Foi ali que tudo recomeçou. Foi a partir dali que os adeptos voltaram a ganhar esperança. Há dois meses, tudo parecia uma miragem. Hoje tudo parece possível. Foi há 46 dias que Bruno Lage se estreou nesta segunda passagem pelo comando técnico do Benfica. A estreia aconteceu em casa, frente ao Santa Clara, e o jogo deixou água na boca dos adeptos encarnados, que há muito não tinham tanta esperança na sua equipa (4-1). Volvidos quase dois meses, o técnico de 48 anos confirmou a devolução dessa esperança à massa adepta e, em oito jogos, venceu sete, perdendo apenas com o Feyenoord há uma semana (casa, 1-3).

O primeiro voo da nova águia começou na varinha de um mágico e amainou no chapéu de um Fideo (a crónica do Benfica-Santa Clara)

Quis o destino — ou o formato pouco democrático promovido por uma Liga que é cada vez menos dos clubes — que o primeiro embate das águias na Taça da Liga fosse precisamente frente ao emblema açoriano. Diante do campeão da última edição da Segunda Liga, esperava-se que Bruno Lage aproveitasse a nova competição para rodar a equipa, dando novo fôlego aos titulares numa altura em que o calendário está a apertar, com jogos de três em três dias. Deste modo, António Silva, que cumpriu esta quarta-feira o 21.º aniversário, e Zeki Amdouni era apontados ao onze, num jogo em que manter a consistência e garantir a presença da final four eram o principal objetivo do Benfica.

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Ficha de jogo

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Benfica-Santa Clara, 3-0

Quartos de final da Taça da Liga

Estádio do SL Benfica, em Lisboa

Árbitro: Hélder Malheiro (AF Lisboa)

Benfica: Anatoliy Trubin; Alex Bah (Issa Kaboré, 85′), António Silva, Nico Otamendi, Álvaro Carreras; Fredrik Aursnes, Renato Sanches (Orkun Kökçü, 46’); Kerem Aktürkoglu (Andreas Schjelderup, 78′), Zeki Amdouni (Ángel Di María, 46’), Jan-Niklas Beste (Vangelis Pavlidis, 67′); Arthur Cabral

Suplentes não utilizados: Samuel Soares; Benjamín Rollheiser, Tomás Araújo e Florentino Luís

Treinador: Bruno Lage

Santa Clara: Gabriel Batista; Gui Ramos, Daniel Borges (Pedro Ferreira, 55′), Sidney Lima; Lucas Soares, Serginho (Adriano Firmino, 77′), Gustavo Klismahn (Vinícius Lopes, 77′), MT; Ricardinho (Bruno Almeida, 85′), Matheus Pereira e Alisson Safira (Gabriel Silva, 55′)

Suplentes não utilizados: Neneca; Diogo Calila, Luís Rocha e João Costa

Treinador: Vasco Matos

Golos: Di María (71′) e Pavlidis (76′ e 80′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Safira (29’), Lucas Soares (36’) e Matheus Pereira (58′)

“Não prevejo diferenças em relação à equipa que jogou connosco há mês e meio. Para nós também não muda nada. Desde que cheguei, todos os jogos são encarados como finais. Temos uma ambição enorme de estar na final four. Vamos defrontar um adversário muito competente e temos de querer fazer uma grande exibição. A prioridade, neste momento, é o próximo jogo. Temos de procurar a consistência. Contra isso há sempre duas coisas: o espaço temporal que ficamos sem competir e as muitas alterações sem ainda termos uma base sólida. Se entender que há jogadores que podem entrar no onze, para a equipa render, assim farei”, explicou Lage na conferência de imprensa.

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Outro dos pontos abordado pelo técnico natural de Setúbal durante a antevisão ao encontro desta quarta-feira prendeu-se com a prestação individual de Vangelis Pavlidis nestes primeiros meses da temporada. Contratado ao AZ Alkmaar por 18 milhões de euros, o grego chegou a este jogo com apenas dois golos e uma assistência em 12 desafios. “Como treinadores temos de ver as coisas pelo aspeto coletivo. Temos 26 golos marcados e seis sofridos desde que cheguei. Tenho sempre de olhar para o rendimento da equipa e aquilo que produz a nível ofensivo. Hoje toda a gente ataca e toda a gente defende. As movimentações do Pavlidis são muito importantes para abrir espaços”, respondeu Bruno Lage.

Conquistado o regresso à Primeira Liga, o objetivo do Santa Clara para a nova época passava pela manutenção. Contudo, com Vasco Matos no comando, os bravos açorianos têm transcendido o seu registo exibicional e, até ao momento, registam seis vitórias em nove jornadas o Campeonato Nacional, encontrando-se num honroso quarto lugar a apenas um ponto dos encarnados, que têm um jogo a menos. Importa ainda frisar que dois desses três desaires aconteceram contra FC Porto (casa, 0-2) e Benfica (fora, 4-1), com o Santa Clara a ceder pontos apenas na visita a Moreira de Cónegos (1-0).

