O estado da Georgia, um dos “campos de batalha” onde democratas e republicanos podem decidir as presidenciais dos Estados Unidos, entra na última semana de campanha num ambiente de dúvida e desconfiança, incluindo no próprio processo eleitoral.

A vitória de Joe Biden na Georgia nas presidenciais de 2020 foi decisiva para a derrota de Donald Trump, mas a curta margem da mesma (perto de 12 mil votos), levou a que Trump rejeitasse os resultados e iniciasse um processo de contestação que foi derrotado nos tribunais, mas culminou no violento assalto ao Capitólio pelos seus apoiantes em janeiro de 2021.

Quatro anos depois, Trump continua sem reconhecer que perdeu as eleições, quando a campanha entra numa tensa reta final.

Na localidade de Kingsland, no sul do estado, a ativista democrata afro-americana Kiisa, de 54 anos, tem passado as últimas semanas a contactar eleitores, em ações que incluem bater à porta para entregar propaganda, e tem-se confrontado com eleitores confusos e descrentes.

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Trump “conseguiu plantar uma semente de desconfiança em todas as áreas: nos media, no governo, no processo eleitoral… semeou a dúvida onde não havia dúvida”, afirma a ativista à Lusa, numa pausa entre ações de campanha.

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“A desinformação está a desempenhar um papel enorme” na campanha, acredita. “Quando mostramos [os eleitores] onde estão errados, desacreditam os factos porque ele [Trump] já lhes deu a desinformação”, lamenta Kiisa.

Quanto aos maiores equívocos demonstrados pelos eleitores, não tem dúvidas: dizem que “as eleições estão repletas de manipulação, alteração de boletins de voto, máquinas que não contam os votos devidamente”, mas também que Trump “fez mais do que qualquer outro Presidente”.

São ambas afirmações sem base factual que Trump, o seu candidato a vice-presidente, JD Vance, e outros destacados republicanos repetem habitualmente à exaustão em comícios, entrevistas ou anúncios eleitorais.

As estradas e ruas da Georgia estão pejadas de cartazes de Trump e da rival democrata Kamala Harris, mas muitos evitam sequer falar de política.

Numa localidade próxima, St. Marys, o pastor da histórica Primeira Igreja Batista Africana deu instruções aos fiéis congregados na missa de domingo para não falarem sobre política à reportagem da Lusa, mesmo no exterior do edifício.

O argumento dado foi a proteção dos fiéis e alguns dos líderes da comunidade religiosa invocaram o medo que a presença de estranhos nas missas provoca, à luz de atentados recentes contra igrejas de maioria afroamericana.

Para Kiisa, a comunidade está a sofrer com os esforços políticos de divisão.

“Deixou de haver respeito em muitas das nossas conversas diárias e isso veio de baixo para cima”, afirma à Lusa.

Para Kiisa, está até em causa a forma como é visto o cargo de Presidente, e há um esforço deliberado da parte dos republicanos, e em particular de Donald Trump, para rebaixá-lo.

“Ele tem feito muito para fazer as pessoas pensar que é normal ser tão mal-educado, ter tão pouco respeito pela posição” de Presidente, frisa a ativista.

O estilo de Trump — que habitualmente dirige insultos e impropérios à sua adversária e aos democratas em geral — acaba por minar o entusiasmo em torno da candidatura de Kamala Harris, tornando o ex-Presidente o foco da campanha.

“Ele está a sugar todo o oxigénio”, afirma Kiisa, que teme que, depois de Hillary Clinton em 2016, Trump venha a impedir pela segunda vez a eleição da primeira mulher Presidente dos Estados Unidos.

“Sinto que ela [Kamala] está a ter desafios por ser mulher. Ouço muitas pessoas — homens e mulheres eleitores — que acham que o país não está preparado para uma mulher. Enquanto mantivermos essa mentalidade nunca estaremos preparados para uma mulher”, adianta.

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As sondagens para a Georgia mostram os dois candidatos praticamente empatados à entrada para a última semana de campanha.

Kiisa tenta ignorá-las, por acreditar mais no contacto direto com os eleitores, mas também este, admite, não é tranquilizador: “estou muito nervosa”.