Das 17, apenas duas faltaram. Numa sala cheia no Campus XXI, em Lisboa, o ministro da Presidência, a ministra da Administração Interna e a ministra da Juventude e Modernização reuniram-se com associações comunitárias da região da Grande Lisboa durante quase quatro horas. Esta terça-feira realizou-se uma “reunião muito rara e histórica” para a maioria das associações presentes, disse António Leitão Amaro à saída, considerando que, do lado do Governo, se viveu um “exercício de escuta”. As associações — que esperavam respostas para o problema da integração social situações de racismo — apontaram o dedo à falta de respostas concretas imediatas.
“Esta foi uma reunião muito rara, histórica, diria. Para a maior parte das associações, foi a primeira vez que muitas estiveram com vários membros do Governo a discutir a problemática da vida concreta destas comunidades que representam”, disse o responsável pela pasta da Presidência, António Leitão Amaro, no fim da reunião.
O encontro desta terça-feira foi marcado pouco depois da onda de violência que se gerou após Odair Moniz ser morto por um agente da PSP. À volta da mesa estiveram associações representativas de comunidades da Área Metropolitana de Lisboa, como Afrolink, SOS Racismo, Moinho da Juventude e Mundo Nôbu. O Governo, que não justificou o porquê da marcação desta reunião, revelou depois do encontro que “tinha como objetivo ouvir; dar voz a todos”.
“Tivemos um exercício de escuta. Ouvimos as suas preocupações mas também procurámos sinalizar a preocupação do Governo de trabalhar nos aspetos mais importantes: o acesso à habitação, garantir igualdade de acesso à saúde (com mais acesso a médicos de família) e acesso à educação (com mais professores nas escolas, para que haja verdadeira igualdade de oportunidade)”, disse Leitão Amaro em declarações aos jornalistas.
“Há um conjunto de medidas que estamos a cozinhar com grande impacto”, avançou ainda o responsável pela pasta da Presidência, sem entrar em qualquer detalhe.
Foi precisamente esta ausência de medidas que os representantes das diferentes associações criticaram, entre os quais Mamadou Ba, dirigente do SOS Racismo: “Infelizmente esperávamos que o Governo apresentasse um caderno de encargos para podermos ter políticas públicas de combate à discriminação racial, mas não foi isso que aconteceu.” E acrescentou que, “uma vez que [o Governo] não reconhece o carácter estrutural do racismo, provavelmente também não estará afim de encontrar medidas estruturais para combater o racismo”.
“Saímos com alguma esperança, mas em termos de expetativa… As medidas têm de ser materializadas. Vários assuntos foram abordados, mas o Governo não nos apresentou medida em concreto. Falou de um conjunto de coisas que tem no seu programa”, completou o coordenador da associação cultural Moinho da Juventude, Jakilson Pereira.
“São esses jovens, da década de 2000, que estão na rua”
Segundo o governante, além de se terem definido áreas de intervenção prioritária, em cima da mesa esteve “também a relação com as forças de segurança e a segurança”. Apesar de sublinhar que o Governo tem um “profundo reconhecimento do trabalho das forças de segurança”, António Leitão Amaro lembrou que é necessário que haja escrutínio, sem que isso comprometa a garantir de ordem e paz social.
O coordenador do Moinho da Juventude, Jakilson Pereira, lembrou que “vários casos [de mortes] aconteceram nos bairros”. “Não se pode ter apenas à porta destes bairros forças paramilitares, força musculada”. E acrescentou que é importante investir na formação e na escola pública.
“Os nossos jovens começam a não ver nenhum futuro, apenas escolas profissionalizantes que não dão perspetivas de vida futura. São esses jovens, da década de 2000, que estão descontentes e na rua. Mas é preciso projetos concretos para resolver esse problema”, rematou.
Foi sobre estes “projetos concretos” que se debateu também durante estas quatro horas de encontro. Foi discutida “a forma como antigos planos de combate ao racismo e discriminação que foram aprovados no passado ficaram largamente sem execução”, disse o ministro António Leitão Amaro.
No encontro desta terça-feira, além das associações convidadas e dos membros do Governo, estiveram ainda presentes entidades como GNR, PSP, Instituto Português do Desporto e da Juventude (IPDJ) e Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA). Leitão Amaro não adiantou se Governo e associações voltarão a estar sentados frente a frente, mas assegurou que o Governo está “aberto a um continuo melhorar do dialogo com toda a sociedade mas também com os representantes destas comunidades”.
Notícia atualizada às 20h35