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Conferências do Estoril encerram com fado, prémios e discussões sobre o futuro da saúde global

Terminou a nona edição das Conferências do Estoril. Ao longo de 2 dias, investigadores, líderes, ativistas e figuras de destaque da saúde, tecnologia, política e clima fizeram-se ouvir na NOVA SBE.

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TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

“Este é um espaço seguro para as pessoas convergirem, mas também para divergirem. Até nas questões mais fraturantes da sociedade, as que mais nos dividem, é interessante ver que mesmo aí houve tempo e capacidade de ouvir ideias com as quais discordamos”, destacou no final do evento Laurinda Alves, diretora-executiva das conferências. Na cerimónia de encerramento, o vice-Presidente da Câmara Municipal de Cascais salientou o impacto positivo dos dois dias na promoção de novas ideias. “As Conferências do Estoril são, por excelência, um catalisador de novas ideias e de propostas para o desenvolvimento sustentável e para a cooperação internacional”, disse Nuno Piteira Lopes.

A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, e o vice-Presidente da Câmara de Cascais, Nuno Piteira Lopes, presidiram ao encerramento do evento

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Também a ministra da Saúde destacou a cooperação entre os vários oradores do evento, sublinhando a necessidade de procurar soluções inovadoras para os desafios de amanhã. “Os oradores que aqui falaram deixaram claro que a necessidade de inovação se interliga e é comum a todas as áreas, da saúde à inteligência artificial, da luta climática à liderança política”, disse Ana Paula Martins “É, de facto, hora de repensar. De sermos corajosos, arrojados e disruptivos, e de garantirmos que a inovação e o compromisso social continuem a ter sucesso e que coloquemos as pessoas no centro dos nossos esforços.”

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Final com música e prémios para “exemplos de superação”

Antes dos discursos de encerramento – e da atuação da fadista Teresinha Landeiro, que marcou o ponto final da agenda — assistiu-se à sexta cerimónia dos Patient Innovation Awards, iniciativa promovida pela NOVA SBE para reconhecer exemplos de excelência de doentes, cuidadores e colaboradores que desenvolveram soluções para lidar com desafios impostos pela sua condição de saúde.

“Olhamos e pensamos em como estas pessoas com doenças crónicas e adversidades, encontram soluções. É uma forma de partir a casca do nosso entendimento, de pensarmos ‘se elas conseguem, porque é que eu não hei de conseguir’”, destacou Laurinda Alves, dando como exemplo o caso de Beatriz Batista, jovem de 23 anos que foi uma das premiadas (o prémio foi entregue pelo Nobel da Medicina, Richard Roberts).

Palco da NOVA SBE acolheu a entrega dos Patient Innovation Awards, na sua 6ª edição

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

“A Beatriz, aos 15 anos, perdeu 90% da visão, toda a audição e o cérebro perdeu totalmente controlo dos membros. Ela acabou de se licenciar em economia aqui na NOVA, com 17 valores. A aprendizagem dela, desde as matérias de economia ao inglês, é feita letra a letra, ditada pela mãe na palma da mão ou na bochecha da cara. É absolutamente impressionante.”

Outro momento da tarde foi protagonizado por Dino D’Santiago. O músico marcou presença na NOVA SBE para falar, em português, sobre a Mundu Nôbu, projeto social que criou e destinado aos jovens entre os 14 e os 18 anos nos bairros sociais de Lisboa. “A Mundu Nôbu nunca será uma casa de caridade”, explicou à plateia. “Não olhamos para estes jovens como um potencial problema para a sociedade, mas como um potencial ativo.”

Médicos e investigadores John Amuasi e Andre Kalil debateram os desafios para garantir a saúde pública global

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

O autor de Kriolu e Esquinas aproveitou para espalhar a sua mensagem de um país multicultural. “Portugal tem um potencial imenso e não o compreendemos. É dos países mais inclusivos e aculturados, por mais que nos tentem fechar e nos impor uma agenda”. Contudo, para alcançar esse potencial, o músico acredita que é necessário reconhecer os erros do passado. “Sofremos bastante com uma amnésia coletiva. A Alemanha soube reconhecer o seu erro, soube pedir desculpa e soube começar a olhar para o mundo de outra forma, tentar redimir-se. Vão dizer-me que não temos capacidade para o fazer? Duvido.”

A medicina e o futuro da saúde pública global

Além das cerimónias de encerramento, o final do segundo dia de conferências teve ainda tempo para várias palestras centradas no tema da saúde pública. Numa reflexão sobre o que ainda falta fazer para fortalecer a segurança global, o investigador John Amuasi olhou para o período da pandemia COVID-19 para expor alguns erros cometidos. “Uma das grandes falhas quando se estavam a desenvolver tratamentos foi a falta de ensaios clínicos nos países subdesenvolvidos. A maior parte dos testes foram feitos na Europa e na América do Norte. Temos de garantir que as grandes farmacêuticas, quando desenvolvem novas medicações, as desenvolvem para o mundo inteiro.”

[Já saiu o quarto episódio de “A Grande Provocadora”, o novo podcast Plus do Observador que conta a história de Vera Lagoa, a mulher que afrontou Salazar, desafiou os militares de Abril e ridicularizou os que se achavam donos do país. Pode ouvir aqui, no Observador, e também na Apple Podcasts, no Spotify e no Youtube. E pode ouvir aqui o primeiro episódio, aqui o segundo e aqui o terceiro.]

Em entrevista, o colega de painel de Amuasi, Andre Kalil, desenvolveu a questão. “O problema de o acesso aos testes não ser equitativo é que, quando se estão a desenvolver novas terapias, há inevitavelmente variações na eficácia do tratamento. É preciso fazer testes em diferentes sítios para perceber a eficácia do tratamento em diferentes populações de pacientes. Isto é uma coisa que já devíamos estar a fazer há cinco ou dez anos e com a COVID-19 acordámos para o assunto”.

Teresinha Landeiro e Dino D'Santiago (que apresentou em Carcavelos a sua associação social, Mundu Nôbu), protagonizaram os momentos musicais do encerramento das Conferências do Estoril

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

O médico e especialista em doenças infeciosas brasileiro (a viver e trabalhar nos EUA) disse ainda ser preciso desmistificar o conceito do placebo no desenvolvimento de novos tratamentos. “As pessoas têm um medo infundado. Quando fazemos ensaios clínicos dizem-nos, ‘não me deem um placebo’. Mas o placebo salva vidas – é a diferença entre insistirmos durante anos em tratamentos que não funcionam e percebemos o efeito nocivo de certas ‘soluções’ logo na fase dos ensaios clínicos. É isso que leva à criação de medicamentos e vacinas mais eficazes.”

Outros desafios no horizonte dos sistemas de saúde globais foram delineados ao longo da tarde. Deborah Aluh, investigadora em temas de saúde mental, chamou a atenção para o facto de mais de 25% das pessoas com problemas mentais serem acometidas a instituições contra a sua vontade. Depois disso o vice-presidente de Assuntos Médicos da AstraZeneca, Andreas Heddini sublinhou ainda o peso dos sistemas de saúde globais no aquecimento do planeta. “Somos responsáveis por 5% das emissões de dióxido de carbono e os sistemas de saúde precisam de identificar a melhor maneira de descarbonizar.”

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