espanhola, que Espanha autorize a entrada excecional por razões humanitárias das pessoas com “necessidades específicas”, atribuindo-lhes uma data e local posterior para a formalização do pedido de asilo.
A ONG pediu também que Espanha acabe com o visto que já está a pedir às pessoas oriundas do Quénia, por considerar que é “um obstáculo que dificulta ainda mais o acesso à proteção internacional”.