O furacão Helene não fez maravilhas à reputação dos veículos eléctricos alimentados por bateria, mas vai ajudar muitos condutores a evitar problemas maiores e a fugir da água salgada. As cheias provocadas pela subida do nível da água do mar, que submergiram automóveis de todo o tipo, a combustão e eléctricos, provocaram um número de incêndios acima da média entre estes últimos, o que levou os construtores a aconselharem os clientes a retirar os seus carros das áreas de risco e, caso estes tenham estado submersos, parcial ou totalmente, a não os utilizar e a afastá-los de casas e de outros veículos.
A água doce, aquela que nos pode invadir a casa e a garagem em tempo de cheias devido à chuva, provoca danos consideráveis nos carros a combustão pela entrada de lama no habitáculo e na mala, podendo a pequena bateria de 12V provocar um curto-circuito que, no limite, danifica alguns componentes do sistema eléctrico. Nos veículos 100% eléctricos, que também possuem bateria de 12V, o problema pode ser mais grave devido à grande bateria de tracção que alimenta o motor. Mas, como esta está encapsulada, a realidade é que não se têm registado muitos casos de incêndio devido às cheias com água doce. Porém, desde o furacão Sandy, em 2012, que as autoridades norte-americanas começaram a notar um incremento de incêndios decorrente do contacto dos carros eléctricos com água do mar, o que o recente Helene veio confirmar.
A água doce é uma boa condutora, mas a salgada é muito mais. A presença de sal e de uma muito maior quantidade de iões minerais tornam-na 50 a 100 vezes mais condutora, mesmo depois de a bateria secar, pois a humidade com a presença de sal que se possa ter introduzido dentro da caixa fechada que protege a bateria continuará a fazer os seus estragos.
Todos nos recordamos de vídeos publicados nas redes sociais com condutores de Tesla a demonstrar que os seus veículos atravessavam poças imensas, com a água a elevar-se por vezes sobre o capot e até o tejadilho. Ora, se isto não é aconselhável com água doce, é decididamente algo a evitar com água do mar.
As baterias dos veículos são formadas por um conjunto de pequenas células, cada uma delas com um pólo positivo e outro negativo, que depois são ligadas entre si. A presença de humidade com elevado teor de sal pode originar um curto-circuito, o que leva a célula a aquecer e, em determinadas condições, pode desencadear o que se denomina por thermal runaway, isto é, um sobreaquecimento da célula que provoca um incêndio, o qual depois se propaga às restantes células e a todo o veículo.
As autoridades norte-americanas chamam a atenção para o facto de o risco existir, quando um carro eléctrico é submergido em água salgada. Porém, trata-se de um risco relativo a avaliar pelos números. O furacão Ian inundou entre 3000 e 5000 veículos eléctricos — de salientar que os híbridos plug-in têm o mesmo problema e até os híbridos não estão isentos de preocupações —, dos quais 600 foram declarados com perda total por danos no exterior e interior, devido à força da água. Mas apenas 36 se incendiaram, ou seja, cerca de 1% do total.
A Universidade de Idaho, juntamente com as autoridades norte-americanas, realizou um estudo para apurar as formas como a água pode entrar em contacto com as células dentro de pack da bateria, pelo que é de esperar que venham a ser encontradas soluções para anular (ou minimizar) os riscos. A pesquisa envolveu Tesla Model X, S, Y e 3, além de Porsche Taycan e Lucid Air e, de acordo com a investigação, nenhum deles apresentou riscos de incêndio. Ainda assim, os autores realçaram que o risco existe, mesmo depois de a bateria secar.