André Ventura é o primeiro líder político em Portugal cuja voz foi gerada por inteligência artificial (IA) num vídeo de publicidade enganosa com conteúdo político, num caso claro de desinformação com motivação económica.

O alerta foi feito pelos especialistas do MediaLab, o centro de estudo de ciências da comunicação integrado no (ISCTE-IUL), que tem uma parceria com a Comissão Nacional de Eleições (CNE) para deteção de notícias falsas.

De acordo com o relatório do MediaLab, este anúncio “deverá ser um dos primeiros exemplos da utilização desta tecnologia [inteligência artificial] para imitar um líder partidário português”. A manipulação tem como “motivação aparente” fins comerciais e não políticos.

No anúncio é usado um vídeo de campanha de André Ventura ao qual se junta uma voz criada por IA, que não se distingue da real, no qual o líder do Chega convida ao investimento numa plataforma de uma empresa onde se pode ganhar dinheiro facilmente.

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O anúncio — denunciado à CNE via WhatsApp – terá sido visto por quase 17 mil portugueses entre os 25 e os mais de 65 anos, no espaço de poucos dias, no Facebook e no Instagram.

Os investigadores do MediaLab, Gustavo Cardoso e José Moreno, alertam, todavia, para o facto de, apesar de ter intuitos comerciais, a “associação de um líder político a esquemas de enriquecimento online potencia, também, perceções políticas que se podem traduzir politicamente, em particular em período eleitoral”.

Os especialistas identificaram também outros anúncios que incluem conteúdos de desinformação política, usando a associação a figuras do Chega (além de Ventura, surge também o candidato António Tanger Corrêa), e também referências a António Costa, numa falsa narrativa colocada a circular.

Os autores ou financiadores desta publicidade terão atingido mais de 66 mil pessoas em Portugal e permanecem desconhecidos, segundo o Medialab.

Segundo os investigadores, “a escolha de conteúdos e figuras ligadas ao partido Chega resulta do facto de esses conteúdos e essas figuras serem muito presentes nas redes sociais e registarem elevadas taxas de interação”.

“Associar um esquema de enriquecimento a uma figura pública tem sempre dois resultados: ganhar dinheiro com aqueles que forem atrás do engodo e desacreditar as personalidades públicas. Neste caso tanto André Ventura como António Costa são, simultaneamente, alvos políticos e fatores credibilizantes da narrativa proposta”, apontam os especialistas.

A título de exemplo, alguns dos anúncios — que direcionam para páginas falsas clonadas do jornal Correio da Manhã e do site da Galp — referem “Notícias de última hora: a equipa do Chega revelou como o antigo primeiro-ministro ganhou milhões escondendo-os do povo”, ou “Sensação! Tânger-Corrêa e André Ventura desmascaram fraude financeira de António da Costa”.

Os investigadores alertam para o facto de todo este processo ser realizado automaticamente, através de algoritmos, que detetam a ‘popularidade’ nas redes das figuras e geram depois os textos. “No fundo”, diz José Moreno à Lusa, “André Ventura está a ser vítima do seu próprio sucesso nas redes”.

Tanto a identificação dos financiadores dos anúncios, como dos proprietários dos websites é mantida oculta através de registos anónimos. De acordo com o MediaLab, o servidor usado para alojar os websites situa-se na Califórnia e o registo foi feito em Reiquiavique, na Islândia.