O gestor português Mário Leite da Silva, um dos acusados pela justiça angolana no caso da gestão na petrolífera Sonangol, pediu ao Supremo Tribunal de Angola a transferência do processo judicial para a justiça portuguesa.

Num comunicado divulgado pelo seu advogado, o gestor português, que trabalhou com Isabel dos Santos, filha do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos e também visada no caso Sonangol, usa o precedente que envolveu o antigo vice-presidente de Angola, Manuel Vicente, para pedir o princípio de reciprocidade.

“A minha defesa não conflitua com a de ninguém. A Engenheira Isabel dos Santos, que é angolana, defender-se-á em Angola. Eu, que sou português, pretendo defender-me em Portugal“, considera Mário Leite da Silva no comunicado.

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Na nota, a que a Lusa teve acesso, o gestor pede que Angola, “reconhecendo a soberania portuguesa tal como Portugal reconheceu a soberania angolana no processo de Manuel Vicente”, aceite a transferência da sua parte no processo para Portugal.

“Já há um precedente, apenas peço tratamento igual”, sublinha.

Em causa está o processo-crime em que é acusada Isabel dos Santos (por 12 crimes) e outros gestores, por atos praticados no âmbito do projeto de reestruturação da Sonangol, entre os anos de 2016 e 2017.

Segundo o despacho de acusação a que a Lusa teve acesso, Isabel dos Santos foi acusada de peculato, burla qualificada, abuso de poder, abuso de confiança, falsificação de documento, associação criminosa, participação económica em negócio, tráfico de influências, fraude fiscal, fraude fiscal qualificada (um crime cada) e de dois crimes de branqueamento de capitais.

Além da filha do ex-Presidente angolano, são acusados Paula Oliveira, amiga e sócia (seis crimes), o seu antigo gestor e amigo Mário Leite da Silva (seis crimes), o seu ex-administrador financeiro na Sonangol Sarju Raikundalia (nove crimes) e a consultora PricewaterhouseCoopers (PwC) (dois crimes).

No comunicado divulgado esta sexta-feira, Mário Leite da Silva lembra que no caso de Manuel Vicente “houve outras pessoas implicadas e que isso “não só não impediu a transferência do processo para Angola, como permitiu o julgamento de arguidos portugueses em Portugal”.

“Ao longo dos últimos quatros anos, Mário Leite da Silva apresentou vários requerimentos – aos quais juntou vasta documentação – e nunca obteve qualquer resposta das autoridades angolanas”, recorda a nota.

O gestor diz igualmente ponderar a hipótese de requerer a fase de instrução em Portugal.

O requerimento apresentado às autoridades angolanas — acrescenta — “foi enviado para conhecimento da Procuradora Geral da República de Portugal, uma vez que foi pública a solicitação, por esta entidade, às autoridades judiciárias angolanas, da certidão da acusação proferida”.

Segundo a acusação do caso Sonangol, datado de 11 de janeiro, os arguidos causaram ao Estado angolano um prejuízo superior a 208 milhões de dólares (190 milhões de euros), repartidos entre 176 milhões de dólares (169 milhões de euros), 39 milhões de euros e cerca de 94 milhões de kwanzas (104 mil euros) envolvendo salários indevidamente pagos, vendas com prejuízo, fraude fiscal e pagamentos fraudulentos a empresas.

O Ministério Público angolano aponta várias irregularidades, entre as quais um esquema de gestão paralela e contratos celebrados com empresas a ligadas a Isabel dos Santos, através das quais foram feitos pagamentos ilegais.

Para a acusação, no âmbito da sua gestão e aproveitando a condição de filha do Presidente (falecido em 2022), Isabel dos Santos “devidamente concertada com os arguidos Mário Silva, Sarju Raikundalia e Paula Oliveira, de forma meticulosa, criou um plano para defraudar vigorosamente o Estado angolano, persuadindo o Conselho de Administração a tomar decisões que os beneficiaram”.

Na nota Mário Leite da Silva diz que ainda não foi pessoalmente notificado da acusação.