“As equipas quando vão a esses estádios [dos grandes], geralmente têm de passar por momentos de maior sufoco e nós temos de saber passá-los de forma equilibrada. Faz parte do jogo perceber que do outro lado está uma grande equipa. Temos de saber superar esses momentos, com equilíbrio, muita lucidez e bons posicionamentos. Os jogadores que entrarem em campo vão estar preparados. Temos de ter consciência de que vamos defrontar um adversário com um poderio diferente do nosso. Isto tem de ser claro para nós porque se não pensarmos dessa forma não percebemos o que temos de fazer”, assumiu, por sua vez, Matos.

Foi nesta toada que aconteceu o reencontro entre Benfica e Santa Clara, novamente com o Estádio da Luz como pano de fundo. Assim, Bruno Lage fez quatro alterações no onze inicial, colocando António Silva ao lado de Nico Otamendi no centro da defesa, Renato Sanches a acompanhar Fredrik Aursnes no meio-campo, com Zeki Amdouni e Arthur Cabral a atuarem na frente de ataque. Em sentido inverso, Vasco Matos manteve apenas Gabriel Batista, Sidney Lima e MT na formação inicial, mas nem por isso o Santa Clara abdicou do tradicional 5x4x1 em organização defensiva, com Ricardinho a surgir numa posição mais defensiva do que o habitual.

Com o apoio das claques — ou grupos organizados de adeptos — ao contrário do que aconteceu em Alvalade e vai acontecer em Braga e Aveiro devido ao boicote promovido por estas como sinal de protesto contra a competição, as águias entraram mais fortes na partida e, logo nos primeiros minutos, Amdouni cruzou para a cabeça de Jan-Nicklas Beste que, sozinho, atirou forte para uma grande intervenção de Gabriel Batista (3′). Pouco depois, o ala alemão voltou a aparecer dentro da área a finalizar, mas desta vez rematou por cima (16′). A partir daí, o Benfica mostrou muitas dificuldades em quebrar o bloco defensivo insular, que conseguiu anular o raio de ação de Kerem Aktürkoglu no corredor central. Ainda assim, Arthur ainda dispôs de uma oportunidade clamorosa, originada por uma perda de bola de Gui Ramos, mas Batista voltou a defender, desta feita com a cara (25′).

Com as muitas paragens a quebrarem o ritmo do encontro, só no final da primeira parte é que o Santa Clara se aproximou da baliza de Anatoliy Trubin, mas Alisson Safira atirou ao lado depois de uma grande jogada de Gustavo Klismahn, que ultrapassou António Silva no corredor esquerdo (39′). O forcing final dos encarnados acabou por não se traduzir num resultado prático — nem em oportunidades, em abono da verdade — e o nulo continuava a imperar ao intervalo, trazendo justiça ao que se passou dentro das quatro linhas.

Bruno Lage acabou por retificar e mexer nas peças do xadrez ao intervalo, lançando os titulares Orkun Kökçü e Ángel Di María nos lugares de Renato e Amdouni, que estiveram apagados na primeira parte e não aproveitaram a oportunidade. Estas alterações acabaram por melhorar significativamente o rendimento da equipa, que apareceu mais rápida, intensa e a utilizar os dois corredores, com o argentino a revitalizar por completo a direita e Aktürkoglu a surgir mais solto na esquerda. Ainda assim, a primeira oportunidade surgiu de bola parada, com Di María a colocar a bola ao segundo poste, mas Otamendi cabeceou por cima (50′).

Na resposta, Klismahn aproveitou o adiantamento de António Silva e Otamendi, colocou a bola nas costas dos centrais isolando Gabriel Silva que, perante a saída de Trubin, tentou o chapéu de longe, mas a bola saiu por cima (62′). Sem conseguir encontrar espaços, Di María tentou da meia-distância, mas Gabriel Batista continuava em grande plano (66′). Já sem Beste e com Pavlidis em campo, Carreras descobriu o grego na esquerda que, depois de ganhar a linha de fundo, cruzou para o segundo poste, onde apareceu Di María a finalizar de primeira e no ar para um golo de levantar o estádio… e homenagear Diego Armando Maradona no dia do seu nascimento (71′).

Pouco depois, Kökçü descobriu Carreras solto na meia-esquerda, Lucas Soares falhou o corte e o espanhol aproveitou para cruzar para o coração da área, onde Pavlidis apareceu a finalizar para o segundo golo, colocando fim à seca de golos (76′). O grego estava com a corda toda e, depois de Di María cruzar e Otamendi amortecer, o avançado chegou ao bis com um remate indefensável para Gabriel Batista (80′). Com o jogo resolvido, Andreas Schjelderup ainda tentou dilatar a vantagem, mas rematou por cima em zona perigosa (87′). Encerrada a partida, o Benfica garantiu a presença nas meias-finais da Taça da Liga, onde vai medir forças com Sp. Braga ou V. Guimarães, no início de janeiro, em Leiria.