A justiça voltou a rejeitar, pela quarta vez, o pedido de seis bisnetos de Eça de Queiroz que estão contra a transladação dos restos mortais do escritor para o Panteão Nacional, em Lisboa. A informação foi avançada esta segunda-feira pelo jornal Público e confirmada pelo Observador.

O Supremo Tribunal Administrativo (STA) de Lisboa considera a ação dos bisnetos queixosos “improcedente”, como se lê num acórdão de 20 de junho, entretanto disponibilizado online. Ou seja, os três juízes consideram que os seis bisnetos não têm razão na argumentação que visa impedir que os restos mortais saiam do cemitério de Santa Cruz do Douro, no concelho de Baião. “A presente ação deve ser julgada totalmente improcedente”, pode ler-se no texto em que se destaca também que “os autores não representam a vontade da maioria dos descendentes vivos [bisnetos] do escritor.”

“Esta sentença vem comprovar cabalmente que todas as pretensões dos seus autores não se comprovam, e que tudo o que nós, Fundação Eça de Queiroz, sempre dissemos era verdade e que não há qualquer sombra de falta de legitimidade sobre o assunto de honras de Panteão Nacional para Eça de Queirós”, diz ao Observador Afonso Reis Cabral, presidente da Fundação Eça de Queiroz (FEQ) desde 2022, trisneto do escritor e a favor da sua transladação para o Panteão.

“Não há nada que obste a que se marque a cerimónia”, diz ainda. “Com uma quarta decisão do tribunal não vejo qualquer obstáculo a que se realize a cerimónia o quanto antes e que se cumpra o que foi votado na Assembleia da República em unanimidade em janeiro de 2021”.

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O também escritor, que pertence ao grupo de trabalho para a cerimónia, espera que o “grupo reúna o quanto antes” e admite que “gostaria que a cerimónia fosse marcada em setembro, um ano depois da data inicialmente marcada”. Depois de meses de preparação, a cerimónia de transladação de um dos maiores escritores portugueses chegou a estar marcada para 27 de setembro de 2023, mas foi cancelada uma semana antes da data por uma providência cautelar interposta pelos seis bisnetos para a suspensão da resolução parlamentar, isto depois de já se terem dirigido ao presidente da Assembleia da República, mais de dois anos passados sobre a decisão, para propor que as honras fossem concedidas através da aposição de uma lápide evocativa no Panteão, sem a trasladação dos restos mortais.

Eça de Queiroz no Panteão Nacional: a uma semana da trasladação, a providência cautelar muda alguma coisa?

É quarta vez em nove meses que a justiça rejeita os pedidos deste grupo minoritário de bisnetos de José Maria Eça de Queiroz. A última vez havia sido em janeiro, quando o Supremo Tribunal Administrativo rejeitou o recurso interposto e deliberou que os restos mortais do escritor, atualmente sepultados na aldeia de Santa Cruz do Douro, podiam mesmo seguir para o Panteão Nacional.

Dos 22 bisnetos do escritor, 13 concordaram com a trasladação para o Panteão Nacional, havendo três abstenções. Também a Fundação Eça de Queiroz, presidida pelo escritor Afonso Reis Cabral, é favorável à trasladação, tendo sido a primeira a avançar com o processo.

Eça de Queiroz morreu em Paris, em 1900. Foi trasladado para Portugal e sepultado no jazigo da família da mulher, Emília Resende, no Cemitério do Alto de São João, em Lisboa. Em 1989, o corpo foi trasladado para o Cemitério de Santa Cruz do Douro, no concelho de Baião, distrito do Porto, por iniciativa da família.

A ideia de transladar os restos mortais de Eça para o Panteão Nacional partiu do seu trisneto, Afonso Reis Cabral, que em 2020 a propôs à FEQ. A proposta colheu o apoio da família alargada, do ex-ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro – à época presidente da Câmara de Baião —, e do atual presidente da Junta de Santa Cruz do Douro, António Manuel Vieira.

O tema chegou à Assembleia da República, onde foi debatido e submetido a votação parlamentar, acabando por ser aprovado por unanimidade, à exceção do Chega, que esteve ausente, em janeiro de 2021. Um grupo de trabalho foi então constituído, liderado pelo deputado do PS Pedro Delgado Alves.

Segundo o jornal Público, na notícia publicada esta segunda-feira, a 19 de junho, na conferência de líderes parlamentares, o Presidente da AR, José Pedro Aguiar-Branco, disse que tinha recebido uma delegação da FEQ e que, “estando para breve o fim do processo judicial e ultrapassada a divergência que impediu a concretização da resolução aprovada na AR para concessão de honras de Panteão Nacional aos restos mortais de Eça de Queiroz, impunha-se (re)constituir o Grupo de Trabalho para dar andamento ao processo”, com um representante de cada grupo parlamentar, cita o diário.

A decisão de conceder honras de Panteão ao escritor surgiu “em reconhecimento e homenagem pela obra literária ímpar e determinante na história da literatura portuguesa”, podia ler-se na altura do requerimento que deu entrada no Parlamento. José Luís Carneiro, um dos principais defensores da iniciativa, afirmou que a homenagem visava não apenas “um dos maiores vultos da cultura e literatura do país, como também um povo e uma região onde ela se inspirou para escrever os seus romances”.