Gerir um grupo automóvel com várias marcas e centenas de modelos é um exercício de equilíbrio e de estratégia muito complexo, especialmente quando a operação está dispersa por vários continentes e numa época em que os motores eléctricos estão a assumir o espaço até aqui ocupado pelos motores a combustão. Daí que os CEO mais competentes e criativos valham ouro, sobretudo pelo que conseguem fazer ganhar cada um dos seus accionistas. E o português Carlos Tavares, que está à frente da Stellantis, é um dos CEO mais bem pagos do mercado. Tanto mais que tem realizado um dos trabalhos mais difíceis da indústria.
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A Stellantis, com 14 marcas sob a sua alçada — entre norte-americanas e europeias, sendo estas últimas divididas por França, Itália e Alemanha —, é um colosso com tantos egos e interesses em disputa que só um mago conseguiria conduzir tudo a bom porto. Os accionistas confiaram em Tavares para tirar este coelho da cartola e, a avaliar pelos resultados de 2023, fizeram bem, pois a facturação subiu 6% em relação a 2022, as vendas cresceram 7% e os lucros 11%, atingindo no último ano um total de 18,6 mil milhões de euros.
Como resultado do desempenho do grupo, o CEO português recebeu pagamentos num total de 36,5 milhões de euros, entre salários e bónus. Para quem esteja por fora deste negócio, este prémio pode parecer exagerado, especialmente porque representa um incremento de 56% face ao rendimento de 2022. Mas uma análise da evolução do valor das acções durante os 12 meses de 2023 permite constatar que foram transaccionadas a 13,26€ a 30 de Dezembro de 2022, para um ano depois valerem 21,15€. Isto representa uma valorização de 59,5%, o que na prática é tudo o que verdadeiramente interessa aos accionistas.
Os principais accionistas da Stellantis, nomeadamente a família Agnelli que possui 14,3% (antes da fusão com a PSA controlava a italiana Fiat e a norte-americana Chrysler, de que resultou a FCA) e a família Peugeot que controla 7%, viram igualmente o seu valor aumentar 59,5%. Significa isto que, graças ao bom desempenho de Tavares, viram as suas fortunas crescer, respectivamente, 4.520 e 2.220 milhões de euros — substancialmente mais do que Tavares e confiando apenas no gestor português.
O sindicato do sector automóvel United Auto Workers (UAW) encara a situação sob outro prisma, acusando os CEO americanos de ganharem muito mais do que os seus colegas europeus e, sobretudo, de receberem 518 vezes mais do que a média dos empregados do grupo. De acordo com o vídeo produzido pelo UAW, os CEO europeus de marcas como a VW, BMW e Mercedes receberam 4,8, 7,5 e 6,4 milhões de dólares, respectivamente. Valores em linha com os vencimentos dos seus colegas nipónicos, que foram de 2,4 milhões no caso da Honda, 4,6 milhões no caso da Nissan e 6,9 milhões para a Toyota. Enquanto isto, os construtores norte-americanos Ford, General Motors e Stellantis (esta apenas parcialmente) pagam aos seus CEO, respectivamente, 21, 25 e 29 milhões de dólares. Estes montantes correspondem apenas a salários, a que depois há que somar os prémios por desempenho, caso existam.