Provocou duas explosões no coração do poder brasileiro na quarta-feira, uma delas tirou-lhe a vida. O corpo de Francisco Wanderley Luiz, o autor confirmado do ataque na Praça dos Três Poderes, em Brasília, foi retirado ao início desta tarde do local após a equipa especializada da Polícia Militar do Distrito Federal ter desativado oito explosivos espalhados em toda a área. O rasto de material explosivo que o autor do ataque deixou para trás estende-se até à sua casa alugada em Ceilândia, cidade nos arredores da capital brasileira.

Segundo o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, foi a utilização de um robô antibombas que salvou a vida de vários agentes envolvidos nas investigação do caso. “A nossa equipa fez buscas na residência de Ceilândia e, felizmente, utilizámos a boa doutrina da nossa instituição para fazer a entrada nesse tipo de ambiente. Entrámos com nosso robô antibombas”, relatou. Assim que o aparelho entrou na residência houve uma “explosão gravíssima“. “Se tivessem entrado na residência, não sobreviveriam à gravidade da explosão”, afirmou.

Segundo a Folha de São Paulo, que esteve no local das buscas, além de explosivos preparados para serem detonados assim que alguém tentasse entrar no apartamento, Wanderley Luiz deixou uma mensagem no espelho da casa de banho, escrita com batom, dirigida a Débora Rodrigues, uma mulher que está presa por ter participado nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 em que manifestantes, apoitantes de Jair Bolsonaro, invadiram os edifícios dos poderes legislativo, executivo e judicial do Brasil.

“Por favor, não desperdice batom! Isso é para deixar as mulheres bonitas. Estátua de merda se usa TNT [substância explosiva]”, lê-se no espelho, numa referência à pichagem feita pela bolsonarista na estátua da Praça dos Três Poderes.

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Os vídeos partilhados pelos meios de comunicação pela imprensa brasileira mostram a casa parcialmente destruída devido à explosão que decorreu com a entrada da polícia no local. No entanto, são ainda visíveis os materiais de confeção de bombas caseiras.

Uma vizinha de Wanderley Luiz, Dayana Alves, citada pela CNN Brasil, contou que ele lhe entregou uma nota de um dólar autografada, pediu que a guardasse e garantiu que um dia valeria muito. A mesma vizinha descreveu-o como um homem tranquilo e comunicativo, afirmando que “jamais” imaginaria que fosse capaz de cometer um ato de tal dimensão.

Investigação da polícia brasileira aponta para “atos terroristas” planeados a longo prazo

O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou esta quinta-feira, em conferência de imprensa, que as explosões registadas na área central da capital na noite passada indiciam que os grupos extremistas responsáveis por atos similares em anos anteriores continuam ativos. “Determinei a instauração do inquérito policial e o encaminhamento para a Suprema Corte em razão das hipóteses iniciais de atos que atentam contra o Estado Democrático de Direito. E também, de atos terroristas. Estamos tratando o caso sob essas duas vertentes”, revelou.

As primeiras informações da investigação indicam que houve um “planeamento a longo prazo” de Francisco Wanderley para os atos cometidos esta quarta-feira. “Essa pessoa já esteve em outras oportunidades em Brasília. Inclusive, segundo relatos de familiares, estava aqui em Brasília no começo do ano de 2023. Ainda é cedo para dizer se houve participação direta nos atos de 8 de janeiro, isso a investigação vai mostrar”, disse.

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O diretor-geral da Polícia Federal brasileira afirmou ainda que estão a ser analisados os materiais encontrados durante a investigação no local do ataque e que as bombas eram de fabrico artesanal, mas de “alto grau de lesividade”.

Andrei Rodrigues revelou que Francisco Wanderley, durante o ataque, transportava um extintor carregado com gasolina, simulando um lança-chamas. “Reitera a gravidade da situação que encontrámos”, afirmou. Relatou ainda que no porta-bagagens do veículo localizado a poucos metros do Supremo Tribunal Federal, onde se sabe que o autor do ataque planeava entrar, havia fogos de artifício montados sobre uma estrutura de tijolos com o objetivo de “canalizar” a explosão para uma única direção.

Foi ainda localizada uma autocaravana que teria sido alugada há alguns meses e que estava estacionada nas proximidades da Praça dos Três Poderes. Na avaliação preliminar dos investigadores, este é um dos sinais mais preponderantes para o planeamento do ataque a médio e longo prazo.

Vestido com referências ao Joker, homem fez-se explodir após avisos nas redes sociais

Como reportam vários meios de comunicação social brasileiros, e se comprova através das fotografias do corpo de Francisco Wanderley Luiz, o homem estava vestido com um fato verde com naipes de um baralho de cartas, no que parece ser uma alusão à personagem da DC Comics, Joker (Coringa, em brasileiro). A personagem foi adotada como símbolo dos antisistema no Brasil.

Páginas nas redes sociais atribuídas a Wanderley Luiz, que já não se encontram ativas, continham diversas publicações que apontam para um perfil de radicalização de extrema direita, com ataques regulares a “comunistas”, mensagens religiosas e também contra o poder judiciário.

O autor do ataque anunciou, aliás, em dezenas de mensagens, que pretendia executar algum tipo de ação nas horas seguintes. “Polícia Federal, vocês têm 72 horas para desarmar a bomba que está na casa dos comunistas”, escreveu o homem, antes de citar nomes de políticos como José Sarney, Geraldo Alckmin e Fernando Henrique Cardoso.

Em outras mensagens já expressava a vontade de se tornar um mártir. “Entrego minha vida para que as crianças cresçam com liberdade”, escreveu.

Chaveiro de profissão, o homem de 59 anos ainda teve uma breve carreira política. Foi candidato a vereador nas eleições municipais de 2020 no Rio do Sul pelo Partido Liberal (PL), o mesmo do ex-Presidente Jair Bolsonaro. Sob o nome de Tiü França, não conseguiu ser eleito, reunindo apenas 98 votos.

Homem era de “família do bem”, mas “aparentava severos problemas mentais”, relata deputado republicano

Ao jornal Metrópoles, o filho adotivo do principal suspeito, Guilherme António, disse que já não mantinha contacto com o pai há alguns meses, tal como a restante família. “Ele tinha uns problemas pessoais com a minha mãe e estava muito abalado com a situação, e ele viajou. Ele só queria viajar. A intenção dele era ir para o Chile”, conta, acrescentando que soube que Tiü França passou por “Itapema e Minas Gerais” antes de chegar a Brasília.

O deputado federal Jorge Goetten (Republicanos-SC) diz que conhecia Francisco Wanderley Luiz. De acordo com a Folha de São Paulo, o deputado enviou mensagem num grupo de WhatsApp com deputados dizendo que conhecia Luiz e sua família e que ele “realmente aparentava severos problemas mentais“.

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Ao jornal brasileiro, Goetten afirmou que o homem esteve no seu gabinete algumas vezes no ano passado e uma última vez em agosto deste ano. “Um cara que eu conhecia há mais de 30 anos, um empreendedor de sucesso, de família do bem. Fiquei contente com a visita dele, fico sempre feliz com visitas, ainda mais quando é um conterrâneo. Estamos muito abalados”, reconheceu o deputado.

“No ano passado, comentei no gabinete que tinha achado ele meio estranho, emocionalmente abalado. Ele falava muito da separação dele. Pareceu-me meio abalado”, acrescentou, referindo que pediu a amigos em comum que visitassem a família do homem para perceber o que podia ser feito para o ajudar.