A diretora do centro de referência para a paramiloidose do Norte lamentou esta sexta-feira a demora nos processos e aprovações de medicamentos que podem tratar melhor uma doença rara que, quando não tratada, provoca a morte em 10 anos.
“Estamos há quase dois anos à espera da libertação de um versão subcutânea de um medicamento, que já não obrigaria à vinda dos doentes ao hospital de dia e seria muito mais fácil e cómodo. Gostaríamos que estes processos fossem todos mais simples e que a aprovação e negociação com o Infarmed [Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento] também fossem mais expeditas para que os medicamentos chegassem mais depressa aos doentes”, disse Teresa Coelho.
Responsável desde 1990 pela Unidade Corino de Andrade (UCA), centro de referência localizado no Porto que pertence à Unidade Local de Saúde de Santo António, Teresa Coelho lamenta que a Agência Europeia do Medicamento (EMA) tenha aprovado o novo medicamento em 2022, mas em Portugal o processo se arraste.
“Atualmente o tratamento é endovenoso e obriga a ir ao hospital de três vezes por mês. O novo permitiria fazer de três em três meses e de forma subcutânea”, especificou.
À Lusa, nas vésperas do Dia Nacional de Luta contra a Paramiloidose que se assinala domingo, a neurologista e neurofisiologista explicou que, em causa, estão “medicações com um custo pesado sobre os hospitais, embora haja programas de reembolso”, pelo que a tendência é, disse, “tentar refrear um bocadinho os gastos”, mas compreende as queixas crescentes dos doentes.
É o caso de José Carreira, 42 anos, residente em Barcelos, que durante anos a fio fez os cerca de 65 quilómetros que o afastavam de casa ao Hospital de Santo António para, três vezes por semana, receber medicação para a paramiloidose, doença que “herdou” da mãe.
“A mãe tinha falecido no transplante, pelo que a memória do tratamento através de transplante não era muito boa. Optei pelo tratamento com medicamento, esperei autorização para usar o Tafamidis. Usei durante sete ou oito anos. Não foi eficiente no seu caso. Entretanto, passei para o Patisiran, mas sempre com esperas de dois anos para autorização. Agora sei – é incrível serem os doentes a descobrir isto – que há um novo [medicamento, o Vutrisiran], mais cómodo, com resultados que a EMA já aprovou, mas Portugal não avança”, lamentou.
Desde há uns meses, graças a um programa de descentralização de tratamentos montado pela UCA, José Carreira faz a medicação no Hospital de Barcelos, algo que elogia, mas reafirmando o desejo de melhorias no processo.
“Os doentes só vão ficar mais caros. Se os tratassem agora da melhor forma possível, continuavam a trabalhar. Se esperarem um ano ou dois, os sintomas aumentam, vão reformar-se e ter de recorrer a subsídios. Porque é que não avançam?”, lamentou.
A paramiloidose, conhecida como “doença dos pezinhos”, foi detetada em 1939 pelo médico Corino de Andrade em zonas piscatórias de Vila do Conde e da Póvoa de Varzim.
Os sintomas dos adultos jovens estão relacionados com a neurologia: perda de sensibilidade, peso, força e de controlo do funcionamento de alguns órgãos.
Já nos doentes mais velhos, há um grande peso da doença cardíaca.
Segundo Teresa Coelho, o número de pessoas com paramiloidose tem evoluído, existindo em Portugal entre 2.200 a 2.300 doentes.
“Quanto mais depressa conseguirmos diagnosticar os doentes e começar a tratá-los, melhor corre o tratamento e o curso da doença. Isto é uma doença familiar. Há muitos doentes que se assustam. Imaginam-se com uma doença terrível que viram nos seus pais ou nos seus tios e criam algum mecanismo de tentar não pensar muito no assunto, mas hoje tratamos esta doença e tratamo-la melhor quando diagnosticamos cedo, logo aos primeiros sintomas”, frisou.
A agência Lusa contactou o Infarmed para solicitar esclarecimentos sobre o processo de aprovação de novos medicamentos e aguarda resposta.